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Conceito de Beneficiário Efetivo nos Acordos Internacionais contra a Bitributação

I. Origem e objetivo do termo “beneficiário efetivo”

A origem do termo “beneficiário efetivo”[1] decorre do termo em inglês “beneficial owner”, existente na lei doméstica dos países que adotam o sistema jurídico de common law, principalmente o Reino Unido , onde esse termo surgiu pela primeira vez, no contexto da trust law[2] para diferenciar o conceito de legal ownership – que se referia basicamente aos atributos formais da propriedade do trustee – do beneficial ownership – detido pelos verdadeiros beneficiários, que podiam exercer seu direito em relação à propriedade perante terceiros[3].

Em âmbito internacional, o termo (ou requisito) “beneficiário efetivo” foi originalmente introduzido, e pela primeira vez utilizado, na CM-OCDE de 1977[4]. De acordo com os Comentários[5], este termo foi incluído no parágrafo 2 do Artigo 10 (Dividendos), parágrafo 2 do Artigo 11 (Juros) e parágrafo 1º do Artigo 12 (Royalties) para esclarecer o significado da expressão “pagos a um residente” (“paid to a residente”) utilizada nesses artigos da CM daquele ano tratando-se, portanto, de regra relacionada a atribuição da renda.

Contudo, RUSSO[6] salienta que o termo “beneficial owner” já tinha sido utilizado em acordos internacionais tributários antes de sua inserção na Convenção Modelo OCDE de 1977. Em meados dos anos 1940 o primeiro uso dessa expressão no contexto internacional tributário, no acordo internacional sobre heranças celebrado entre EUA e Reino Unido datado de 1945[7] em referência a “ações ou quotas detidas por um mandatário em que o beneficiário efetivo é evidenciado por certificados ou de outra forma”. Também, em 1966, essa expressão foi utilizada no Protocolo referente ao acordo contra a bitributação celebrado entre EUA e Reino Unido[8].

Adotando entendimento distinto sobre a utilização desse termo nos acordos contra a tributação, AULT sustenta que o conceito de beneficiário efetivo surgiu, de fato, no contexto do combate à elisão fiscal (tax avoidance) originando-se nos acordos celebrados pelo Reino Unido, nos quais havia cláusulas de subject to tax que foram eliminadas e substituídas pelo termo “beneficiário efetivo”[9]. Por tal razão histórica, o autor sustenta ser claro que o contexto por trás da inserção desse termo nos acordos contra a bitributação é o de anti-abuso.

Na opinião de VOGEL, o uso do referido termo na CM-OCDE teve como objetivo principal restringir o acesso aos benefícios proporcionados pelos acordos contra a bitributação à recebedores meramente formais dos rendimentos que, originalmente, não fariam jus ao usufruto de tais benefícios (p. ex., bancos). Para dar supedâneo ao seu entendimento, o autor menciona que, antes de concordar com a redação do termo beneficiário efetivo para sua inclusão na versão de 1977 da Convenção Modelo, a OCDE considerou incluir dispositivo que visava condicionar os benefícios dos acordos à incidência tributária dessas rendas no Estado da Residência, além de ter considerado incluir a expressão “recebedor final” (“final recipient”) para esse mesmo propósito de prevenção da elisão (tax avoidance) fiscal internacional[10].

Em sentido semelhante, RUSSO[11] aponta que a razão para essa inclusão teria sido a prevenção do treaty shopping, para ele entendida como a prática pela qual um residente de um terceiro Estado reivindica os benefícios de um acordo contra a bitributação em relação a investimentos realizados em um Estado Contratante (Estado da Fonte) por meio de uma entidade intermediária residente no outro Estado Contratante (Estado da Residência da entidade intermediária), para usufruir dos benefícios aos quais tal residente não teria direito inicialmente[12] (se não fosse por meio da estrutura intermediária).

II. Evolução do termo na Convenção Modelo OCDE e nos Comentários OCDE

A análise da evolução e do desenvolvimento do termo “beneficiário efetivo” na CM-OCDE começa, na realidade, com a Convenção Modelo de 1963, na qual essa expressão não existia. A redação do Artigo 10, que tratava de dividendos, era a seguinte:

“1. Dividends paid by a company which is a resident of a Contracting State to a resident of the other Contracting State may be taxed in that other State.

