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Subvenções: é possível afastar as novas regras de tributação?

Acreditávamos que a tese acerca da tributação das subvenções estava decidida pelo Judiciário, ao menos com relação ao IRPJ e a CSLL, de cujas bases de cálculo as subvenções ditas positivas (créditos presumidos) deveriam ser excluídas sob pena de ofensa ao princípio federativo e à segurança jurídica (STJ, EREsp nº 1.517.492). Relativamente aos demais benefícios fiscais diversos do crédito presumido de ICMS, a sua não inclusão na base de cálculo do IRPJ e da CSLL estaria condicionada ao cumprimento dos requisitos do art. 30 da Lei nº 12.973/2014 (constituição de reserva de lucros, destinadas exclusivamente à capitalização ou absorção de prejuízos) (STJ, REsp nº 1.945.110).

Qual não foi a surpresa dos contribuintes quando, em 2023, houve a edição da Medida Provisória nº 1.185/2023, posteriormente convertida na Lei nº 14.789/2023, que estabeleceu novas bases de tributação das subvenções para a implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, revogando a legislação que havia servido de base daquelas decisões do STJ.

No entanto, esse novo modelo de tributação das subvenções já vem sendo, com sucesso, questionado no Judiciário porque, basicamente, a edição de uma nova legislação ordinária acerca do tema não altera a natureza dos incentivos de ICMS e, portanto, o fato destes não consubstanciarem renda ou receita passível de tributação federal, seja por essa não adesão às hipóteses de incidência do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, seja pela temerária ofensa ao pacto federativo e segurança jurídica.

Nesse artigo, portanto, abordaremos de forma suscinta, quem poderá discutir judicialmente a nova legislação, as bases dessa discussão, o cenário jurisprudencial atual e as perspectivas futuras.

A quem interessa a nova judicialização da tributação das subvenções?

A resposta mais óbvia seria: todos os contribuintes subvencionados.

Mas a quais subvenções nos referimos? A todos os incentivos e benefícios fiscais ou financeiros-fiscais relativos ao ICMS concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal.

Nessa lista estão as subvenções concedidas como estímulos à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, os quais geralmente estão atrelados à programas de desenvolvimento regionais e exigem uma contrapartida do contribuinte, e os benefícios fiscais de ICMS que têm por objetivo reduzir ou eliminar ônus tributário de um determinado setor da economia, como forma de fomentá-lo, e que, portanto, são concedidos em caráter geral e incondicional, tais como reduções de base de cálculo ou alíquota, isenção ou suspensão do imposto.

Portanto, o contribuinte que tem sua operação subvencionada de forma geral e incondicional por meio da redução do ICMS em suas mais variadas formas ou o contribuinte que, através de Ato Concessório, editado de forma específica e individual pelo Estado ou Distrito Federal, é agraciado por benefícios fiscais desse imposto, tem interesse em discutir as bases em que editada a Lei nº 14.789/2014.

Cenário atual: a nova tributação das subvenções de ICMS

A Lei nº 14.789/2023 determina que os contribuintes que receberem subvenções para implantar ou expandir empreendimento econômico poderão apurar o chamado “crédito fiscal de subvenção para investimento”.

Esse crédito (de IRPJ) poderá ser usado para ressarcimento ou compensação com tributos administrados para Receita Federal do Brasil.

As alterações promovidas pela Lei nº 14.789/2023 não apenas estabelecem o crédito fiscal de subvenção para investimento, como também restabelecem a tributação dos incentivos fiscais de ICMS pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

Para fins daquelas contribuições, PIS e COFINS passam a incidir sobre qualquer tipo de incentivo de ICMS registrado no resultado do contribuinte. Relativamente ao IRPJ e à CSLL, estes incidirão imediatamente sobre as subvenções por ocasião do reconhecimento contábil do resultado respectivo à alíquota tradicional de 34%.

Assim, somente após recolhidos os tributos federais em base mensais ou, quiçá, trimestrais, o contribuinte deve habilitar-se junto à Receita Federal do Brasil para fins de concessão de crédito de IRPJ na proporção de 25% do valor da subvenção.

Os créditos, todavia, estão limitados às despesas de depreciação, amortização e exaustão dos ativos que foram resultado de investimentos em contrapartida às subvenções recebidas. Esses ativos geradores das despesas base do crédito presumido terão de estar atrelados a efetiva expansão ou instalação do empreendimento no território do Estado que concedeu o benefício de ICMS.

Ou seja, há que se aguardar que os ativos estejam aptos a qualificar-se como decorrentes de tal investimento e estejam já passíveis de serem reconhecidos no resultado da empresa (“despesados” via amortização, depreciação ou exaustão), a fim de que possam dar origem aos tais créditos fiscais de subvenção para investimento.

