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DIRPF24 e Ativos no Exterior: hora de decidir

Direto ao ponto: no fim de maio encerra o prazo de entrega da Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda (DAA ou DIRPF) e, desta vez, para quem possui ativos no exterior, essa é uma oportunidade única, pois é então que serão solenemente formalizadas duas opções valiosas trazidas pela recente Lei nº 14.754/2023: a possibilidade de atualização do valor dos bens no exterior e a opção pelo tratamento transparente para quem possui empresas offshore. Como sempre, aqui buscamos oferecer uma análise pragmática e sintética. Duas conclusões genéricas poderiam ser tentadas: (i) a atualização vale mais a pena se o contribuinte tem, entre outras coisas, a expectativa de realização do ativo atualizado a curto prazo; e (ii) o tratamento transparente para offshore usualmente é prejudicial e, por isso, não indicado. Contudo, sem prejuízo de nossa análise direto ao ponto, aqui vale com mais força o disclaimer: cada caso é um caso e este é um momento único, uma oportunidade que não se repetirá, então o interessado deve procurar assessoria profissional para essas opções.

Avaliação de Bens no Exterior (ABEX): ótima economia, em certos casos

Iniciemos por aquela que foi nitidamente uma bem-sucedida moeda de troca do Poder Executivo para angariar votos no Congresso e aprovar a tantas vezes tentada mudança na tributação de ativos no exterior: a pontual atualização dos bens com redução de carga.

Como sabemos, a Lei nº 14.754/2023 criou a possibilidade de as pessoas físicas atualizarem o valor dos bens e direitos mantidos no exterior para o valor de mercado em 31.12.2023 mediante o pagamento de uma alíquota fixa de 8%. Essa atualização é facultativa, mas única, devendo ser exercida durante o período de entrega da DAA de 2024, ano-base 2023, com o pagamento do imposto até 31.05.2024.

Qual a vantagem? Bem, naturalmente, a atualização a valor de mercado significa que o patrimônio do contribuinte sofre um acréscimo, que representa renda passível de tributação. Mas como essa renda é tributada a 8%, existe um belo desconto em comparação a uma situação convencional, quando o IR seria de, no mínimo, 15%. Ou seja, o contribuinte paga o imposto por uma mera reavaliação do valor do bem, sem que ele tenha efetivamente lucrado ainda, como no caso típico de uma venda, mas o imposto é praticamente metade daquele que ocorreria. A vantagem está nessa economia, que será concreta acaso o contribuinte logo adiante venda o bem por valor similar, pois aí não haveria mais imposto devido.

O ABEX pode ser útil para quem mantiver bens no exterior diretamente em seu CPF, não via estrutura offshore (a menos que a opção pelo tratamento transparente ocorra simultaneamente – v. adiante). No entanto, para estes que possuam empresas no exterior, a adesão ao ABEX merece uma análise cuidadosa, pois embora em algumas hipóteses ele possa permitir redução de tributos futuramente devidos, em outros pode resultar em uma antecipação desnecessária de custos fiscais, sem benefícios práticos significativos a longo prazo.

Por exemplo, para quem possui empresas offshore no tratamento opaco, a adesão ao ABEX pode resultar em uma antecipação desnecessária de impostos, sem benefícios práticos significativos a longo prazo. Afinal, o ABEX aumenta o custo da offshore e antecipa o IR sobre o lucro de 2023, que de outra forma, como ainda sujeito à lei anterior, somente seria onerado fiscalmente no Brasil se e quando distribuído ao sócio. Já os lucros sob a nova lei, pós 01.01.2024, serão sempre onerados anual e automaticamente a 15% na DAA. Os eventuais dividendos oportunos já deixarão de ser novamente tributados (eis que alcançados pelo IR brasileiro quando ainda estocados). Ou seja, apenas para quem pretende “trazer” recursos em breve o ABEX faria sentido.

Por outro lado, para quem, por exemplo, já pretendia encerrar a offshore e trazer os recursos ao Brasil, o ABEX pode se justificar. A chave aqui é novamente o fator tempo: quando se espera os recursos sejam liberados ao sócio no curto prazo, a cristalização antecipada da tributação vale a pena, dada a taxa vantajosa. O interessado deve de qualquer forma se atentar ao câmbio no enceramento da estrutura, que pode ser superior ao da atualização opcional.

Se em vez de desmontar a offshore o residente fiscal no Brasil pretender capitalizar ela com outros ativos financeiros também mantidos no exterior, o ABEX sobre estes, antes do movimento societário, também pode se justificar, eis que aquele deve ocorrer pelo valor de mercado (outra novidade da lei em questão).

Por fim, se para um dos ativos isolados da offshore o contribuinte tem a curto prazo uma expectativa de alienação com ganho, o ABEX pode se mostrar convidativo (uma análise cuidadosa se justificaria).