2. However, such dividends may be taxed in the Contracting State of which the company paying the dividends is a resident and according to the laws of that State, but the tax so charged shall not exceed: (…)”

Como dito, a expressão beneficiário efetivo foi inserida pela primeira vez na Convenção Modelo de 1977, na qual o Artigo 10 era assim redigido:

“2. However, such dividends may also be taxed in the Contracting State of which the company paying the dividends is a resident and according to the laws of that State, but if the recipient is the beneficial owner of the dividends the tax so charged shall not exceed: (…)”(marcamos).

Os Comentários da OCDE ao Artigo 10, Convenção Modelo de 1977, no item 12, foram os primeiros a trazer a explicação de que a limitação da tributação sobre os dividendos, por parte do Estado da Fonte, não seria aplicável quando um intermediário, tal como um agente ou mandatário, fosse interposto entre o beneficiário e o pagador, exceto se o beneficiário efetivo fosse residente do outro Estado Contratante[13].

Em 1986 a OCDE concluiu o relatório do Comitê de Assuntos Fiscais intitulado Double Tax Conventions and the Use of Conduit Companies[14], expressamente mencionado nos Comentários ao Artigo 10[15] de 1995 em diante. Esse relatório concluiu que uma sociedade-canal (conduit company) não pode ser, normalmente, considerada o beneficiário efetivo se, embora sendo proprietário formal, na prática ela só dispuser de poderes muito limitados que a tornam, relativamente ao rendimento em questão, um mero fiduciário ou administrador que age por conta das partes interessadas[16].

O relatório em comento, coloquialmente conhecido como OECD Conduit Companies Report – que teve parte de seu parágrafo 14(b) reproduzido no item 12.1 dos Comentários ao Artigo 10 – assim advertia, originalmente, sobre o significado de beneficiário efetivo:

“The Commentaries mention the case of a nominee or agent. The provisions would, however, apply also to other cases where a person enters into contracts or takes over obligations under which he has a similar function to those of a nominee or an agent. Thus, a conduit company can normally not be regarded as the beneficial owner if, though the formal owner of certain assets, it has very narrow powers which render it a mere fiduciary or an administrator acting on account of the interested parties (most likely the shareholders of the conduit company)”[17].

A versão de 1995 da CM OCDE trouxe uma alteração na redação anterior, passando a incluir o termo “residente”, previamente mencionado apenas nos Comentários, mas não no texto da Convenção Modelo em si, para qualificar o beneficiário efetivo. Vejamos a nova redação do Artigo 10, à época:

“2. However, such dividends may also be taxed in the Contracting State of which the company paying the dividends is a resident and according to the laws of that State, but if the beneficial owner of the dividends is a resident of the other Contracting State the tax so charged shall not exceed: (…)”(marcamos)

Os Comentários de 1995, contudo, não trouxeram qualquer inovação em relação àqueles anteriores, especificamente no que se referia à definição do termo “beneficiário efetivo” nos Artigos 10, 11 e 12, uma vez que o aditamento fora feito diretamente ao texto da CM.

Desde então, não ocorreram mudanças relevantes nos Comentários ou no texto da CM OCDE dos anos seguintes de 2003, 2008 e 2010, envolvendo a definição de beneficiário efetivo dos artigos de dividendos, juros e royalties.

III. Regramento no texto da Convenção Modelo OCDE e nos Comentários OCDE

É importante ressaltar que não há definição expressa do termo “beneficiário efetivo” no texto da CM OCDE, tampouco no Modelo da ONU e no Modelo EUA. A referida expressão é apenas mencionada, mas não conceituada, nos Artigos 10 (Dividendos), 11 (Juros) e 12 (Royalties) da Convenção Modelo da OCDE, respectivamente, nas seguintes passagens abaixo colacionadas:

“Artigo 10.

Dividendos

1. Os dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado Contratante a um residente do outro Estado Contratante podem ser tributados nesse outro Estado.