Por que judicializar a nova tributação das subvenções?

O novo modelo de tributação das subvenções merece ser judicializado tanto da perspectiva do pacto federativo, que volta a ser ferido pela recém-editada Lei nº 14.7889/2023, quanto da própria natureza desses incentivos fiscais que não se adequa à materialidade imponível do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. Vejamos:

O STJ, por ocasião da análise do Tema 1.182, fixou entendimento no sentido de que os valores provenientes dos créditos presumidos de ICMS (“incentivos positivos”) representam renúncia fiscal dos Estados ou do Distrito Federal, voltada ao atendimento da política econômica-social pensada por aquele Ente Estadual ou Distrital.

Portanto, para fins de preservação da autonomia federativa e do exercício de auto-organização dos Estados e Distrito Federal, não se poderia permitir que o resultado dos benefícios fiscais estaduais ou distritais concedidos fossem considerados lucro para fins de tributação pelo IRPJ e pela CSLL sob pena de ferir-se o próprio pacto federativo.

Sob essa perspectiva, é inócua a caracterização dos créditos presumidos de ICMS como subvenção para investimento ou para custeio, discussão essa que, outrora pacificada pela LC 160, voltou à tona com a edição da Lei nº 14.789/2023, pois, em se tratando de renúncia fiscal estadual – afinal, originariamente, esses créditos, se não concedidos, dariam azo à receita dos Estados e Distrito Federal – não se sujeitam à tributação imposta pela União, seja sobre o lucro, seja sobre a renda.

Um outro argumento para a judicialização do tema passa pela natureza das subvenções que, sob a ótica do Orçamento Público, são despesas originadas de transferência financeira (art. 12 da Lei nº 4.320/1964). Nesse sentido, somente poderia ser considerado subvenção o montante com origem em dotação orçamentária que, como tal, saísse das contas públicas para as contas da empresa.

Não é o que se observa quando tratamos de crédito presumido de ICMS que, como já mencionado acima, é renúncia de receita (art. 14 da Lei Complementar 101/2000) e não transferência dela.

Uma vez que o crédito presumido de ICMS – e outros benefícios desse imposto – não poderia ser entendido como subvenção porque, na verdade, oriundo de renúncia fiscal e, nessa condição, não configuraria lucro ou receita tributável, independentemente de sua classificação contábil, outra conclusão não há senão o seu não alcance pelas disposições da Lei nº 12.973/2014 (que trata , exclusivamente, de subvenções para investimento), e pelos fatos imponíveis do IRPJ e CSLL (lucro) e do PIS e da COFINS (receita).

Quais são as perspectivas?

Para aqueles contribuintes que decidirem pela judicialização da questão, são boas as perspectivas que se desenham em um horizonte próximo.

O Judiciário vem concedendo liminares (mandado de segurança coletivo nº 5012462-09.2023.4.03.6100; mandado de segurança nº 5037507-15.2023.4.03.6100; mandado de segurança nº 1001314-41.2024.4.01.3400; mandado de segurança nº 5038077-98.2023.4.03.6100), sob o manto do precedente qualificado do STJ no Tema 1.182, de acordo com o qual o crédito presumido de ICMS configura incentivo fiscal voltado à redução de custos, objetivando proporcionar maior competitividade no mercado para as empresas de determinado Estado-membro, não assumindo, assim, natureza jurídica de receita ou faturamento para efeito de composição da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, mas sim de renúncia fiscal do Estado.

A superveniência de legislação ordinária ou complementar não teria o condão de alterar aquele entendimento jurisprudencial qualificado de que a tributação federal do crédito presumido de ICMS representaria violação do pacto federativo, cláusula pétrea de nossa Constituição.

Os dois principais argumentos para a judicialização do tema e sobre os quais nos debruçamos no tópico anterior, já foram, portanto, testados da Justiça Federal, dando ensejo à concessão de decisões liminares.

Direto ao Ponto:

Contribuintes que usufruem de benefícios fiscais de ICMS deverão avaliar sua situação – e eventual judicialização do tema – tomando como ponto de partida a decisão do STJ no Tema 1.182 que utilizou o pacto federativo para proteger os chamados “incentivos positivos” dos efeitos nefastos de uma eventual tributação federal sobre renda. E, no que se refere aos “benefícios negativos”, analisar o gradiente de riscos de uma eventual discussão quanto à natureza das subvenções e se a esse conceito se adequam aqueles benefícios, bem como se tais grandezas poderiam consubstanciar base imponível do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS (renda e receita).

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