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Distribuição de dividendos sem cobertura cambial: aspectos regulatórios e tributários da transferência de valores detidos no exterior por pessoa jurídica brasileira para conta bancária estrangeira de sócio residente no Brasil

  1. Premissas Fáticas

O presente artigo analisa a possibilidade de pagamento de valores detidos em moeda estrangeira, originados de conta bancária de pessoa jurídica brasileira no exterior, para conta bancária detida por pessoa física brasileira também no exterior, sob a ótica regulatória e fiscal no Brasil. Existem dúvidas sobre a possibilidade regulatória da distribuição dos valores entre contas correntes detidas no exterior, pela pessoa jurídica e por seu sócio, sem a necessidade do ingresso financeiro ou simbólico dos recursos no Brasil, e sua consequente tributação, tanto na distribuição pela pessoa jurídica como no recebimento pela pessoa física.

Diante deste contexto, que não é raro entre prestadores de serviços de consultoria, o sócio pessoa física (“Pessoa Física”) detém participação societária em sociedade limitada no Brasil (doravante “Sociedade”), cujo objeto social é, primordialmente, prestar serviços de consultoria empresarial (notadamente, financeira e econômica). A Sociedade detém conta bancária no exterior, devidamente declarada para fins regulatórios e tributários.

A Pessoa Física é residente fiscal no Brasil e também possui uma conta bancária no exterior, devidamente declarada para fins regulatórios e tributários. Além disso, a Sociedade atualmente (para o ano-exercício de 2015) é optante pelo regime de Lucro Presumido[1], para fins de apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (“IRPJ”) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (“CSLL”).

Ademais, a sociedade está sujeita a sistemática da não-cumulatividade para fins de apuração e tributação da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (“COFINS”) e Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS), referidas em conjunto como Contribuições Sociais ao PIS e à COFINS (doravante “PIS/COFINS”).

Adicionalmente, os serviços de consultoria empresarial, objeto da presente consulta, foram prestados pela Sociedade em favor de cliente (tomador) sediado no exterior, partindo-se da premissa (sem qualquer exame do contrato de prestação de serviços, notas fiscais e/ou demais documentos que embasam tal prestação) de que essa prestação de serviços deve ser caracterizada como uma exportação de serviços para o exterior, nos termos da Lei Complementar 116/03 (“LC 116/03”).

Nesse contexto fático, a Sociedade recebe pagamentos do preço previsto em contrato celebrado entre ela e o cliente localizado no exterior, em contraprestação aos serviços de consultoria empresarial, prestados em favor do cliente. Tais valores foram transferidos para a conta bancária da Sociedade no exterior, e recebidos em moeda estrangeira.

Diante dos fatos mencionados, questiona-se a possibilidade de recebimento dos montantes decorrentes do preço dos serviços exportados para o cliente, em conta bancária da Sociedade (i.e., Pessoa Jurídica) no exterior para, em seguida, ser utilizado para pagamento de dividendo para a conta bancária no exterior da Pessoa Física, sócia da Sociedade, sem transitar financeiramente pela conta bancária brasileira de nenhum deles (Sociedade e Pessoa Física). Ademais, importante examinar os impactos fiscais brasileiros dessa transação, tanto para a Sociedade, como para a Pessoa Física.

É o que passaremos a examinar a seguir neste estudo.

  1. Análise Regulatória da Operação Realizada
  1.  Legislação Aplicável

Inicialmente, devemos ressaltar que a possibilidade de pessoas físicas ou jurídicas exportadoras de mercadorias e serviços manterem contas bancárias no exterior, em moeda estrangeira, sem a necessidade do ingresso financeiro dos valores recebidos como contraprestação pelas referidas exportações, foi regulada pela Medida Provisória nº 315/06, posteriormente, convertida na Lei 11.371/06.

De acordo com o art. 1º da referida lei[2], foi autorizada a manutenção, em instituição financeira no exterior, de receitas em moeda estrangeira de exportações de bens e de serviços, realizadas por pessoas físicas e jurídicas brasileiras.

Ressalte-se que, anteriormente à publicação da Medida Provisória 315/06, todas as operações de recebimento de exportações estavam sujeitas à cobertura cambial[3], nos termos do Decreto 23.258/33[4], sob pena de aplicação de multa que poderia chegar até o dobro do valor da operação (art. 6º do Decreto 23.258/33).

De acordo com a Lei nº 11.371/06, os recursos podem ser mantidos em instituição financeira no exterior, desde que observados os limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional (“CMN”). À época, o CMN, por meio da Resolução nº 3.389/06, estabeleceu que os exportadores brasileiros de mercadorias e serviços poderiam manter, no exterior, o valor correspondente a, no máximo, 30% da receita de suas exportações, devendo a parcela restante (i.e., 70%) ingressar no Brasil, financeira e cambialmente.

Os 30% mantidos no exterior somente poderiam ser utilizados para: (i) a realização de investimento; (ii) aplicação financeira; ou (iii) pagamento de obrigação do exportador; sendo vedada a concessão de empréstimos de qualquer natureza utilizando-se do montante mantido em conta bancária no exterior.

A partir de 2008, com a publicação da Resolução CMN 3.548/08[5], foi autorizada a manutenção no exterior da totalidade dos recursos relativos ao recebimento das exportações de mercadorias e serviços realizadas por pessoas físicas ou jurídicas brasileiras. Desta forma, desde 2008 é possível a manutenção de 100% dos valores recebidos em conta corrente no exterior, detida por exportador de mercadorias e serviços, sem a necessidade de internalizar qualquer parcela do referido recebimento de exportação. Posteriormente, a Resolução CMN 3.719/09[6], bem como a Resolução CMN 4.051/12[7], mantiveram a referida autorização. Atualmente, é a Resolução CMN 3.568/08 (com alterações em seu texto original) que regulamenta o tema.

Interessante notar que as destinações dos recursos recebidos em decorrência de exportações expressamente pelo art. 1º, parágrafo 2º, da Lei 11.371/06 permanecem mantidas até hoje, conforme abaixo transcrito:

Art. 1º. Os recursos em moeda estrangeira relativos aos recebimentos de exportações brasileiras de mercadorias e de serviços para o exterior, realizadas por pessoas físicas ou jurídicas, poderão ser mantidos em instituição financeira no exterior, observados os limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional.

§ 1º. O Conselho Monetário Nacional disporá sobre a forma e as condições para a aplicação do disposto no caput, deste artigo, vedado o tratamento diferenciado por setor ou atividade econômica.