2. Esses dividendos, podem, no entanto, ser igualmente tributados no Estado Contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos e de acordo com a legislação desse Estado, mas, se o beneficiário efetivo dos dividendos for um residente do outro Estado Contratante, o imposto assim estabelecido não excederá:

a) 5% do montante bruto dos dividendos, se o seu beneficiário efetivo for uma sociedade (com exceção de uma partnerhisp) que detenha, diretamente, pelo menos 25% do capital da sociedade que paga os dividendos;

b) 15% do montante bruto dos dividendos, nos demais casos.” (grifamos)

“Artigo 11.

Juros

1. os juros provenientes de um Estado Contratante e pagos a um residente do outro Estado Contratante podem ser tributados nesse outro Estado.

2. No entanto, esses juros podem ser igualmente tributados no Estado Contratante de que provêm e de acordo com a legislação desse Estado, mas se o beneficiário efetivo dos juros for um residente do outro Estado Contratante, o imposto assim estabelecido não excederá 10% do montante bruto dos juros. As autoridades competentes dos Estados Contratantes estabelecerão, de comum acordo, a forma de aplicar esse limite.” (grifamos)

“Artigo 12.

Royalties

1. Os royalties provenientes de um Estado Contratante e cujo beneficiário efetivo é um residente do outro Estado Contratante só podem ser tributados nesse outro Estado.” (grifamos)

À época da inserção do termo, LUKOFF apontou que poucas foram as explicações dos motivos que justificaram o uso dessa expressão, sendo a única justificativa relacionada às figuras do agente e mandatário interpostos entre o beneficiário e o pagador dos rendimentos[18].

Os Comentários[19] aos Artigos 10[20], 11[21] e 12[22] da CM-OCDE esclarecem que o conceito de beneficiário efetivo não deve ser usado numa acepção estrita e técnica, mas, ao contrário, “deve ser entendido no contexto e à luz do objeto e dos propósitos da Convenção Modelo, notadamente o de evitar a dupla tributação e prevenir a evasão e a fraude fiscais”[23].

Ademais, o item 12.1 dos Comentários ao parágrafo 2 do Artigo 10[24] menciona que um intermediário, tal como um agente ou mandatário, quando interposto entre o beneficiário e o pagador dos rendimentos, não será considerado como o beneficiário efetivo dessa renda. Isto porque, seria inconsistente com o objeto e propósito da Convenção Modelo que o Estado da Fonte concedesse uma redução ou isenção do imposto pelo simples fato de o beneficiário imediato do rendimento ser residente do outro Estado Contratante[25].

Os mesmos Comentários explicam que, na situação supra descrita, o recebedor imediato do rendimento é qualificado como residente, contudo, não existe o risco da dupla tributação da renda por consequência disso, haja vista que tal beneficiário não é considerado, do ponto de vista fiscal, como o proprietário do rendimento no Estado da Residência[26] (e, portanto, não estaria ele próprio sujeito à tributação).

Também, seria igualmente inconsistente com o objeto e com o propósito da Convenção que o Estado da Fonte concedesse uma redução ou isenção do imposto a um residente de um Estado Contratante que atue, senão por meio de uma relação (jurídica) de agência ou mandato, como simples canal ou trampolim (conduit) em nome de outra pessoa que, de fato, realmente se beneficia do rendimento em causa[27].

Neste tocante, a limitação do imposto cobrado no Estado da Fonte mantém-se disponível quando um intermediário, seja um agente ou mandatário, situado num Estado Contratante ou num terceiro Estado se interponha entre o beneficiário e o pagador, mas o beneficiário efetivo seja residente no outro Estado Contratante[28].

A partir da análise do texto contido na CM OCDE e dos Comentários aos Artigos 10, 11 e 12 é possível notar que não existe uma definição descritiva expressa do que seria o beneficiário efetivo de tais rendimentos.

Todavia, interessante atentar para o que TOIT chamou de “definição negativa” do termo feita pelos Comentários, uma vez que estes expressamente descreveram as pessoas que não serão consideradas, em nenhuma hipótese, como os “beneficiários efetivos” dos rendimentos[29]. Isto é, agentes e mandatários, bem como empresas-canal (conduit companies) desde que atuem como fiduciários ou administradores da renda de terceiros – precisamente por não agirem em nome próprio com relação aos rendimentos recebidos – jamais serão qualificados como tal e, portanto, não terão direito de invocar a aplicação dos benefícios concedidos por um acordo contra a bitributação, uma vez que estarão fora do escopo subjetivo dos acordos, não possuindo treaty entitlement.

