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11 X 0: vale a pena comprar ingresso para assistir a essa derrota fulminante?

Direto ao Ponto: 11 X 0. Se você achava que uma das piores derrotas dos brasileiros tinha sido o famoso 7 x 1 da Copa de 2014, estava enganado! Alguns contribuintes perderam, recentemente, o direito à recuperação do IRPJ e da CSLL incidentes sobre a Selic acrescida aos créditos tributários recuperados nos últimos cinco anos. 

Esse foi o resultado do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no último dia 30 de abril, por ocasião do julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário nº 1.063.187, no qual se limitou a possibilidade de recuperação daqueles créditos de IRPJ e CSLL à data de 30.9.21, quando publicada a ata de julgamento do Tema pelo Supremo. Os únicos excetuados foram os contribuintes que tinham ajuizado ações para garantir o seu direito até 17.9.21, quando iniciado o julgamento em Plenário Virtual.

E por que esse resultado é considerado uma grande derrota?

Porque os contribuintes que correram ao Judiciário impetrando milhares de mandados de segurança após o início do julgamento do tema pelo STF, ou seja, após 17.9.21, quando já haviam sido proferidos alguns votos que anunciavam a vitória dos contribuintes contra o Fisco, ficaram a ver navios. O famoso ganha mais não leva!

Esses contribuintes, como todos os demais, tiveram garantido seu direito futuro, o direito de deixar de recolher o IRPJ e a CSLL sobre a SELIC acrescida aos indébitos tributários, mas os 5 anos anteriores à impetração, a recuperação de eventual IRPJ e CSLL pagos a maior nesse período pretérito, restou perdido.

E, vejam, muitos desses mesmos contribuintes já haviam recuperado valores vultuosos a título de crédito tributário, a exemplo dos créditos oriundos da Tese do Século, da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS. O IRPJ e a CSLL apurados sobre a Selic acrescida àqueles créditos de PIS e COFINS poderiam ser recuperados. Mas, não, essa recuperação está, para sempre, perdida(1).

Não nos faltam críticas à modulação dos efeitos dos julgamentos em matéria tributária pelo STF, mais especificamente sobre a falta de critérios na fixação de seu marco temporal e da motivação para a aplicação do instituto.

Tanto a Lei nº 9.868/1999, em seu artigo 47, quanto o Código de Processo Civil, no parágrafo 3º do artigo 927, dispõem acerca da possibilidade de o Supremo Tribunal Federal modular suas decisões de declaração de inconstitucionalidade, em razão do interesse social ou da segurança jurídica.

Inicialmente, vale chamar atenção ao fato de a aplicação do instituto da modulação das decisões de declaração de inconstitucionalidade do STF estarem atreladas notadamente ao princípio da segurança jurídica, encontrando razão na necessidade de garantia dos direitos fundamentais do cidadão, dentre os quais o da liberdade, que somente se viabiliza diante da previsibilidade dos atos estatais.

No âmbito do direito tributário, podemos falar da previsibilidade dos atos de cobrança e de fiscalização do Estados e das obrigações a eles pertinentes impostas aos contribuintes. Esses contribuintes têm como margem da sua liberdade e de sua liberalidade de planejar essas ordens que lhe são impostas pelo Estado.

Nesse sentido, a modulação dos efeitos das decisões de declaração de inconstitucionalidade pelo STF encontraria esteio na manutenção da ordem das relações institucionais, da confiança que norteia a relação entre Estado e cidadãos, entre Fisco e contribuinte, mantendo-as imutáveis no que diz respeito ao passado e chamando o Legislativo à atuação quanto ao futuro.

No entanto, justamente em prol dessa relação de confiança, não deveria o Supremo agir politicamente e, mirando o bem comum, compensar os contribuintes pelas abusividades perpetradas pelo Estado ao instituir exações com bases inconstitucionais? Há forte corrente doutrinária, de origem alemã, defendendo que sim.

