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Estratégias perante a reforma aprovada: hora de por a mão na massa!

Direto ao ponto: passamos tantos anos discutindo em tese uma reforma tributária que está difícil encarar a realidade e perceber que agora é hora de colocar em prática diversas linhas de ação. A amplitude e profundidade das novas normas afetam qualquer consumidor e, ainda mais, os negócios e suas relações com aqueles e seus fornecedores. Ainda que 2033 pareça longe e exista uma chance de a transição ser adiada, basta recordar que todos os preços de produtos e serviços precisam ser revisados, sob pena de contribuintes perderem sua já desafiadora margem de lucro. Assim, os aparentemente longos dez anos de transição são na verdade um período apenas justo para que mudanças tão drásticas e já concretas sejam refletidas. Deixamos aqui uma prática sugestão: uma lista de projetos estratégicos ligados ao tema, a qual sugerimos seja checada por qualquer profissional envolvido com tributário.

Do que estamos falando? A reforma de PIS/COFINS, IPI, ISS e ICMS

Como explorado em diversos artigos e eventos de nosso escritório, o que tem se chamado de Reforma Tributária nas manchetes é na verdade apenas uma das reformas fiscais em andamento, focada na tributação do consumo. Existem outras mudanças importantes também já aprovadas em relação ao Imposto de Renda (em transfer pricing, rendimentos offshore e de fundos fechados, por exemplo), onde mais novidades são esperadas (isenção de dividendos sob risco).

A Reforma Tributária do consumo trata essencialmente de cinco tributos que afetam todos os entes federados: ISS (Municipal), ICMS (Estadual), PIS, COFINS e IPI (Federais). Originalmente, a promessa era de extinção deles todos para em troca se criar um sonhado imposto único cheio de adjetivos: simples, moderno, não cumulativo (IVA) e justo (com arrecadação no destino, eliminando fatores fiscais na decisão dos agentes de investimento, além de permitir uma tributação mais green e inclusiva – até um cashback enfiaram nos slides em defesa da proposta). Acima de tudo, prometeu-se que essa reforma se daria sem que houvesse aumento de arrecadação, mas um sistema mais transparente, com mais segurança e menos custos com disputas.

A aprovação da Emenda Constitucional 132 há dois meses significa que a Reforma Tributária deixou de ser um sonho e é uma realidade. Nos próximos anos os detalhes (importantes, como sempre) serão objeto de leis e regulamentos, novos órgãos e muita, muita disputa. Mas a reforma nasceu, embora aquelas otimistas promessas estejam longe de poderem ser classificadas como entregues.

Como já tivemos a oportunidade de resumir: teremos inevitavelmente uma transparência melhor (se é que havia como piorar nisso), mas a complexidade do sistema não foi extinta e os cinco tributos antigos acabaram virando cinco outros tributos (IBS, CSB, IS, Contribuições Estaduais e o sobrevivente IPI, com escopo algo reduzido). A segurança e menores custos ainda é uma promessa. Por fim, mesmo que oficialmente ainda não saibamos as alíquotas desses novos tributos, a conclusão de especialistas quanto à esperada não majoração da arrecadação varia entre aqueles que já concluem ter havido um golpe contra a opinião pública, eis que haveria sim um inescapável aumento da arrecadação, e aqueles que se contentam em apenas defender que “pelo menos” agora saberemos o quanto se recolhe sobre o consumo…

Por que algo deve ser feito? Porque se omitir pode ser (ainda) mais caro

O chamado período de transição promete ser infernal. Contribuintes terão de lidar com o regime antigo, a regulamentação do regime novo e depois a sua implementação, ao mesmo tempo em que o anterior for sendo gradualmente extinto.

As mudanças são tão drásticas que simplesmente aguardar deitado em berço esplêndido é garantia de dor de cabeça.

No mínimo, saber antecipadamente onde estão os pontos de stress é valioso, pois evita, por exemplo, que negócios sejam mal precificados, investimentos sejam desperdiçados e riscos sejam inadvertidamente assumidos. Na vida de uma empresa, administrar riscos é uma constante e a omissão é também uma alternativa, mas o correto é sempre se tomar decisões informadas quanto ao custo de cada caminho possível.

Quem deve se interessar? Os afetados pela rentabilidade e eficiência de seus negócios

Lembrando que a Reforma Tributária do consumo afeta todos os produtores e comerciantes de produtos e, também os fornecedores de serviços, o universo de afetados é simplesmente o maior possível. Basta lembrar que qualquer negócio é, no mínimo, consumidor de bens e serviços. Além disso, por mais que por definição a tributação do consumo se dê evidentemente pelo ICMS e pelo ISS, mesmo setores que hoje não são contribuintes deles serão afetados. Basta ver o exemplo de locadores, que agora serão sim contribuintes tanto de Estados como de Municípios via o novo IBS. As tradicionais obrigações de dar ou de fazer perdem muita aplicabilidade. Essa reforma equivale à criação de um super PIS/COFINS. Seu negócio tem receita? Vai ser afetado.

