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Dívidas fiscais de sociedade dissolvida irregularmente contaminam patrimônio de administradores, mesmo os que ingressaram após o surgimento daquelas

Direto ao ponto: Em recente decisão com eficácia abrangente, o STJ autorizou o redirecionamento de execução fiscal em face do sócio gerente à época da dissolução irregular da pessoa jurídica executada. Assim, mesmo que a pessoa física não tenha participado da sociedade quando do nascimento da dívida, ela fica exposta à cobrança por ter integrado a sociedade na ocasião de seu irregular fechamento. A decisão manda um claro alerta a quem pretende ingressar ou já participa de empreendimentos em sociedade: por mais atrativo que seja o negócio, é sempre propícia a revisão da situação fiscal da entidade, pois acaso esta se torne incortonável e seu encerramento não possa ser precedido da devida baixa, serão os sócios de então os expostos ao risco de perseguição de seus patrimônios pessoais.

Um exemplo didático

Cabe iniciarmos apresentando um exemplo prático em que se pode ver claramente a importância do que foi decidido acima: Uma pessoa física (Sócio A) se converte em acionista com poderes de gerência de uma sociedade empresarial em pleno funcionamento. Em pouco tempo, percebe que a sociedade deve vários tributos e não consegue pagá-los. Outro sócio (Sócio B) que atuara como administrador da sociedade quando o crédito tributário foi gerado aliena suas ações e logra deixar a sociedade antes do interrompimento de seu funcionamento. A sociedade tenta fechar as suas portas de forma regular perante a Junta Comercial, porém não consegue porque justamente a existência das dívidas impede a emissão da certidão de regularidade fiscal (CND), algo essencial para o encerramento regular do empreendimento. A situação torna-se uma armadilha, já que os sócios acabam tendo de na prática fechar as portas sem comunicar o fim da sociedade empresária nem a mudança de domicílio fiscal ao Fisco. Qualquer ato de cobrança fiscal, como uma execução, invariavelmente tentará citar a PJ devedora no endereço oficial, e por ali não ser ela localizada a procuradoria credora inescapavelmente pedirá ao juízo competente o reconhecimento da responsabilização dos sócios por conta da dissolução irregular da sociedade. Com a decisão recente do STJ, os responsabilizados imediatos seriam os sócios que constarem como participantes do empreendimento na ocasião do encerramento verificado de forma irregular, mesmo que, como no exemplo do Sócio A, não tenham eles participado das decisões que deram origem ao passivo em questão.

O fundamento legal e a importância da decisão

O fundamento legal utilizado pelo STJ para responder quem paga as dívidas tributárias de uma empresa que não está mais localizada no seu endereço fiscal está no art. 135, III, CTN: “São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: (…) III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”

A norma foi complementada pela Súmula 435/STJ, que estabelece: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.” 

Agora, com base em outros julgados (tema 981), os ministros do STJ fixaram a seguinte tese: “O redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido conforme artigo 135, inciso III, do CTN”.

Com essa decisão, o STJ está então interpretando que o passivo fiscal é da sociedade, mas passa a ser de responsabilidade dos sócios gerentes/administradores presentes quando da dissolução irregular, o que não está necessariamente coincidente com o quadro social da época do vencimento das obrigações inadimplidas. Ora, como as normas enunciadas no sentido de olhar para quem administrava a sociedade na hora da dissolução irregular. Em resumo, não importa quem atuava no papel de sócio quando gerada a dívida, mas sim quem a sociedade integrava na sua dissolução amadora.

Portanto, o sócio gerente ou mesmo o administrador da época do fato gerador ou do vencimento do tributo só poderia ser chamado a responder pessoalmente pelo passivo caso se comprove haver outra infração por este cometida naquela época ou se permanecer ele integrando o empreendimento em sua dissolução irregular.

A decisão noticiada foi proferida pela Primeira Seção do STJ e é determinante sobre o tema, não podendo mais ser objeto de revisão naquele processo, sendo também improvável sua reapreciação em outros casos. Como o precedente tratava de matéria de interesse público (dívidas fiscais), não haveria automática aplicação de seu raciocínio para os créditos cíveis, assim como para situações em que os créditos sejam tributários mas não exista encerramento ilegal das atividades. Para estes, a responsabilidade dos sócios continua delimitada pelo valor do capital social ainda não integralizado, exceto outra ilegalidade ou fraude (que não a dissolução irregular) seja trazida pelo credor à apreciação do Judiciário.


Direto ao ponto: na prática, a recente resolução do STJ viabiliza a cobrança do crédito tributário de forma mais imediata. Só pelo fato de ser sócio no momento da dissolução irregular expõe o indivíduo a responder pessoalmente pelas dívidas tributárias da empresa. Em virtude desse julgado, existem sérios riscos de se ingressar como sócio de empresa que, embora aparentemente em funcionamento saudável, possua contingências e passivos tributários, os quais podem tardar anos para alcançar a fase final de execução. Alguns cuidados prévios são recomendáveis para aumentar a margem de segurança do empreendor empresário: (i) fazer uma adequada due dilligence com informações atualizadas da PJ, incluindo não apenas débitos tributários já sabidos mas exposições a riscos potenciais; (ii) sair da sociedade a tempo, antes de ela chegar ao ponto de não poder prosseguir e acabar tendo de ser dissolvida; (iii) no caso de dissolução, dar a baixa na Junta Comercial de forma correta e cuidadosa para não correr o risco de acabar em dissolução irregular; (iv) ter um programa de compliance para ter uma visão mais completa dos processos e de como ela opera o negócio em diferentes frentes, evitando surpresas indesejadas.