§ 2º. Os recursos mantidos no exterior na forma deste artigo somente poderão ser utilizados para a realização de investimento, aplicação financeira ou pagamento de obrigação próprios do exportador, vedada a realização de empréstimo ou mútuo de qualquer natureza. (grifamos)

Deste modo, os recursos mantidos em conta bancária no exterior somente poderão ser destinados para as seguintes operações próprias do exportador:

  • realização de investimento;
  • aplicação financeira; ou
  • pagamento de obrigação.

Ademais, manteve-se a proibição de realização de empréstimo ou mútuo com tais valores detidos no exterior[8].

Convém ressaltar que a utilização de recursos no exterior de forma diversa das mencionadas acima (inclusive, se realizados empréstimos/mútuos com tais valores pela Sociedade), acarreta a aplicação de multa de natureza fiscal[9] de 10% sobre o valor dos recursos, sem prejuízo da cobrança dos tributos eventualmente devidos (a depender dos termos e condições da operação realizada), podendo ser dobrada em caso de fraude, conforme dispõe o art. 9º da Lei 11.371/06[10].

Adicionalmente, a pessoa jurídica que mantiver recursos no exterior é obrigada a manter escrituração contábil nos termos da legislação comercial, para demonstrar, destacadamente, os respectivos saldos e suas movimentações, independentemente do regime de apuração do imposto de renda adotado[11], sob pena de serem aplicadas as penalidades acima descritas (sem prejuízo da cobrança de tributos devidos).

A manutenção dos recursos no exterior também implica na autorização para fornecimento à Receita Federal do Brasil (“RFB”), pela instituição financeira ou qualquer outro interveniente, residente, domiciliado ou com sede no exterior, das informações sobre a utilização de tais recursos[12].

  • DEREX

De acordo com art. 8º da Lei 11.371/06, a pessoa física ou jurídica residente no País que mantiver, no exterior, recursos em moeda estrangeira relativos ao recebimento de exportação, deverá declarar à Secretaria da RFB a utilização dos recursos.

Nesse sentido, a RFB publicou a Instrução Normativa 726/07, que instituiu a “Declaração sobre a Utilização dos Recursos em Moeda Estrangeira Decorrentes do Recebimento de Exportação”, conhecida como “DEREX”, cuja apresentação é obrigatória para o exportador que mantiver recursos no exterior.

A informação a ser prestada na DEREX deve ser fornecida anualmente, até o último dia útil do mês de junho, em meio digital devendo constar – obrigatoriamente – a origem e a utilização dos recursos movimentados no exterior durante o ano-calendário imediatamente anterior àquele da DEREX[13]. Note-se que as informações constantes da DEREX deverão ser segregadas, mês a mês, por país, moeda e instituição financeira, nos termos do art. 7º da IN RFB 726/07[14].

A DEREX contempla somente os recursos relativos ao recebimento de exportações não ingressados no Brasil, e os rendimentos auferidos no exterior decorrentes da utilização dos recursos mantidos fora do País.

Portanto, deverão ser discriminados na DEREX:

  1. os rendimentos auferidos no exterior decorrentes dos recursos mantidos fora do Brasil;
  2. as exportações não ingressadas no Brasil; e
  3. as aplicações financeiras, os investimentos e os pagamentos de obrigações próprias do exportador e os valores destinados à aquisição de bens ou serviços.

Importante ressaltar que a pessoa física ou jurídica que deixar de apresentar a DEREX, ou apresentá-la com incorreções ou omissões, estará sujeita a aplicação de multa de 0,5% incidente sobre o valor correspondente aos recursos mantidos ou utilizados no exterior e não informados à Receita Federal no prazo estabelecido, por cada mês ou fração, sendo tal penalidade limitada ao total de 15% do referido valor[15]. Saliente-se que a multa ora em comento será reduzida à metade, quando a informação for prestada após o prazo, mas antes de qualquer procedimento de ofício por parte da RFB; ou duplicada, inclusive quanto ao seu limite, em caso de fraude[16].

Finalmente, as pessoas físicas e jurídicas exportadoras de mercadorias e serviços que mantiverem conta bancária no exterior deverão conservar todos os documentos comprobatórios das operações realizadas no exterior, relativas à origem e à utilização dos recursos decorrentes do recebimento das exportações devendo, quando solicitadas, apresenta-las à autoridade fiscal da RFB.

  • Possibilidade de Distribuição de Dividendos entre Contas Bancárias no Exterior

Ante ao exposto nos itens A e B supra, para que a legislação brasileira (normas regulatórias e tributárias) seja devidamente observada, o montante mantido no exterior pela Sociedade, decorrente do recebimento de preço por exportação de serviços a cliente localizado no exterior, somente poderia ser utilizado para (i) a realização de investimento, (ii) aplicação financeira ou (iii) pagamento de obrigação da Sociedade.

No que tange ao pagamento de dividendos para sócio, a legislação é silente. Todavia, ao contrário do que ocorre com os empréstimos e mútuos – que são operações expressamente vedadas na legislação – o pagamento de dividendos com recursos mantidos no exterior não foi proibido.

Nesse sentido, inclusive, a Circular CMN 3.689/13, quando regulamenta o pagamento a sócio estrangeiro, menciona ser possível o pagamento de lucros e dividendos para sócio ou acionista, com a utilização de valores mantidos no exterior pela pessoa jurídica brasileira, desde que haja a indicação da destinação dos recursos para recebimento no exterior. Colacionamos abaixo os referidos dispositivos:

Art. 32. O pagamento, com recursos mantidos no exterior, de lucros e dividendos, de juros sobre o capital próprio e de retorno de capital não elide a obrigação da empresa de fazer os registros correspondentes no módulo IED do RDE, indicando, inclusive, a destinação dos recursos para recebimento no exterior.

(…)

Art. 108-E. O pagamento de lucros e dividendos ou de juros sobre o capital próprio feito com recursos mantidos no exterior não elide a obrigação do representante ou do custodiante de fazer a atualização dos registros correspondentes no módulo Portfólio do RDE. (grifamos)

Ademais, a exigência de realização de operação de câmbio simultâneo, prevista no art. 7° da Resolução CMN 3.844/10, não se aplica ao caso em questão, seja pelo fato de (i) a hipótese de pagamento de dividendos com recursos detidos no exterior para conta bancária de beneficiário no exterior não estar descrita dentre as 3 situações descritas nos incisos I, II e III do referido ato infralegal[17], bem como (ii) nos termos do art. 1º da Resolução CMN 3.568/08[18], as operações de fechamento de câmbio (simbólicas ou efetivas) somente serem aplicáveis quando envolverem (a) instituição brasileira[19] operando moeda estrangeira ou (b) fluxo de moeda nacional com um não-residente (o que não se verifica neste caso).