A partir dessa definição negativa do que se entende como não sendo o beneficiário efetivo dos acordos contra a bitributação, é possível notar o real objetivo da inserção dessa expressão na CM OCDE, em 1977: evitar “unintended treaty benefits” (i.e., aplicação não intencional dos benefícios do acordo tributário) para meros intermediários que respondem por terceiros e, portanto, dos quais a renda decorrente de dividendos, juros e royalties não compõe seu próprio patrimônio.

Extrai-se, da leitura dos Comentários, que a análise relacionada à atuação de uma pessoa como agente, mandatário ou fiduciário passa por um exame da substância (material) e não meramente formal (documental) dos poderes envolvendo a pessoa a ser considerada como o beneficiário efetivo da renda, haja vista a parte final do item 12.1 dos Comentários, em que é dito que “uma conduit company não pode ser normalmente considerada o beneficiário efetivo se, embora sendo o proprietário formal, na prática só dispuser de poderes muito limitados”.

Incontestavelmente, portanto, a determinação do beneficiário efetivo passa, sobretudo, mas não somente para as conduit companies, por uma detida análise fática do caso concreto, o que inúmeras vezes é demasiado complexo. Essa análise da situação fática culmina por tornar consideravelmente casuística a verificação do beneficiário efetivo envolvendo sociedades que atuem como holdings intermediárias, dificultando a eleição de uma regra geral única.

Importante ressaltar que essa dificuldade será do Estado da Fonte, que deverá demonstrar que a pessoa recebedora dos rendimentos, localizada no Estado da Residência, não é o beneficiário efetivo desses. Caso assim não consiga demonstrar, terá que aplicar a redução tributária prevista no acordo contra a bitributação celebrado com o Estado da Residência, em virtude do pacto assumido com esse outro Estado.

Há, também, uma breve tentativa de definição de beneficiário efetivo na Explicação Técnica do Modelo EUA (US Technical Explanation) ao Artigo 10 (2), de 1996, que o definiu como “qualquer pessoa residente em um Estado Contratante a qual aquele Estado atribuísse o dividendo para fins de sua tributação”, sem grandes esclarecimentos adicionais.

Interessante notar que os Comentários expressamente recomendam que, os Estados que desejem formular de forma mais explícita o conceito e as restrições decorrentes do termo beneficiário efetivo, assim devem fazê-lo durante as negociações bilaterais entre eles. Ora, essa recomendação é de toda evidente e desnecessária, numa primeira análise, haja vista que os Estados Contratantes podem, sempre alterar o texto da CM-OCDE na medida em que desejarem, uma vez que o instrumento individual e concreto acordo contra a bitributação é fruto de concessões e negociações mútuas entre dois Estados soberanos, que não se encontram limitados por normas jurídicas que não aquelas vigentes em seus próprios sistemas jurídicos (e aquelas decorrentes dos costumes internacionais)

A CM-OCDE é um modelo que se presta a auxiliar a negociação e estruturação de um acordo internacional específico, entre dois Estados Contratantes. Não há – e por óbvio nem poderia – existir sanção para o descumprimento de um modelo, i.e., alteração do conteúdo veiculado na CM-OCDE e em seus Comentários, que são recomendações, ainda que de reconhecida importância.

IV. Argumentos contrários à aplicação do Artigo 3(2) da CM OCDE para definir beneficiário efetivo com base em lei interna

Convém salientar que a razão pela qual a restrição ao treaty entitlement (i.e., direito de aproveitamento dos benefícios dos acordos contra bitrituação) trazido pelo termo beneficiário efetivo foi incluída na Convenção Modelo de 1977 foi, historicamente, a de identificar o uso abusivo de tais acordos[30], além de esclarecer a regra de atribuição de renda para rendimentos passivos específicos. Em especial, o intuito original foi o de evitar que um residente de um terceiro país que não aqueles dois Estados Contratantes (Estado da Fonte e Estado da Residência) usufruísse dos benefícios relacionados ao tipo de renda decorrente do investimento realizado em um dos Estados Contratantes por meio de um mero agente ou procurador que fosse residente no outro Estado (Estado de Residência).