De fato, a Reforma Tributária do consumo é tão abrangente que virtualmente não existe ninguém que não seja atingido. Mesmo setores expressamente excepcionados das novas regras não estão alheios aos seus efeitos. Basta lembrar, no exemplo mais contundente de promessas de que miravam ganhar apoio para a aprovação da então PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 45, que contribuintes no SIMPLES, aos quais foi repetidas vezes garantida a sobrevivência do regime, continuarão negociando com fornecedores e clientes sob outros regimes, e que tanto PIS/COFINS como ICMS e ISS serão simplesmente extintos. A tributação da renda e da folha pode seguir algo similar, mas não tem como o pessoal do SIMPLES imaginar que vai passar incólume aos novos IBS e CBS.

O principal campo dessa batalha tende a ser o departamento fiscal e financeiro da própria empresa. Times de contabilidade, controladoria e tributário, com seu suporte jurídico ou financeiro, tendem a ser os mais envolvidos nas regras atuais de apuração de tributos e, portanto, as pontas de lança no tema. Se o sistema atual desaparece em 2032, esses são os primeiros profissionais a quem se perguntará: o que vem depois? Onde muda? Não adianta fugir: essas perguntas já são oportunas agora neste início de 2024.

Quando algo deve ser feito? Idealmente, desde já e por pelo menos três anos

Ainda que este 2024 e o próximo ano sejam programados para serem anos de intensa atividade legislativa, basta lembrar que o Congresso Nacional é formado por representantes eleitos pela população para que fique evidente o nome do jogo: lobbying.

Podemos usar eufemismos como advocacy e outros, mas no final do dia não há nada a ser escondido: os contribuintes devem buscar levar ao conhecimento dos legisladores os impactos esperados sobre seus negócios, prevenindo em vez de remediar. O que é mais trabalhoso: procurar deputados e senadores para republicamente noticiar e endereçar possíveis soluções, ou deixar o problema nascer e confiar no Judiciário para uma eventual demorada e cara correção?

Qualquer que seja o setor de seu negócio, saiba que ele tem presença em Brasília. Se sua empresa não tem envergadura para sozinha abrir agendas, lembre-se de associações de classe e demais players envolvidos. Em tese, até seu maior concorrente pode ser um aliado neste momento. A união faz a força, especialmente no jogo político que está havendo para conciliar tantos envolvidos. É algo social e humano, não necessariamente justo: sem saber quem merece mais, ganha a mamadeira o bebê que grita mais alto.

Para além de influenciar positivamente a regulamentação dos novos tributos, os próximos anos devem demandar acompanhamento intenso de relações chave com fornecedores e clientes. Atendido o cronograma oficial, apenas em 2027 teremos alíquotas conhecidas, mas não devemos esperar elas serem conhecidas para planilhas de precificação estarem já preparadas. Para quem for profissional, a transição ocorrerá de forma menos drástica.

Onde deve ser feito? Dentro de casa, para início de conversa

Brasília é onde as políticas são solenemente oficializadas, mas isso é uma mera consequência de posições e debates iniciados por todo país. Em relação ao momento atual de formação de novas regras, as empresas não precisam necessariamente estar engajadas no corpo a corpo legislativo. Elas podem começar pelo caminho inverso: identificar internamente quais são as bandeiras a serem levantadas, buscar apoiadores em sua região e setores, depois perante governos locais, para então o pleito ser enviado, por quem mais competente para tanto, aos reguladores.

Portanto, por mais que a reforma pareça um monstro gigante e longe de nossas casas, é dentro dos nossos times, com a provável ajuda de terceiros, que estratégias serão desenhadas e implementadas.

Quanto vale esse tema? Certamente mais do que qualquer resposta já tentada

Ainda que a promessa inicial de não se aumentar, mas apenas manter a arrecadação, fosse cumprida (no que não acreditamos, infelizmente), não haveria como reformar o sistema e manter o resultado global sem inescapavelmente alguns serem prejudicados e outros beneficiados.

A conta exata varia para cada contribuinte e envolve variáveis como natureza da operação, localidade de fornecedores, unidades de negócios e clientes, ou mesmo o porte dos envolvidos, mas é suficiente recordar que a alíquota basal do novo IVA Dual (CBS + IBS) vem sendo amplamente estimada como 27%. Some-se aí eventuais outros tributos no consumo (IPI, IS e contribuições estaduais) e estamos falando de algo como um terço ou mais dos ingressos de uma empresa.