Um terceiro argumento a favor dessa possibilidade reside no fato de que, sob a ótica contábil, os dividendos declarados passam a ser uma obrigação que a sociedade tem perante seus sócios ou acionistas. Ou seja, a sociedade que deliberar a distribuição de dividendos, deve debitar o Patrimônio Líquido e creditar o valor de dividendos como “dividendos a pagar”, em conta de Passivo Circulante. Portanto, pode-se dizer que, nesse momento, a sociedade tem uma obrigação perante seu sócio (Pessoa Física), de realizar tal pagamento, o que se enquadraria na obrigação própria de exportadores.

Em razão dos fundamentos acima explicitados, entendemos que a legislação cambial e fiscal que permite a manutenção integral de valores em conta bancária no exterior, detida por sociedade brasileira exportadora, não veda o pagamento de dividendos em moeda estrangeira – transferidos dessa conta bancária no exterior – para sócio (residente no Brasil) da referida Sociedade, que também possui conta bancária de sua titularidade no exterior.

Todavia, não se pode descartar a possibilidade de a RFB[20] discordar desse entendimento, o que poderia ensejar a aplicação das multas aqui mencionadas. Cumpre mencionar, contudo, que no caso da imposição das multas ora descritas, entendemos ser cabível defesa administrativa e judicial, o que poderia reduzir e até mitigar o montante das penalidades, a depender do caso.

Pragmaticamente, julgamos que algumas recomendações relativas à situação aqui examinada são importantes. Primeiramente, a ata de reunião de sócios que determina a distribuição de dividendos deve ter seus valores expressos em Reais (curso forçado de moeda nacional para atos jurídicos de sociedade brasileira[21]). A Sociedade poderá informar o valor total a ser distribuído em Dólares, mas, concomitantemente, deve mencionar o equivalente em Reais, com base na taxa de câmbio do dia anterior ou do dia da deliberação (preferencialmente). Ademais, para mitigar os efeitos de potencial variação cambial, recomendamos que a Sociedade realize a transferência (ordem de pagamento junto ao banco estrangeiro que irá cursar a transferência entre as contas no exterior) do montante no mesmo dia em que seja assinada a ata de reunião de sócios com a referida deliberação de distribuição de dividendos à Pessoa Física.

Ressaltamos, por fim, que, na eventualidade da operação de distribuição de dividendos não ser corretamente caracterizada (i. e., suporte documental idôneo e suficiente), existe o risco da RFB questionar essa transferência de valores detidos no exterior e, consequentemente, exigir o Imposto de Renda Retido na Fonte (“IRRF”) à alíquota de 27.5%, sob a rubrica de “pagamento de pró-labore” à pessoa física, além de multa (75%, salvo caracterização de fraude ou simulação) e juros (taxa SELIC).

III.          Impactos Fiscais da Operação no Brasil

  1. Para a Sociedade

O impacto fiscal na prestação de serviços de consultoria empresarial para cliente localizado no exterior será o de uma exportação de serviços, a seguir descrito individualmente por tributos.

A) IRPJ e CSLL

Partindo da premissa de que a Sociedade é optante pelo regime de Lucro Presumido e está sujeita a tal regime para o ano de exercício 2015, na qualidade de sociedade prestadora de serviços a alíquota efetiva de IRPJ e CSLL será a de 10,88% sobre o faturamento, que corresponde à alíquota de 34% (sendo 25% de IRPJ e 9% de CSLL) sobre o percentual de 32% da receita bruta[22], conforme previsto na legislação brasileira[23], inclusive para os casos de exportação de serviços.

Nesse sentido, os arts. 518 e 519 do RIR/99 assim dispõem:

Art. 518.  A base de cálculo do imposto e do adicional (541 e 542), em cada trimestre, será determinada mediante a aplicação do percentual de oito por cento sobre a receita bruta auferida no período de apuração, observado o que dispõe o § 7o do art. 240 e demais disposições deste Subtítulo.

Art. 519.  Para efeitos do disposto no artigo anterior, considera-se receita bruta a definida no art. 224 e seu parágrafo único.

§ 1º  Nas seguintes atividades, o percentual de que trata este artigo será de:

I – um inteiro e seis décimos por cento, para atividade de revenda, para consumo, de combustível derivado de petróleo, álcool etílico carburante e gás natural;

II – dezesseis por cento para a atividade de prestação de serviço de transporte, exceto o de carga, para o qual se aplicará o percentual previsto no caput;

III – trinta e dois por cento, para as atividades de:

a) prestação de serviços em geral, exceto a de serviços hospitalares;

b) intermediação de negócios;

c) administração, locação ou cessão de bens, imóveis, móveis e direitos de qualquer natureza.

Portanto, resta claro que os serviços de consultoria empresarial financeira (descritos no item 17.20 – “Consultoria e assessoria econômica ou financeira” da LC 116/03) enquadram-se na categoria de “prestação de serviços em geral” descrita no art. 519, parágrafo 1º, III, “a” do RIR/99, cuja base de cálculo para fins do IRPJ e CSLL é representada por 32% de sua receita bruta.

B) PIS e COFINS

As pessoas jurídicas optantes pelo regime de Lucro Presumido (para fins de IRPJ e CSLL), como regra geral, estão sujeitas ao regime cumulativo para fins de apuração das contribuições ao PIS e a COFINS, sob a alíquota de 0,65% e 3%, respectivamente, totalizando 3.65% a referida carga tributária de PIS/COFINS sob a receita bruta auferida por tais prestadores de serviços[24].