Vejam, qualquer das duas correntes à qual viesse se agarrar a Corte Constitucional encontraria sustentação na experiência comparada. Haveria justificativa para que o STF viesse ou não modular suas decisões casuisticamente, considerando-se as peculiaridades do caso em cena, do tributo, dos contribuintes e até mesmo da referibilidade do tributo. Bastaria que, para tanto, motivasse, o STF, as suas razões de decidir, tal como, aliás, determina o artigo 11 do Código de Processo Civil.

No entanto, o que a experiência nos tem mostrado são parcas linhas escritas acerca do tema. As decisões do STF não trazem a motivação para a modulação de seus efeitos, menos ainda as razões ou critérios para a utilização de certo marco temporal para tanto.

Em que pese a extrema diversidade das decisões proferidas pelo STF quanto à modulação dos efeitos de seus julgados, seja quanto à motivação, seja quanto ao seu critério temporal, ousamos dizer que as mais recentes têm procurado tratar desigualmente os desiguais, tanto assegurando a estabilização do passado para Fisco e contribuinte, no sentido de não autorizar cobranças pretéritas por aqueles, nem recuperação de indébitos por estes, exceto no caso de terem os contribuintes se socorrido a tempo do Judiciário.

Vejam que contribuintes que se socorrem do Judiciário e contribuintes que aguardam passivamente suas decisões, conformando-se com a legislação e recolhendo tributos com bases inconstitucionais, estão em diferentes categorias e, portanto, não somente em prol da segurança jurídica, mas também do direito fundamental da igualdade, devem ser tratados desigualmente. Sim, o princípio da igualdade impõe que os desiguais sejam desigualmente tratados. Assim, o ressarcimento do tributo, como forma de reparação imposta ao Estado, deve alcançar aqueles que se impuseram contra a ordem vigente.

Com relação a essa categoria de contribuintes, aqueles que têm manifestado o seu descontentamento com os tributos cujas matrizes são percebidas em descompasso com a Constituição, paira a insegurança sobre o marco temporal que será utilizado pelo STF para fins de modulação dos efeitos de suas decisões. Diversos têm sido esses marcos, aplicados de acordo com a casuística.

Em que pese aquela determinação de que sejam fundamentadas as decisões emanadas pelo Judiciário, de que seja a modulação dos efeitos das decisões declaratórias de inconstitucionalidade proferidas pelo Supremo seja realizada à luz da segurança jurídica ou do interesse social, que visem a uniformização da jurisprudência diante da eventual alteração de precedentes, o que observamos é o casuísmo.

Casuísmo que, como no direito comparado, não dá indícios de qualquer regularidade que possa nos levar a um ambiente mais seguro para a tomada de decisão quanto ao melhor momento ou ao momento limite para aquele contribuinte que não pretende se conformar com exigências fiscais tidas por inconstitucionais valha-se do Judiciário, ajuizando ação competente. Essa data pode ser a inclusão do Tema em pauta para julgamento pelo STF, o início do julgamento em Plenário Virtual, a data final do julgamento em questão, a de publicação da Ata de Julgamento, a de publicação do Acórdão, quiçá a do trânsito em julgado da decisão.

Diante de mares tempestuosos e caminhos sinuosos, há uma única certeza: dormientibus non succurrit jus(2)! Diante de potencial inconstitucionalidade que macule exigência de tributo e que possa importar em recuperação de crédito, é pertinente a consideração de variáveis como o custo x benefício do ingresso de medida judicial, na qual serão computadas despesas com honorários advocatícios e custas judiciais versus o montante estimado do crédito almejado, a potencial condenação em sucumbência e sua representatividade financeira, além de eventuais riscos indiretos do litígio. 

A resposta a essa equação certamente não apontará a data do ajuizamento da ação pelo contribuinte, menos ainda a data da modulação dos efeitos da decisão do STF, mas, de pronto, dirá acerca da conveniência ou não de sua propositura. Em sendo viável, contribuintes, comprem seus ingressos para essa partida. De certo, nenhum placar histórico soterrará as suas esperanças de ver mais cheios o caixa da empresa, não, ao menos, por não ter entrado em campo para essa partida. 

(1) Exceção feita aos lançamentos contábeis de reconhecimento de créditos tributários ainda passíveis de reversão.
(2) O Direito não socorre aos que dormem.