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Cash is king: estratégias tributárias para gerar caixa durante a tempestade

Direto ao ponto: a atual crise tem demandado inovação e liderança, mas especialmente soluções que resguardem o caixa dos negócios, recurso essencial para sobreviver à tempestade. Algumas estratégias tributárias podem ser valiosas para minimizar prejuízos e fortalecer o negócio para o futuro pós-COVID. Resumimos aqui algumas oportunidades com potencial de ganho notável, algumas de fácil implementação.

Existe muita incerteza quanto à crise atual. Embora ela deva passar, como todas as crises passam, ainda é impossível prever quando ou qual será o cenário após um período tão desafiador e inesperado. A urgência no ambiente de negócios é a de manter as empresas vivas e isso vai depender de muitas coisas, em especial, da capacidade delas de manter caixa. Nesse contexto, a temática tributária pode ser a diferença entre portas fechadas para sempre e uma retomada triunfante.

Felizmente, existem diversas oportunidades de priorizar o caixa com estratégias tributárias. Parte delas pode ser direcionada à postergação ou redução de dívidas assumidas e seu custo de defesa, parte à recuperação de créditos. Nossa sócia Fernanda Lains tratou dessas duas frentes nos artigos dela do nosso Tax & Ponto de março (link) e deste mês (link). Este artigo foca numa terceira frente: o planejamento tributário mediante a revisão de rotinas internas.

Oportunidades tributárias para redução de obrigações a vencer: revisão de rotinas

Em razão da carga fiscal representar custo e tempo relevantes para todo negócio, e haver um verdadeiro cipoal de regras tributárias e interpretações, é oportuno que se revise se os regimes e tratamentos aplicados não poderiam ser substituídos por outros que no momento atual sejam mais amenos. Algumas ideias:

  1. Não-pagamento de IPTU em tempos excepcionais: em muitos negócios, o acesso do público consumidor e mesmo de colaboradores ao estabelecimento está vedado temporariamente. Baseando-se no entendimento de que o direito de propriedade está sofrendo uma limitação  e não está sendo disponível de forma plena, há jurisprudência favorável à não exigência de IPTU em tempos excepcionais como o atual.
  • Não-exigência de contribuições sobre folha de funcionários: Para aqueles negócios em que os empregados estejam sendo impedidos de trabalhar, inclusive remotamente, pode-se requerer a não exigência das contribuições sobre folha. Com o empregado sem trabalhar, a remuneração arcada pela empresa perde a natureza de salário, inexistindo a chamada referibilidade necessária para a incidência daqueles tributos.
  • Opção pelo Lucro Real Trimestral: contribuintes optantes do Lucro Presumido normalmente partem da premissa de que seus resultados justificarão o regime com margem de lucro fixada sobre um percentual da receita bruta. Contudo, tais projeções fatalmente vão se mostrar equivocadas para a maioria dos negócios, dados os efeitos nefastos da crise sobre suas operações, na medida em que as despesas e prejuízos tendem a aumentar, fazendo a receita diminuir. A opção pelo Lucro Real Trimestral permitiria a redução da base de IRPJ e CSLL (calculados pelo lucro líquido), mantendo os vencimentos trimestrais e a possibilidade de compensação com créditos federais, como os de PIS e COFINS (ambas alternativas inexistentes no regime do Lucro Real anual).
  • Uso de despesas com variação cambial: a forte desvalorização atual da moeda nacional – sobretudo frente ao dólar – disparou a possibilidade de as empresas optarem entre os regimes de caixa e de competência para tributação de operações sujeitas a tal variação, podendo haver uma oportunidade de redução de base fiscal e consequente economia de recursos.
  • Revisão do supply chain location e classificações fiscais: boa parte dos tributos dependem de como o contribuinte classifica seus insumos e produtos, ou de e para onde eles são direcionados. Uma revisão dos códigos tributáris (NCM) dos produtos com maior relevância e uma análise estratégica da localização do desembaraço aduaneiro, armazenamento, distribuição e revenda pode trazer economia significativa, assim como o estudo quanto à possibilidade de industrialização em zonas incentivadas.
  • Revisão de contratos para otimizar efeitos fiscais: revisitar os maiores contratos da empresa é mais uma forma de buscar oportunidades fiscais, tanto com fornecedores como com seus clientes. O uso de cláusulas de gross up de tributos e a segregação do faturamento por natureza de bens, serviços e direitos pode representar notável economia sobre receitas e custos, como no caso de remessas de royalties acompanhados de importação de serviços, faturamento de serviços de terceiros e inclusão ou exclusão de reembolso de custos e despesas do preço.
  • Patrocínio de teses tributárias já reconhecidas: em muitos casos, pode haver uma oportunidade praticamente sem risco, ou com risco administrável, na revisão de incidências fiscais sobre gastos relevantes. Exemplos são os custos com a coparticipação no plano de saúde (e a base de INSS), as chamadas verbas indenizatórias (muitas já nem sujeitas a recurso pelo órgão fazendário) e a classificação de gastos para funcionamento da empresa durante a quarentena como essenciais (por exemplo, para fins de creditamento de PIS/COFINS sobre custos com TI para habilitar o home office e comunicações com clientes e mercado).
  • Provisões convertidas em perdas efetivas ou cancelamentos: durante uma crise como a atual será (infelizmente) muito comum a discussão entre fornecedores e clientes quanto a obrigações vencidas e não quitadas. Os tributos sobre tais operações, no entanto, costumam incidir independentemente de vencimento, pagamento e efetiva liquidação financeira. Para casos em que tenha havido cancelamento do negócio após a incidência fiscal, o contribuinte pode ficar atento à possibilidade de recuperação de tributos. Em outros casos, pode fazer sentido a empresa renegociar com clientes e converter uma provável perda em efetiva, para fugir dos requisitos quanto à dedutibilidade das chamadas Perdas Estimadas sobre Crédito de Liquidação Duvidosa (PECLD) – coloquialmente conhecidas como “PDDs” – e assegurar uma vantagem fiscal com uma perda efetiva e, portanto, dedutível (IRPJ/CSLL) ou não tributável (PIS/COFINS).
  1. Revisar planos de incentivo/PLR, para adequar metas e prazos: Por último, uma ideia que vai além dos efeitos tributários, mas útil- mesmo em um período demandante de caixa, as empresas podem se ver diante da obrigação previamente assumida quanto ao adimplemento de bônus, Participação de Lucros e Resultados (PLR) e demais participações de colaboradores e executivos. Parte das metas estipuladas, porém, podem se mostrar totalmente descabidas quando se observa a projeção de resultados para 2020, de modo que não faria sentido premiar colaboradores com um resultado que já se sabe vá ser inescapavelmente revertido de imediato. Ainda que mantidas tais obrigações, pode fazer todo sentido renegociar com os interessados o fluxo de pagamento de tais compromissos, conciliando o caixa com o momento atual.

Direto ao ponto: para sobreviver à crise atual as empresas terão suas lideranças testadas. Inovação e eficiência serão exigidas, mas em qualquer caso o caixa será um recurso essencial. Num país em que a carga tributária representa mais de um terço do PIB, faz todo sentido revisitar rotinas e oportunidades fiscais para reduzir obrigações e potencializar ativos, permitindo que os negócios saiam vivos e mais preparados da tempestade. Este artigo resume algumas iniciativas com potencial de ganho notável, boa parte delas de fácil e rápida implementação, sem restrição de setor econômico, servindo para a maior parte das empresas no Brasil.

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