Todavia, a Constituição Federal (“CF”) estabelece que as receitas decorrentes da exportação (seja de mercadorias ou serviços) estão imunes das contribuições ao PIS e à COFINS, conforme se observa do art. 149, § 2º, I, da CF:

“Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

(…)

§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo:

I – não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação”. (marcamos)

Ademais, a referida não-incidência constitucional foi prevista, também, pela legislação federal, notadamente no art. 14, III e parágrafo único da Medida Provisória 2.158-35/01, para as pessoas jurídicas sujeitas à sistemática cumulativa de apuração do PIS e da COFINS, conforme abaixo:

Art. 14. Em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de fevereiro de 1999, são isentas da COFINS as receitas:

(…)

III – dos serviços prestados a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas

(…)

§ 1º. São isentas da contribuição para o PIS/PASEP as receitas referidas nos incisos I a IX do caput. (marcamos)

Para as pessoas jurídicas sujeitas ao regime não-cumulativo, tal previsão também existe, notadamente no art. 5º da Lei nº 10.637/02 e art. 6º, II da Lei nº 10.833/03, que expressamente mencionam que a contribuição ao PIS e à COFINS não incidem sobre as receitas decorrentes de exportação de serviços para o exterior, desde que haja o ingresso de divisas para o território brasileiro. Observe-se, respectivamente, tais dispositivos abaixo:

Art. 5º. A contribuição para o PIS/Pasep não incidirá sobre as receitas decorrentes das operações de: 

(…)

II – prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas;

(…)

Art. 6º. A COFINS não incidirá sobre as receitas decorrentes das operações de:

(…)

II – prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas;

Nesse sentido, como regra geral, para fazer jus à imunidade e à não-incidência legalmente prevista tanto para o PIS como para a COFINS (tanto na sistemática cumulativa como para a sistemática não-cumulativa), exige-se o requisito de que tais exportações de serviços impliquem em ingresso de divisas no país. Para tanto, faz-se necessário o cumprimento das normas cambiais junto ao BACEN, notadamente com o fechamento de câmbio, ainda que simbólico, para representar ingresso de divida no país, conforme se observa da decisão da RFB abaixo colacionada:

Processo de Consulta nº 128/08

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. EXPORTAÇÃO. NÃO INCIDÊNCIA.

Não incide a Cofins sobre as receitas decorrentes de prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas, desde que atendidos os demais requisitos normativos e legais aplicáveis, em especial o contido na seção 2 do capítulo 9 do Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais (RMCCI);

Ainda, é indispensável a comprovação do nexo causal entre o pagamento recebido pela pessoa jurídica domiciliada no País e a efetiva prestação dos serviços a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior.

(…)

Não incide a Contribuição para o PIS/Pasep sobre as receitas decorrentes de prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, cujo pagamento represente ingresso de divisas, desde que atendidos os demais requisitos normativos e legais aplicáveis, em especial o contido na seção 2 do capítulo 9 do Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais (RMCCI); Ainda, é indispensável a comprovação do nexo causal entre o pagamento recebido pela pessoa jurídica domiciliada no País e a efetiva prestação dos serviços a pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior[25].

Todavia, a Lei nº 11.371/06, em seu art. 10[26], excepcionou este requisito de ingresso de divisas para fins da aplicação da não-incidência do PIS e da COFINS sobre as receitas decorrentes da exportação de mercadorias e serviços, na hipótese de a pessoa jurídica manter os recursos no exterior na forma prevista no art. 1º da Lei nº 11.371/06. No mesmo sentido, a IN RFB 726/07 – em seu art. 4º – reitera a não-tributação das receitas decorrentes de exportação, ainda que mantidas no exterior (i.e., independentemente do ingresso de divisas para o país). Veja-se:

“Art. 4º. Sobre as receitas mantidas no exterior na forma prevista no art. 1º, decorrentes da prestação de serviços para pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior, não incidem a Contribuição para o PIS/Pasep e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins)”.

Portanto, os valores recebidos como contraprestação do serviço exportado pela Sociedade para o cliente no exterior não devem ser tributados pelo PIS/COFINS, ainda que mantidos no exterior, desde que sejam cumpridos todos os termos e condições estabelecidos pela Lei nº 11.371/06, notadamente, a declaração do referido evento na DEREX sob a natureza de “pagamento de obrigação”.

                C) ISS

Com relação ao ISS, ressalte-se que a Lei Complementar nº 116/03, determina que a exportação de serviços é isenta da incidência de ISS, exceto nos casos em que o serviço for prestado no Brasil e seu resultado seja reconhecido no Brasil, ainda que o pagamento seja realizado no exterior. Assim, entende-se que o ISS não incidirá nas hipóteses em que o serviço for prestado no exterior e seu resultado reconhecido no exterior e; no caso em que o serviço for prestado no Brasil e reconhecido no exterior. É o que dispõe o art. 2º, parágrafo único da referida LC 116/03, a seguir transcrito:

Art. 2º.  O imposto não incide sobre:

I – as exportações de serviços para o exterior do País;

II – a prestação de serviços em relação de emprego, dos trabalhadores avulsos, dos diretores e membros de conselho consultivo ou de conselho fiscal de sociedades e fundações, bem como dos sócios-gerentes e dos gerentes-delegados;

III – o valor intermediado no mercado de títulos e valores mobiliários, o valor dos depósitos bancários, o principal, juros e acréscimos moratórios relativos a operações de crédito realizadas por instituições financeiras.

Parágrafo único. Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior.

Neste tocante, é imperioso atentar-se para a definição do significado de resultado do serviço, conceito ainda debatido na doutrina e sem definição unanime na jurisprudência. Uma parte da doutrina brasileira entende como “resultado do serviço” o benefício ou a utilidade que decorrerá da prestação do mesmo. Já nos manifestamos no sentido de que[27] quando o serviço apresenta a caracterização tripartite de “utilidade/benefício/usufruto” no exterior, quando prestado por um residente no Brasil, estará configurada, necessariamente, uma exportação de serviço, sem qualquer necessidade de que o serviço seja “prestado” no exterior pelo prestador nacional.

No que tange à doutrina nacional, RONCAGLIA aduz:

(…) em nossa opinião, a palavra “resultado”, constante do parágrafo único do art. 2 da LC 116, deve ser compreendida com o bem material ou imaterial elaborado a partir de serviços, que deve ser fruído no exterior do País.”[28]

Neste sentido, a doutrina assevera que o legislador complementar brasileiro adotou o regime do destino para tributar as exportações, isto é, somente deve incidir ISS no caso de o destino dos serviços prestados (“resultado”) serem verificados nos limites territoriais do Município brasileiro. É o que aponta SCHOUERI:

“Assim, ainda que o serviço se desenvolva no País, não fica descaracterizada a exportação, desde que seu resultado se verifique no exterior.”[29]

Ainda, em consonância com os autores acima, ÁVILA entende que:

(…) quando a Lei Complementar n. 116/2003 estabelece que não se enquadram, na isenção, os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, está, em outras palavras, prescrevendo que não haverá isenção quando a utilidade criada por meio do esforço humano se verificar no território brasileiro. Reversamente, porém, a referida lei está determinando que haverá isenção quando a utilidade criada por meio de esforço humano se verifica no exterior.”[30]

Na jurisprudência, importante mencionar a existência de decisão do STJ sobre o tema, em que restou interpretada a definição de “resultado” para fins da isenção do ISS, no precedente abaixo colacionado:

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISSQN. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. SERVIÇO DE REFÍTICA. REPARO E REVISÃO DE MOTORES E DE TURBINAS DE AERONAVES CONTRATADO POR EMPRESA DO EXTERIOR. EXPORTAÇÃO DE SERVIÇOS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. SERVIÇO EXECUTADO DENTRO DO TERRITÓRIO NACIONAL. APLICAÇÃO DO ART. 2, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LLC 116/03. OFENSA AO ART. 535 DO CPC REPELIDA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. SÚMULA 282/STF E 211/STJ.

