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Reforma tributária: Lula X Bolsonaro

Direto ao ponto: Bolsonaro herdou do ex-presidente Temer uma reforma trabalhista já
entregue e chegou ao poder prometendo ao menos três outras importantes reformas na
sequência: a da previdência (aprovada, embora com impacto menor que o potencial) e as não
entregues reformas administrativa e tributária. Esta última, sem dúvida, é a mais desafiadora.
Afinal, entre as propostas de Lula ou Bolsonaro, quais seriam as diferenças fundamentais de
uma eventual reforma tributária?

Existem duas grandes semelhanças nos programas de governo de Lula e de Bolsonaro para a
reforma tributária:
1) Ambos tratam o tema de forma superficial e deliberadamente otimista; e
2) Tanto um como outro candidato indicam que a reforma é necessária para simplificar o
sistema atual (voltaremos a isso ao final desta análise).
Principais diferenças entre as propostas
Lula: tributar os mais ricos e usar ativamente gastos do Estado para impulsionar a economia
Em seu “Diretrizes para o Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil”, a campanha
do petista reforça a visão esquerdista de que seria tarefa do Estado ativamente incrementar a
atividade econômica. Políticas públicas seriam metade do caminho para o sucesso,
incrementando investimentos com custeio na arrecadação.
Outro destaque do programa é a linha mestra de que o Brasil necessitaria corrigir injustiças,
aumentando impostos sobre os mais ricos em prol de benesses aos menos afortunados. A
arrecadação seria forma de promover “justiça tributária”, propondo-se um sistema mais
simples (como? ainda é mistério) e que migre o custo fiscal do consumo para a renda.
Pouco se fala de mudanças em outros itens, mas podemos citar as promessas de combate à
sonegação e de avançar na “tributação sobre o comércio internacional, desonerando,
progressivamente, produtos com maior valor agregado e tecnologia embarcada”.
Bolsonaro: reduzir tributos e deixar que a iniciativa privada gere o crescimento
Em relação a seu adversário, a principal distinção do plano de reeleição de Bolsonaro para a
seara tributária é o peso do Estado e a importância da iniciativa privada.
Tentando recordar o eleitor de iniciativas em prol da redução da arrecadação, o Presidente
menciona alterações já feitas em diversos tributos (“impostos de importação (II), sobre
produtos industrializados (IPI) e sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS)”), ligando
todas elas à ideia de que serviram e outras similares sempre servirão para impulsionar o
crescimento pelos empresários.
Mais promessas de redução de alíquotas se seguem, inclusive sobre importações, nitidamente
incentivando que o mercado, mais livre, via concorrência, encontre o caminho do crescimento.
Liberdade econômica e competividade são conceitos ditos e repetidos.
Sem surpresas, o programa promete retomar projetos já apresentados ao Congresso, mas não
há uma posição firme sobre as propostas de reforma que já estão no Congresso há anos, nem
sobre temas relevantes como desoneração de folha, o fantasma de um possível imposto sobre
transações financeiras e economia digital.
A verdade: reforma tributária é uma missão impossível em que o Presidente nada controla
Como já tivemos a oportunidade de abordar em evento disponível no nosso canal do YouTube,
uma reforma tributária é algo muitíssimo desafiador, eis que todos os milhares de Municípios,
todos os Estados, o Distrito Federal e a União possuem interesse ímpar na arrecadação e
divisão de recursos. Assim, por mais que seja unânime a percepção de que nosso sistema
tributário é deveras complexo, custoso e inseguro, afugentando investimentos e prejudicando
o crescimento de nossa economia, prejudicando a todos, qualquer proposta de modificá-lo
empaca já na fase inicial de confecção de algo que concilie todos os interessados.
E mesmo quando algum texto já tenha sido preparado e passado pela aprovação das
comissões iniciais do Congresso, como foi o caso das Propostas de Emenda à Constituição
(PECs) 45 e 110, a escolha do melhor momento para sua inserção na pauta do Congresso é
tarefa também delicada, eis que a proposta precisa passar por um verdadeiro corredor
polonês de debates, precisando ser aprovada por quórum qualificado (3/5 dos votos), em
ambas as casas do Congresso, em dois turnos. Alterações na redação do texto durante os
debates precisam retornar à estaca zero. Não existe espaço para muito erro.
Como o sistema tributário atual tem raízes fortes na Constituição, é necessário reformá-la via
PEC para que algo efetivamente inovador veja a luz do dia. Isso deixa o Presidente no banco do
passageiro, pois emendas constitucionais não dependem sequer de sanção ou veto do
Executivo.
A Presidência da República tem papel importante, mas este se limita a apoiar uma ideia em
detrimento das demais, talvez influenciando deputados e senadores em seus votos (no jogo
político de Brasília, muito mais que a defesa de conceitos e princípios, a divisão do orçamento
federal e a indicação de Ministérios são as ferramentas mais utilizadas para essa influência).
Se o Presidente quiser facilitar sua vida, acabará focando em reformas pontuais, menos
complexas (mas também difíceis), especialmente em tributos federais, em que possui
competência para apresentar projetos de lei e medidas provisórias, mas fica igualmente
sujeito ao aval do Legislativo, embora com quórum e requisitos facilitados.
A vantagem dessa estratégia é que nem todos os tributos federais impactam nos orçamentos
de Estados, Municípios e Distrito Federal, ficando a discussão política de sua alteração
centrada nos custos para os setores produtivos, que seriam mais ou menos incentivados. Mas
isso está longe de ser receita de sucesso.
Ajustes pontuais prometidos agora na campanha à reeleição já foram apresentados por
Bolsonaro e seu Ministro Guedes no atual mandato, como a reforma do Imposto de Renda (e
sua famosa extinção limitada da isenção de dividendos) e a criação da Contribuição de Bens e
Serviços (unificando PIS/COFINS em um regime amplo e não cumulativo). Analisamos ambos
os projetos na ocasião (leia aqui e aqui), mas eles acabaram chegando até a eleição sem
avanços no Congresso. Muito pelo contrário, o que vimos foi rejeição ampla da CBS e uma
derrota do projeto do IR no Congresso, tendo ele sido diluído a cada nova versão de seu texto,
até seu último adiamento indefinido.
Direto ao ponto: independentemente de quem venha a ser o vencedor das eleições, a verdade
é que o próximo Presidente da República tem poderes muitíssimos limitados sobre uma
possível Reforma Tributária. Tendo em vista a necessidade de remanejamento de
competências, o tema demanda uma proposta de emenda constitucional, que sequer fica
sujeita a sanção presidencial. O papel do executivo acaba se limitando a politicamente assumir
a defesa de ideias perante o Congresso (algo sem dúvida importante em Brasília, mas não
determinante para o sucesso da empreitada). Mesmo em relação a tributos federais,
normalmente há interesse de Estados e Municípios nos repasses de arrecadação e sempre há a
necessidade de qualquer medida provisória ou projeto de lei obter o aval da Câmara dos
Deputados e do Senado Federal, embora com quórum e ritos menos complicados.
Infelizmente, ainda que haja ideias algo avançadas no Congresso, não seria espantoso
chegarmos a 2026 com o tema sendo novamente uma promessa de campanha.

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