Esse contexto histórico dá margem a duas constatações[31]. A primeira é a de que os redatores da Convenção Modelo de 1977, à época, tinham ideias específicas ao incluir pela primeira vez no modelo essa expressão, o que é um indício para uma definição a ser construída com base na própria CM-OCDE, prevalecendo sobre a definição construída com base em leis internas. A segunda é a de que a inclusão do termo “beneficiário efetivo” em 1977 revelava claramente o intuito de tratar do problema do abuso de acordos contra bitributação, i.e., treaty shopping.

Desta forma, de acordo com WIMAN[32], deve-se primar pela interpretação do conceito com base na CM-OCDE (treaty interpretation), ao invés de utilização da referência à lei interna para definição de tal conceito.

O Artigo 3(2) da CM OCDE traz a chamada “cláusula de reenvio”, também conhecida como lex fori clause, que permite a remissão à lei interna do Estado que está aplicando o acordo contra a bitributação para a interpretação (definição) de um termo não expressamente definido no próprio acordo. Veja-se:

Artigo 3º.

Definições Gerais

1. (…)

2. No que se refere à aplicação da Convenção, num dado momento, por um Estado Contratante, qualquer termo ou expressão não definidos de outro modo terão, a não ser que o contexto exija interpretação diferente, o significado que lhe for atribuído nesse momento pela legislação diferente, o significado que lhe for atribuído nesse momento pela legislação desse Estado que regula os impostos a que a Convenção se aplica, prevalecendo a interpretação resultante da legislação fiscal sobre a que decorre de outra legislação desse Estado”. (tradução livre)

Adotando uma posição no mesmo sentido de WIMAN, mas defendendo com mais veemência o primado da interpretação do conceito de beneficiário efetivo com base no Direito Tributário Internacional, isto é, baseada nos CM-OCDE e materiais correlatos (Comentários, relatórios etc.) ao invés da remissão a lei interna de cada país, GOUTHIÈRE[33] diz temer o significado que tal conceito possa vir a ter nas leis do Direito doméstico, salientando que poderá vir a extrapolar o sentido pretendido pelos autores da Convenção Modelo OCDE de 1977. Para o autor, não obstante a CM-OCDE não possuir a descrição do conceito de beneficiário efetivo, os Comentários à CM-OCDE dão uma definição precisa e somente se referem as noções de comissionaire e de agente.

Nesse sentido, o mesmo autor[34] também é um dos defensores da utilização dos Comentários como hermenêutica válida para a definição do referido termo. Sustentando posição ainda mais arrojada, ele chega a dizer que se deve considerar o termo “beneficiário efetivo” como definido, nos termos dos Comentários, não sendo apropriada remissão a lei doméstica no que se refere ao tema. E o autor expõe quatro razões para justificar seu posicionamento.

A primeira delas é lastreada na análise histórica, já exposto. Ou seja, a intenção dos membros do Comitê de Assuntos Fiscais no momento da inserção de tal termo na versão de 1977 da CM.

A segunda razão diz respeito a ausência considerável do termo “beneficiário efetivo” para fins dos acordos contra a bitributação na legislação interna dos Estados Membros. Nesse ponto, o autor faz uma importante observação ao salientar que não se questiona, nos acordos ou na legislação interna, o que significa “beneficiário”, mas sim, o que é “beneficiário efetivo”, conforme mencionado na CM-OCDE. Ademais, o especialista francês afirma não concordar com a justificativa da utilização de normas domésticas antiabuso tais como substance over form e abuso de direito como decorrência do conceito ou da definição de beneficiário efetivo o que, particularmente, também concordamos por entendermos serem semelhantes, mas com campos de aplicação distintos, ainda que com pontos de intersecção.

O terceiro motivo se baseia na necessidade de certa segurança jurídica e consistência normativa na interpretação e aplicação dos acordos. É necessário que as entidades e pessoas, para fazer jus aos acordos contra a bitributação, entendam o significado dos termos por eles utilizados. Ademais, questiona-se o fato de a ampliação do significado que foi dado ao termo em 1977 seria uma política geral ruim, uma vez que lesionaria os interesses e direitos dos contribuintes que se confiaram e que se basearam em tal conceito na época[35].