(…)

2. Nos termos do art. 2, inciso I, parágrafo único, da LC 116/03, o ISSQN não incide sobre exportações de serviços, sendo tributáveis aqueles desenvolvidos dentro do território nacional sendo tributáveis aqueles desenvolvidos dentro do território nacional cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior. In casu, a recorrente é contratada por empresas do exterior e recebe motores e turbinas para reparos, retifica e revisão. Inicia, desenvolve e conclui a prestação do serviço dentro do território nacional, exatamente em Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro, e somente depois de testados, envia-os de volta aos cliente, que procedem à sua instalação nas aeronaves.

(…)

6. Na acepção semântica, “resultado” é consequência, efeito, seguimento. Assim, para que haja efetiva exportação do serviço desenvolvido no Brasil, ele não poderá aqui ter consequências ou produzir efeitos. A contrário senso, os efeitos decorrentes dos serviços exportados devem-se produzir em qualquer outro País. É necessário, pois, ter-se em mente os verdadeiros resultados do serviço prestado, os objetivos da contratação e da prestação.

(grifamos).

Ademais, na esfera administrativa, o Município de São Paulo possui decisão favorável ao contribuinte[31], no caso abaixo:

SOLUÇÃO DE CONSULTA SF/DEJUG Nº 25, DE 16 DE JULHO DE 2008

DEPARTAMENTO DE TRIBUTAÇÃO E JULGAMENTO – DEJUG

PROCESSO Nº 2008-0.117.750-9 – INTERESSADO: SCHRODER INVESTMENT MANAGEMENT BRASIL DTVM S/A – CCM Nº 3.105.353-0

(…)

12. Os serviços previstos no contrato firmado a Schroder Investment Management Limited, Londres encontram-se definidos no subitem 17.19 da Lista de Serviços da Lei nº 13.701/2003, relativos à consultoria e assessoria econômica ou financeira, código de serviço 03654 do Anexo I da Portaria SF nº 14/2004.

12. 1. O resultado dos serviços de consultoria e assessoria econômica ou financeira é o fornecimento de dados e interpretação destes dados sobre empresas ou mesmo setores da economia brasileira. A decisão de investir no Brasil por parte da matriz inglesa ou de seus clientes estrangeiros não está vinculada exclusivamente à prestação dos serviços de consultoria e assessoria econômica e financeira prestados pela consulente.

12.2. Neste caso está caracterizada a exportação dos serviços e a não incidência do ISS em relação aos serviços de consultoria prestados pela consulente a Schroder Investment Management Limited, Londres.

(…)

15. Conclui-se que:

15.1. Ocorre exportação de serviços em relação aos serviços de consultoria prestados pela consulente em razão do contrato firmado com a Schroder Investment Management Limited, Londres e conseqüentemente não ocorre a incidência de ISS sobre os serviços objeto deste contrato. (marcamos)

No caso ora sob exame, não temos informação sobre onde será utilizado ou trará benefício o serviço de consultoria empresarial prestado pela Sociedade ao cliente sediado no exterior. Caso tal serviço gere utilidade ou benefício no exterior, entendemos que existem argumentos jurídicos para sustentar a isenção do ISS sobre essa exportação de serviços, com base na doutrina e jurisprudência existente. Por outro lado, se os serviços trouxerem utilidade ou benefício econômico no território brasileiro ao cliente (ainda que este se localize no exterior), a isenção do ISS prevista no art. 2º, parágrafo único da LC 116/03, não seria aplicável e, portanto, incidiria o ISS sobre tal prestação de serviços.

No caso de o resultado do serviço se verificar no território paulistano, a alíquota do ISS incidirá a 5% sobre o preço do serviço, nos termos do Art. 1º, item 17.19 (“Consultoria e assessoria econômica ou financeira”), combinado com art. 18, III do Decreto SP nº 53.151/2012 (RISS/SP).

Vale lembrar, por fim, que o CMT-SP possui entendimento majoritário de que, para o contribuinte fazer jus à isenção do ISS no caso de exportação de serviço, ele deverá comprovar, por documentação idônea, que o serviço fora efetivamente prestado fora dos limites territoriais municipais, o que dificulta a aplicação da isenção de ISS para as exportações de serviços por prestadores paulistanos, sobretudo na esfera administrativa.

                D) IOF

Note-se que não haverá incidência de IOF (em qualquer de suas modalidades e, mais especificamente, na modalidade câmbio), uma vez que não há fechamento de câmbio para ingresso de moeda no Brasil representativa do preço do serviço (visto que o preço será pago em conta bancária detida pela Sociedade no exterior), tampouco saída (efetiva ou simbólica) de recursos do Brasil para o exterior, razão pela qual não haveria fato gerador do referido imposto federal[32].

Ademais, o eventual IOF-Câmbio a ser exigido pela RFB seria de zero, visto que, nos termos do art. 15-B, I, do RIOF, a alíquota aplicável para exportação de serviços é de 0%. Desta forma, não seria devido IOF-Câmbio sobre o preço da exportação de serviços, independentemente de cobertura cambial sobre tais montantes.

  • Para a Pessoa Física

A transferência do montante em moeda estrangeira, detido no exterior, da Sociedade para a Pessoa Física corresponderá a uma distribuição de dividendos ao sócio da pessoa jurídica. De acordo com a legislação brasileira, os dividendos estão isentos de tributação no Brasil, seja no que tange o IRRF quando de sua distribuição, seja com relação ao Imposto de Renda da Pessoa Física (“IRPF”) quando de seu recebimento por parte do sócio da pessoa jurídica que os distribuiu. É o que dispõe o art. 10 da Lei 9.249/95, in verbis:

“Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior”. (grifamos)

Convém notar que a Pessoa Física deverá declarar o montante de rendimentos recebidos como distribuição de dividendos em sua Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física (“DIPF”), no campo “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis”, a ser apresentada eletronicamente à RFB até o último dia de abril do ano posterior ao ano de exercício.

