Publicado originalmente em outubro/2016, por Matheus Bueno de Oliveira e Diego Cruz
No Diário Oficial da União de dia 23.09.2016 foi publicado o Decreto nº 8.853, que altera o Decreto nº 7.574/2011 e, portanto, as regras do Processo Administrativo Fiscal (“PAF”) Federal. O tema é relevante aos contribuintes brasileiros porque disciplina virtualmente todas as comunicações oficiais entre fisco e particulares.
Dentre as novas regras a serem adotadas, merecem destaques as seguintes:
A) A ampliação das funcionalidades do processo eletrônico
A.1) A possibilidade de intimação dos contribuintes por meio digital (art. 2º, parágrafo único);.
A.2) Os processos de consulta poderão ser formulados por meio eletrônico (art. 91, parágrafo único);
A.3) Os documentos que instruem os processos administrativos poderão ser digitalizados, sendo que sua autenticidade se dará por meio de certificado digital, com a possibilidade de descarte dos documentos físicos que já tiverem sido digitalizados, ressalvadas algumas hipóteses (arts. 147-A, 147-B e 147-C).
B) Da aplicação de descontos nos casos de pagamento e parcelamento de multas isoladas
B.1) Foram acrescentados o parágrafo 3º ao art. 52 e parágrafo 4º ao art. 53, os quais determinam que, nos casos em que o contribuinte optar pelo pagamento do débito (art. 52) ou parcelamento (art. 53), os descontos previstos no caput dos artigos para os valores da multa de lançamento de ofício (50% no caso de pagamento e 45% no caso de parcelamento) serão estendidos às multas isoladas.
C) Do recurso de ofício em face das decisões que excluir contribuinte do polo passivo da autuação
C.1) Foi acrescentado o parágrafo 3º ao art. 70, o qual prevê a necessidade de interposição de recurso de ofício (automático) pela autoridade competente nos casos em que houver exclusão de sujeito passivo de auto de infração lavrado em face de uma pluralidade de devedores, caso o débito esteja acima de valor a ser determinado por ato do Ministro da Fazenda.
D) Dos processos de consulta
D.1) O art. 88 do Decreto ampliou o objeto dos processos de consulta, permitindo que o contribuinte possa elaborar consulta sobre a classificação fiscal de serviços e não apenas de mercadorias, as quais, como visto, poderão ser feitas por meio eletrônico;
D.2) As consultas passam a ter um prazo máximo para solução de 360 dias contados do protocolo do pedido (art. 95, parágrafo 2º);
E) Das compensações requeridas pelo contribuinte
E.1) Revogado o art. 103 do Decreto nº 7.574/2014, o qual estabelecia que, quando dados ou documentos solicitados ao interessado forem necessários à apreciação de pedido formulado, o não atendimento no prazo fixado pela administração para a respectiva apresentação implicaria o arquivamento do processo, não havendo mais a previsão do arquivamento dos processos de compensação no caso de não atuação do contribuinte.
F) Compensação de Ofício pela RFB estendida a parcelamentos não garantidos
F.1) A compensação de ofício por parte da RFB ocorrerá nos casos de débitos não parcelados, ou parcelados sem garantia, inscrito em dívida ativa. A redação anterior só mencionava a necessidade de existência de débito em nome do contribuinte, sem qualquer alusão aos programas de parcelamento.
Um ponto a ser questionado nessa mudança é a possibilidade de que eventuais créditos sejam compensados com dívidas incluídas em parcelamento ordinário (que não precisam de garantia), uma vez que o contribuinte escolheu o parcelamento justamente para que não sofresse o desembolso imediato do valor da dívida. Essa previsão pode prejudicar contribuintes que pagam as parcelas em dia e necessitariam do crédito para fazer frente a outras demandas.
G) Dos Recursos Contra Decisão que Considerar a Compensação Não Declarada
G.1) O Decreto criou um novo dispositivo (art. 119-A), o qual diferencia o recurso em face de decisão que não homologar a compensação da decisão que considerar a compensação não declarada (art. 119).
Em face da decisão que considerar a compensação não declarada, caberá a interposição de recurso no prazo de 10 dias (Recurso Hierárquico – arts. 56 c/c 59 da Lei nº 9.784/99).
Nos moldes do parágrafo único, inciso, I do citado decreto, o Recurso Hierárquico, ao contrário do recurso contra decisão de não homologação, não terá efeito suspensivo e, ao invés de ser julgado pelo CARF, será julgado por titular da Superintendência Regional da Receita Federal do Brasil com jurisdição sobre o domicílio tributário do recorrente, fulminando o entendimento da possibilidade de protocolo de manifestação de inconformidade em face da decisão.
H) Da Ampliação dos Poderes do Auditor Fiscal
Os poderes do Auditor Fiscal foram ampliados, possibilitando a ele:
H.1) assinar não só o auto de infração, como a notificação de lançamento que, anteriormente, cabia apenas ao chefe da unidade da RFB (art. 40), a qual poderá ser feita de modo eletrônico (Art. 40, parágrafo único);
H.2) determinar a baixa do arrolamento de bens (existente quando o auto de infração tiver valor maior que R$ 2.000.000,00 e superar 30% do patrimônio do devedor). Anteriormente tal atribuição só cabia aos chefes das Unidades da RFB com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo (art. 43, parágrafo 7º);
H.3) deferir a substituição de bens ou direitos arrolados, o que, anteriormente, cabia apenas ao chefe da unidade da Secretaria da RFB com jurisdição sobre o domicílio tributário do contribuinte (art. 44, parágrafo 2º);
H.4) decidir acerca da homologação de compensação declarada pelo contribuinte, anteriormente possibilitado à “autoridade administrativa” (art. 112);
H.5) apreciar os pedidos de restituição, ressarcimento e reembolso dos tributos administrados pela RFB bem como da restituição relativa a direitos antidumping e a direitos compensatórios. Isso não cabe mais do chefe da unidade da Secretaria da RFB (art. 117);
H.6) Em observância ao Decreto nº 8.853 de 2016, a RFB emitiu, em 29.9.2016, a Instrução Normativa RFB nº 1661, na qual alterou a instrução Normativa RFB nº 1.300 de 20.11.2012, deixando claro em seus arts. 107 e 107-A que a competência para decidir sobre a restituição, ressarcimento, reembolso e compensação passa a ser do Auditor Fiscal, sendo certo que anteriormente, a IN só fazia menção às delegacias da RFB.
I) Dos bens arrolados
I.1) Houve modificação no parágrafo 2º do art. 44 quanto aos requisitos para substituição de bens arrolados, sendo necessária a previsão expressa de que o bem substituto deverá ter valor igual ao superior ao do substituído respeitar uma ordem de prioridade definida pela Secretaria da RFB, mediante avaliação de perito indicado pelo órgão de registro do bem.
Observa-se que a redação anterior só previa o requisito da autorização do chefe de unidade da Secretaria da RFB;
I.2) O contribuinte poderá requerer, anualmente, reavaliação dos bens arrolados com o intuito de evitar excesso de garantia numa possível valorização dos bens, que será feito por perito indicado pelo próprio órgão de registo do bem, sendo certo que tal avaliação será paga pelo contribuinte (art. 44, parágrafo 3º).