Como se observa, a adoção de ABEX demanda avaliação do plano de vida do contribuinte, especialmente o horizonte mais próximo em relação aos ativos em questão, para que uma suposta economia não seja frustrada por um gasto evitável.

E as Offshores? Seu Tratamento Transparente vale a pena? Provavelmente, não

Se a opção pelo ABEX pode ser viável a depender do prazo esperado para a realização de ganhos nos ativos em questão, a opção pelo tratamento transparente de entidades offshore tende a ser ainda mais restrita.

Pela nova lei, as entidades controladas no exterior que aufiram mais de 40% de sua renda de forma passiva ou que estejam localizadas em paraísos fiscais passam a ser automaticamente tributadas na DAA, ou seja, em periodicidade anual, mesmo que os lucros assim onerados nunca tenham sido disponibilizados ao sócios residentes fiscais no Brasil. Os 15% serão pagos anualmente, desfazendo a grande vantagem dessas estruturas, que era o diferimento do imposto para o momento dos eventuais dividendos (o que também ocorreu pela mesma norma com a instituição do come cotas para fundos fechados onshore, com a desvantagem de nestes os lucros do passado serem tidos como base do primeiro come cotas, ou antecipados a uma taxa de 8%).

Mas, como alternativa, a Lei nº 14.754/2023 deixou ao contribuinte individual brasileiro a opção de usar o chamado tratamento fiscal “transparente”: uma vez assim decidido e declarado pelo interessado, em vez do lucro anual da entidade estrangeira, são os rendimentos decorrentes dos ativos detidos por aquela offshore que serão individualmente registrados e onerados na DAA.

Isso traz inevitavelmente algumas consequências negativas:

(a) assim optando o contribuinte, deve ele então segregar os rendimentos da offshore por suas naturezas, o que pode significar que certos tipos escapem dos 15% anuais padronizados pela Lei nº 14.754/2023 e caiam em outras regras, como as alíquotas mensais e progressivas de até 27,5% (via Carnê-Leão) ou 22,5% (ganho de capital);

(b) além disso, se quando apurados dentro do lucro da offshore os resultados positivos eram absorvidos por despesas de manutenção da entidade, ou mesmo perdas e prejuízos de outros investimentos ali mantidos, o tratamento transparente significaria oferecer a receita bruta ou o mero ganho de capital como rendimento, com limitadas oportunidades de compensações de resultados negativos e nenhuma previsão de dedutibilidade de gastos operacionais da offshore, ou mesmo encargos financeiros tomados via offshore com o único propósito de financiar os mesmos investimentos (que no tratamento opaco seriam claramente parte do seu resultado tributável, reduzindo-o);

(c) por deixar de tributar o resultado do empreendimento, buscando a tributação ativo a ativo, o tratamento transparente também significaria apuração de bases tributáveis em Reais, em vez da natural apuração do ganho do empreendimento em dólares, o que na prática significa tributar eventuais meros ganhos da variação cambial.

Assim, embora aparentemente o tratamento transparente foi concedido como uma opção para quem pretendesse evitar a tributação brasileira sobre lucros ainda não concretamente realizados, ele traz desvantagens evidentes. Ao menos, ele é uma opção, mas vale os interessados primeiro avaliarem com assessores profissionais os detalhes do que se poderia considerar lucro da offshore passível de tributação brasileira. A riqueza e complexidade da matéria decorre de envolver direito e contabilidade, local e internacional, mas tomemos como norte que nada que se fez poderia ter desrespeitado princípios básicos anteriores à Lei de 2023, como o da capacidade contributiva e mesmo o conceito de renda.

Em resumo, o tratamento transparente pode parecer uma opção atraente à primeira vista, mas pode resultar em uma tributação mais elevada para o contribuinte, especialmente se ele não estiver ciente das diferentes alíquotas aplicáveis a cada tipo de rendimento e das restrições impostas pelo tratamento transparente, como a impossibilidade de dedução de despesas e compensação de prejuízos.

Direto ao ponto: em suma, tanto o tratamento transparente quanto a Avaliação de Bens no Exterior (ABEX) são opções que merecem uma análise cuidadosa por parte dos contribuintes que possuem ativos no exterior. Para a maioria dos casos, o tratamento transparente não é vantajoso e pode resultar em uma tributação mais elevada para o contribuinte, especialmente se ele não estiver ciente das diferentes alíquotas aplicáveis a cada tipo de rendimento e das restrições impostas pelo tratamento transparente. Já a adesão ao ABEX deve ser precedida por uma análise minuciosa das circunstâncias de cada contribuinte, pois pode resultar em uma antecipação desnecessária de impostos, sem benefícios práticos significativos a longo prazo.Por fim, é importante reforçar que as informações apresentadas neste artigo têm caráter informativo e não substituem a consulta a um profissional especializado em questões tributárias. Cada caso deve ser analisado individualmente, levando-se em consideração as particularidades de cada contribuinte.