No que se refere ao IOF-Câmbio, note-se que não haverá incidência do referido tributo federal, uma vez que não haverá fechamento de câmbio para ingresso/saída de moeda estrangeira/nacional no Brasil, conforme já explicado no item acima.

Ademais, vale ressaltar que, em caso de eventual questionamento por parte das autoridades fiscais (RFB), alegando a necessidade de operação de fechamento de câmbio simbólico nesta transação – o que, conforme mencionamos, entendemos não ser o caso – na saída simbólica de recursos (transferência de conta nacional da Pessoa Física para conta no exterior da mesma Pessoa Física), o argumento da RFB fundamentar-se-ia no argumento de que o IOF-Câmbio seria devido à alíquota de 0.38%, nos termos do art. 15-B, caput, do Decreto 6.306/2007, a título de “disponibilidade no exterior”[33], conforme infra colacionado:

“Art. 15-B. A alíquota do IOF fica reduzida para trinta e oito centésimos por cento, observadas as seguintes exceções:” (marcamos).

Todavia, entendemos que não se trata, propriamente, de uma operação de transferência de conta bancária no Brasil, como disponibilidade no exterior, para conta bancária no exterior da Pessoa Física, visto que os valores serão recebidos direta e originalmente na conta bancária no exterior desta, sem transitar financeiramente pela conta bancária brasileira. Por conseguinte, quer nos parecer que a exigência do IOF-Câmbio a 0.38% somente poderia ser exigida sob o argumento da ocorrência de um câmbio simbólico de saída (do Brasil para o exterior) dos valores relativos aos dividendos a serem recebidos pela Pessoa Física, e mantidos na conta bancária da mesma no exterior.

Contudo, conforme mencionado no Item II, C, deste estudo, entendemos que as transações ora sob exame não se enquadram nas condições e requisitos sujeitos a realização de operação de cambio simbólico previstos na legislação, isto é, a operação aqui mencionada não está prevista no escopo de aplicação da Resolução CMN 3.844/10 (art. 7º) e da Resolução CMN 3.568/08 (art. 1º), que tratam do regramento do câmbio simbólico. Não obstante nosso posicionamento, a RFB pode discordar do presente entendimento e, assim, questionar o não recolhimento do IOF-Câmbio nas operações de câmbio simbólico a 0.38% na saída dos recursos auferidos pela Pessoa Física do Brasil para o exterior[34].

Em suma, sob nossa ótica, não há que se falar em exigência de IRRF, IRPF ou IOF-Câmbio sobre o montante de dividendos a ser recebido pela Pessoa Física, quando do pagamento em moeda estrangeira, mantida em conta bancária no exterior, por meio de transferência para a conta bancária da Pessoa Física, sócia da Sociedade, e residente para fins fiscais exclusivamente no Brasil (conforme situação fática que nos foi descrita). Caso potencial autuação federal ocorra sob os fundamentos supra elencados, entendemos que existem argumentos jurídicos válidos para questionar tal posicionamento fazendário, em favor do contribuinte.

  1. Conclusões

Considerando o exposto acima, pode-se concluir que o pagamento de dividendos de conta bancária no exterior, detida pela Sociedade, para a conta bancária no exterior, detida pela Pessoa Física, esta última sua sócia, sem o ingresso financeiro ou repatriação cambial (efetiva ou simbólica) de tais valores ao Brasil, não é proibido pela legislação atualmente em vigor, visto que:

  1. Não há proibição expressa da operação de distribuição de dividendos a sócio/acionista sem cobertura cambial na Lei 11.371/06; sendo expressamente vedada apenas a operação de empréstimos e mútuos no exterior sem cobertura cambial;
  2. A exigência de realização de operação de câmbio simbólico não se aplica ao caso de pagamento de dividendos, não havendo, portanto, obrigatoriedade de fechamento de câmbio para realizar a distribuição de dividendos no exterior na forma aqui descrita (permitindo, a contrario sensu, a distribuição de dividendos sem cobertura cambial); e
  3. Os dividendos devidamente declarados passam a ser, jurídica e contabilmente, uma obrigação que a Sociedade tem perante seus sócios ou acionistas (Pessoa Física) e, portanto, restariam enquadrados na hipótese expressamente autorizada pelo art. 1º, parágrafo 2º da Lei 11.371/06; e
  4.  Não encontramos qualquer decisão administrativa ou judicial, tampouco qualquer outra manifestação oficial da RFB ou do BACEN (tais como “Perguntas & Respostas”; etc.) que vedasse a operação ora em comento.

Ressalte-se que a pessoa jurídica que mantiver recursos no exterior, anualmente, deverá declarar à Secretaria da RFB a utilização dos recursos (através da DEREX). Além disso, a pessoa jurídica fica obrigada a manter escrituração contábil, nos termos da legislação comercial, para evidenciar os saldos e respectivas movimentações, independentemente do regime de apuração do imposto de renda adotado.

Com relação aos impactos fiscais da transação sob análise, constatamos que, como regra geral, a Sociedade estaria sujeita a uma alíquota efetiva de imposto de renda e contribuição social de 10,88% sobre a receita bruta decorrente da prestação dos serviços de consultoria empresarial; não havendo incidência de PIS/COFINS sobre as receitas decorrentes da exportação de serviços para o cliente localizado no exterior, tampouco IOF-Câmbio em razão da ausência de fechamento de câmbio para ingresso (efetivo ou simbólico) de recursos em moeda nacional brasileira. Para a Sociedade, não haveria IOF-Câmbio de qualquer forma, em razão da expressa previsão de alíquota zero (Art. 15-B, I, do RIOF[35]) para os casos de fechamento de câmbio (inclusive simbólico) que represente ingresso de receita decorrente da exportação de serviços. Caso a RFB entenda ser exigido o fechamento de câmbio de tais recursos a título de saída simbólica da a conta bancária brasileira para a conta bancária no exterior da Pessoa Física (como transferência a título de “disponibilidade no exterior”), implicando em potencial autuação fiscal por parte da RFB, a alíquota aplicável de IOF-Câmbio seria 0.38%[36] na saída simbólica dos recursos para o exterior. Todavia, entendemos existirem argumentos jurídicos válidos em favor do contribuinte, de forma a questionar potencial autuação fiscal, se for o caso.