Se isso provavelmente já está acima dos patamares atuais mesmo para setores hoje muito tributados, como grandes indústrias (que já pagam IPI, ICMS, PIS/COFINS), imagine para prestadores de serviço, entre os quais não é raro encontrar atividades hoje recolhendo “apenas” 5,65% sobre sua receita (ISS e PIS/COFINS mínimos). O palpite mais grosseiro sugere haver uma potencial equivalência ou economia para alguns, mas custo fiscal muitas vezes multiplicado para outros.

Enfim, é algo muito caro, em todos os sentidos da palavra, para não implicar ações imediatas e estratégicas. Por fim, vamos a elas:

Estratégias: como devem ser feitas? “If you fail to plan, you are planning to fail!”

O tema é importante, importantíssimo, mas o que fazer? Como sempre, direto ao ponto:

Para iniciar, parece propício que se desenhem quem são os times e responsáveis envolvidos na compreensão e orientação do tema. Provavelmente muitos setores dos negócios serão chamados a ajudar, mas há um maestro conduzindo essas agendas. Então, seja para desenhar responsáveis e prazos para cada estratégia de migração ao novo sistema tributário, seja para conciliar atos concretos performados pelos diferentes setores envolvidos (financeiro, jurídico, comercial, sistemas) ou comitê interno parece ser o passo inicial.

Uma vez definidos quem é o dono do tema, parece ser oportuna a confecção de uma modelagem que identifique as variáveis envolvidas na formação de preço e demais grandezas envolvidas no modelo atual, para que então se estimem os impactos dos novos tributos, não apenas em 2033, mas durante os diferentes graus de transição até lá. Pode parecer cedo, dada a falta de alíquotas certas, mas essas projeções financeiras servem justamente para antecipar cenários e identificar ganhos e perdas, riscos e oportunidades, suportando decisões informadas antes que elas se tornem urgentes.

Na confecção desse material seria saudável que se estimassem efeitos sobre regimes atuais, sobre a cadeia de logística e suprimentos, assim como a conveniência de se aproveitar de novas exceções criadas. Pode ser um momento interessante de se estimar também eventuais novas localidades a explorar. Muitos negócios fizeram investimentos em ativos com prazos longos de depreciação e não deixa de ser algo drástico cogitar-se mudar de fornecedor, ou mesmo de sede para outro Município ou mesmo Estado, mas recordemos que já houve uma mudança profunda nas regras do jogo e estamos aguardando apenas o tempo para que elas entrem em plena vigência. Não se trata de apenas mudar a tributação da origem para o destino, recordemos.

Outra variável importante a ser avaliada é a eventualidade de a empresa se vir portadora de créditos fiscais pertinentes ao regime atual. Por ora, o texto constitucional prevê a possibilidade de algumas compensações entre os tributos antigos e os novos (CBS no PIS/COFINS, por exemplo), ou o ressarcimento de ICMS, sob prazos a perder de vista, acaso haja saldo credor após a extinção deste, mas é comum que os contribuintes possuam valores em disputas administrativas ou judiciais. O cuidado aqui é novamente o de antecipar cenários, como a liquidação antecipada de recebíveis perante investidores externos em estruturas hoje já comuns (special situations), até para que aquilo que naturalmente pareça um ativo não se converta em um custo (infelizmente, algo comum nestas terras).

Por último, o mais valioso: gente. Não há como fazer milagres. Se é verdade que as empresas brasileiras já gastam muita energia e recursos apenas para manter sua velocidade de cruzeiro, atendendo ao compliance tributário de rotina, e ainda assim se encontram com contingências materializadas ou oportunidades perdidas, não é provável que as equipes atuais deem conta de estrategicamente se anteciparem e desenharem um cronograma profissional da transição para o novo regime, com etapas, responsáveis e investimentos envolvidos. Provavelmente, longe da promessa de simplificação, os próximos anos exigirão investimentos em equipe interna e assessores externos profissionais para dimensionar corretamente o que fazer e quando fazer. Há muita expectativa quanto a renovação das relações com Fisco e o uso de novas ferramentas, inclusive a agora onipresente inteligência artificial, mas no final do dia os contribuintes precisarão tanto de líderes preparados para tomarem as decisões corretas como de executivos treinados para municiá-los dos cenários de ação aplicáveis. Essa reforma tributária do consumo impôs derrotas e vitórias. O plano sugerido acima pode significar potencializar ganhos e minimizar perdas para qualquer negócio.

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