No que tange à incidência do ISS, sua incidência dependerá da verificação do resultado do serviço prestado (i.e., benefício econômico ou utilidade do serviço): se o resultado for verificado no Brasil, haverá a incidência do ISS à alíquota de 5%[37]; já se o resultado for verificado no exterior, não será devido ISS no caso, por força da isenção prevista no art. 2º, parágrafo único, da LC 116/03. Em razão da ausência de informações e documentação suficientes para a conclusão sobre o local em que o resultado do serviço será verificado no caso em comento, não podemos concluir se o ISS efetivamente incidirá no presente caso.

Por fim, no que se refere à tributação da Pessoa Física, sócia da Sociedade, não haverá qualquer tributação no caso em questão. Isso porque os dividendos a serem recebidos pela Pessoa Física estão isentos do IRRF e do IRPF, bem como sujeitos à alíquota zero para fins de IOF-câmbio (se e quando efetivamente recebidos em conta bancária brasileira). Contudo, a Pessoa Física deverá declarar o montante recebido como dividendos pagos pela Sociedade em sua DIPF, no ano-calendário seguinte àquele do recebimento, no campo “rendimentos isentos e não tributáveis”, bem como declarar os capitais detidos no exterior para fins de BACEN (Capitais brasileiros no Exterior – “CBE”), a depender do montante total detido pela Pessoa Física[38].

Publicado originalmente na Revista Tributária e de Finanças Públicas. , v.127, p.187 – 209, 2016.


[1] Cumpre ressaltar que é importante que o faturamento anual da Sociedade não pode ultrapassar os R$ 78 milhões de receita bruta anual, para que se a Sociedade faça jus no ano corrente e nos anos seguintes ao regime do Lucro Presumido, previsto na legislação vigente como um dos requisitos para a exigibilidade de tal regime de tributação (cf. art. 13 da Lei 9.718/98 e art. 516 e seguintes do Decreto 3.000/199 – “RIR/99”).

[2] “Art. 1o. Os recursos, em moeda estrangeira, relativos aos recebimentos de exportações brasileiras de mercadorias e de serviços para o exterior, realizadas por pessoas físicas ou jurídicas, poderão ser mantidos em instituição financeira no exterior, observados os limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional”.

[3] Operações com cobertura cambial são aquelas operações internacionais em que ocorre o pagamento proveniente do exterior devido à remessa da mercadoria e/ou prestação de serviços. Já as operações sem cobertura cambial, são aquelas operações internacionais em que não há remessa de divisas do exterior para pagamento (conforme: http://www.mdic.gov.br/sistemas_web/aprendex/default/index/popup/id/335).

[4] “Art. 1º São consideradas operações de câmbio ilegítimas as realizadas entre bancos, pessoas naturais ou jurídicas, domiciliadas ou estabelecidas no país, com quaisquer entidades do exterior, quando tais operações não transitem pelos bancos habilitados a operar em câmbio, mediante prévia autorização da fiscalização bancária a cargo do Banco do Brasil”.

[5] “Art. 1º Os exportadores brasileiros de mercadorias e serviços podem manter no exterior a integralidade dos recursos relativos ao recebimento de suas exportações”.

[6] “Art. 2º O exportador de mercadorias ou de serviços pode manter, no exterior, a integralidade dos recursos relativos ao recebimento de suas exportações”.

[7] “Art. 16-A. No recebimento da receita de exportação de mercadorias ou de serviços, deve ser observado que:

I – o exportador de mercadorias ou de serviços pode manter no exterior a integralidade dos recursos relativos ao recebimento de suas exportações;”

[8] A Instrução Normativa RFB 726/2007, em seu art. 1º caput e parágrafo 1º traz os mesmos dispositivos.

[9] O art. 7º da referida lei estabelece as multas de natureza regulatória, notadamente as infrações às normas que regulam os registros, no Banco Central do Brasil, de capital estrangeiro em moeda nacional, que estão sujeitas à multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais), como regra geral.

[10] “Art.9º. A inobservância do disposto nos arts. 1º e 8º desta Lei acarretará a aplicação das seguintes multas de natureza fiscal:

I – 10% (dez por cento) incidentes sobre o valor dos recursos mantidos ou utilizados no exterior em desacordo com o disposto no art. 1o desta Lei, sem prejuízo da cobrança dos tributos devidos;

II – 0,5% (cinco décimos por cento) ao mês-calendário ou fração incidente sobre o valor correspondente aos recursos mantidos ou utilizados no exterior e não informados à Secretaria da Receita Federal, no prazo por ela estabelecido, limitada a 15% (quinze por cento).

§ 1º. As multas de que trata o caput deste artigo serão:

I – aplicadas autonomamente a cada uma das infrações, ainda que caracterizada a ocorrência de eventual concurso;

II – na hipótese de que trata o inciso II do caput deste artigo:

a) reduzidas à metade, quando a informação for prestada após o prazo, mas antes de qualquer procedimento de ofício;

b) duplicada, inclusive quanto ao seu limite, em caso de fraude”.

[11] Art. 1º, parágrafo 2º, da IN RFB 726/2007.

[12] Art. 1º, parágrafo 3º, da IN RFB 726/2007.

[13] Nos termos do art. 8º da IN RFB 726/2007, a apresentação por meio digital se dará mediante a utilização de aplicativo a ser disponibilizado na página da SRF na Internet, no endereço eletrônico: http://www.receita.fazenda.gov.br sendo obrigatória a assinatura digital mediante utilização de certificado digital válido.

[14] O parágrafo único do referido art. 7º dispõe, ainda, que os dados referentes à instituição financeira compreenderão a identificação das contas bancárias e os respectivos procuradores, representantes ou agentes no exterior, responsáveis pela sua movimentação.

[15] Art. 9º da IN RFB 726/2007.

[16] Cumpre notar que, além da multa de natureza fiscal (que varia de 0,5% a 15% dos valores mantidos no exterior), poderá ser exigida a multa de natureza regulatória/cambial de 10% do valor dos recursos, nos termos do art. 3º da IN RFB 726/2007, sem prejuízo – ainda – da cobrança de eventuais tributos não recolhidos, se for o caso.

[17] “Art. 7º. Para os fins do registro de que trata esta Resolução, sujeitam-se a realização de operações simultâneas de câmbio ou de transferências internacionais em reais, sem entrega efetiva dos recursos e independentemente de previa autorização do Banco Central do Brasil:

I – a conversão de haveres de não residentes no Pais em modalidade de capital estrangeiro registrável no Banco Central do Brasil: e

II – a transferência entre modalidades de capital estrangeiro registrado no Banco Central do Brasil.

III – a renovação, a repactuação e a assunção de obrigação de operação de empréstimo externo, sujeito a registro no Banco Central do Brasil, contratado de forma direta ou mediante emissão de títulos no mercado internacional” (Destaques nossos). Nota-se que a distribuição de dividendos por pessoa jurídica brasileira a sócio residente no Brasil não se enquadra em nenhuma das hipóteses descritas no artigo 7º citado, visto que o inciso I exige a participação de um não-residente (a pessoa jurídica e o sócio são residentes no Brasil no caso ora sob análise); o inciso II exige capital estrangeiro (no caso em questão o capital é nacional); e o inciso III exige empréstimo externo (inexistente nesse caso).

[18] “Art. 1º. O mercado de câmbio brasileiro compreende as operações de compra e de venda de moeda estrangeira e as operações com ouro-instrumento cambial, realizadas com instituições autorizadas pelo Banco Central do Brasil a operar no mercado de câmbio, bem como as operações em moeda nacional entre residentes, domiciliados ou com sede no País e residentes, domiciliados ou com sede no exterior.” (marcamos).

[19] Incluem-se neste escopo (cf. art. 3º da Resolução CMN 3.844/2010): bancos, bancos de desenvolvimento e sociedades de crédito, financiamento e investimento; sociedades corretoras de títulos e valores mobiliários, sociedades distribuidoras de títulos e valores mobiliários e sociedades corretoras de câmbio; e agências de turismo.

[20] Conforme aqui explicitado, entendemos que o Banco Central do Brasil (BACEN) não tem competência sobre a operação aqui em comento – visto que não se trata de operação internacional (i.e., envolvendo não-residente tampouco capital estrangeiro – razão pela qual não poderia aplicar a penalidade de natureza cambial neste caso.

[21] Art. 1º da Lei 9.069/1995.

[22] Note-se que a base de cálculo do IRPJ e CSLL das empresas tributadas pelo lucro presumido, em cada trimestre, será determinada mediante a aplicação de percentuais fixados no art. 15 da Lei 9.249/1995 de acordo com a atividade desenvolvida pela pessoa jurídica, sobre a receita bruta auferida no trimestre, sendo o resultado acrescido de outras receitas, rendimentos e ganhos de capital, na forma do art. 25 da Lei nº 9.430/1996.

[23] Lei nº 9.249/1995, art. 15, parágrafo 1º, III, “a” e também Art. 519, III, “a” do RIR/99.

[24] Lei nº 10.833/03, art. 10, II e Lei nº 10.637/02, art. 8, II.

[25] Superintendência Regional da Receita Federal – SRRF / 9a. Região Fiscal. Publicado em 04.06.2008.

[26] “Art. 10. Na hipótese de a pessoa jurídica manter os recursos no exterior na forma prevista no art. 1º desta Lei, independe do efetivo ingresso de divisas a aplicação das normas de que tratam o § 1o  e o inciso III do caput do art. 14 da Medida Provisória no 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, o inciso II do caput do art. 5o da Lei no 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o inciso II do caput do art. 6o da Lei no 10.833, de 29 de dezembro de 2003”.

[27] CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. “Exportação de serviços de assessoria de investimentos financeiros e a regra de isenção do imposto sobre serviços: a questão da ausência de resultado verificado no Brasil”. Revista de Direito Tributário da APET, vol. 29, pp. 93-108, São Paulo: 2011.

[28] RONCAGLIA. Marcelo Marques. O ISS e a Importação de Serviços. Revista Dialética de Direito Tributário n. 129, p.110.

[29] SCHOUERI, Luis Eduardo. “ISS sobre a importação de serviços do exterior”. Revista Dialética de Direito Tributário n. 100, p. 45.

[30] ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a prestação de serviços de qualquer natureza. Exportação de serviços. Lei Complementar n. 116/2003. Isenção: requisitos e alcance. Conceitos de “desenvolvimento” de serviços e “verificação” do seu resultado”.  Revista Dialética de Direito Tributário n. 134, p. 105.

[31] Vide também decisão proferida pelo CMT-SP no Processo Administrativo nº: 2012-0.095.232-0, 1ª Câmara Julgadora Efetiva, Conselheiro Relator: Marcelo Guaritá Borges Bento.

[32] De acordo com o Decreto 6.306/2007 (“RIOF”) tem-se:

Art. 11. O fato gerador do IOF é a entrega de moeda nacional ou estrangeira, ou de documento que a represente, ou sua colocação à disposição do interessado, em montante equivalente à moeda estrangeira ou nacional entregue ou posta à disposição por este.

Parágrafo único. Ocorre o fato gerador e torna-se devido o IOF no ato da liquidação da operação de câmbio”.

[33] De acordo com a Circular nº 3.575, de 02.02.2012 (Atualização RMCCI n° 48), a “disponibilidade no exterior” é a “manutenção por pessoa física ou jurídica, residente, domiciliada ou com sede no País, de recursos em conta mantida em seu próprio nome em instituição financeira no exterior”.

[34] Isto porque, nesse cenário, os valores teriam sido objeto de câmbio simbólico de ingresso do exterior para a conta bancária no Brasil da Sociedade, operação essa que está sujeita a alíquota zero do IOF-Câmbio nos termos do art. 15-B, I, do RIOF (exportação de serviços). Mantidos simbolicamente no Brasil, tais valores deveriam ter sido distribuídos para a conta bancária no Brasil detida pela Pessoa Física – operação essa não sujeita ao IOF-Câmbio, por óbvio – para, posteriormente, serem objeto da transferência como “disponibilidade no exterior” da conta bancária no Brasil da Pessoa Física para sua conta bancária no exterior (caso em que potencialmente a RFB poderia entender, equivocadamente, a nosso ver, ser devido o IOF-Câmbio a 0.38%).

[35] Art. 15-B. A alíquota do IOF fica reduzida para trinta e oito centésimos por cento, observadas as seguintes exceções:

I – nas operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de bens e serviços: zero;”

[36]Art. 15-B, caput, do RIOF.

[37] Art. 1º, item 17.19 (“Consultoria e assessoria econômica ou financeira”), combinado com art. 18, III do Decreto SP nº 53.151/2012 (RISS/SP).

[38] A declaração de CBE é obrigatória para residentes no País detentores de ativos (participação no capital de empresas, títulos de renda fixa, ações, depósitos, imóveis, dentre outros) contra não residentes que totalizem montante igual ou superior ao equivalente a US$100.000,00 (cem mil dólares dos Estados Unidos) no último dia de cada ano (Cf. Circular BCB n° 3.624 de 2013 e Resolução CMN n° 3.854 de 2010).