Finalmente, o último argumento levantado é o de que os acordos contra a bitributação devem ser considerados de forma pragmática, e não em abstrato. Nesse tocante, os Estados Membros da OCDE usualmente incluem cláusulas antiabuso específicas e separadas em seus acordos sem grandes dificuldades, não obstante a utilização do termo “beneficiário efetivo” em tais acordos. Dessa forma, o autor defende que o termo beneficiário efetivo não deve ter um significado amplo, caso contrário todas as demais cláusulas incluídas pelos Estados Contratantes em seus acordos contra a bitributação para coibir ou combater o abuso e o treaty shopping tornar-se-iam redundantes ou em vão[36].

Também no sentido de que beneficiário efetivo deve ter um significado afeto aos acordos contra a bitributação, i.e., deve ser um treaty concept e não um conceito definido por leis internas, é a posição de LÜTHI. Para este especialista, a utilização do Artigo 3(2) para a definição de tal conceito poderia comprometer uma solução para fins dos acordos e levaria, inclusive, a certa forma de treaty override[37] (violação do acordo contra a bitributação por meio de lei interna). O raciocínio de LÜTHI é o de que, uma vez que o Estado concede benefícios por meio dos acordos contra a bitributação, é por meio do mesmo instrumento que se deve limitar as circunstâncias nas quais tais benefícios serão negados, e não por meio de leis internas[38]. O argumento é, no mínimo, lógico.

Ademais, de acordo o referido autor, é um fato que o conceito de beneficiário efetivo na CM-OCDE não foi claramente ou expressamente definido porque ele se refere apenas a agentes e mandatários (representantes) e que, por isso, não seria de competência da lei doméstica dos Estados Contratantes decidir quem faz jus aos benefícios dos acordos, mas, caso haja necessidade de tal definição, esta deve decorrer do próprio texto do acordo[39].

Por fim, MOOIJ[40] aduz que, na Holanda, o termo beneficiário efetivo é comumente considerado como um típico conceito dos acordos contra a bitributação (treaty concept) e não derivado de lei interna, e visa assegurar que os benefícios do acordo sejam usufruídos pela pessoa adequada, isto é, a pessoa economically entitled àquele tipo de renda. A questão ganha contornos mais complexos, uma vez as cláusulas que contém referência ao termo beneficiário efetivo (notadamente aquelas que tratam de dividendos, juros e royalties) possuem como foco o critério econômico da propriedade(economic ownership) sobre a renda, e não o critério jurídico (juridical ownership). Essa questão envolvendo o critério jurídico ou econômico na interpretação do beneficiário efetivo será analisa mais a frente neste trabalho.

V. Beneficiário efetivo como regra de atribuição de renda para combate exclusivo de treaty shopping objetivo e específico

Uma questão de suma importância e de muita discussão na doutrina[41], com claras e relevantes consequências práticas para os contribuintes e para a Administração Tributária, diz respeito a amplitude da definição do termo beneficiário efetivo: poderia tal conceito ser utilizado como instrumento no combate à toda e qualquer forma de treaty shopping, ou seriam duas questões diferentes que, por isso, necessitam de mecanismos distintos?

Inicialmente, deve-se fazer a ressalva de que, não é raro, que tribunais[42], administrações fiscais[43] e doutrinadores[44] confundam ou misturem os conceitos de treaty shopping e treaty abuse, por sua similaridade conceitual e dificuldade de separação nos casos práticos envolvendo planejamentos tributários internacionais. Ademais, existem autores que equiparam esses conceitos e que os utilizam como sinônimos[45]. Entendemos que a diferenciação pode ser difícil sob a ótica pragmática.

Em que pesem as inúmeras nuances e posições adotamos, para efeitos didáticos, a definição de que treaty shopping é sinônimo de evasão fiscal, isto é, consiste em simulação ou fraude imperativa à lei fiscal. Por isso, é dotado de maior objetividade em sua verificação e aplicação, decorrente da aplicação de regras. Já treaty abuse seria definido como abuso de direito, podendo adotar as nuances de fraude indireta à lei, elusão fiscal, substance over form e similares[46]. Portanto, seria dotado de maior subjetividade, decorrente de sopesamento de princípios.

Assim, o treaty shopping seria a forma mais objetiva, simples e mais rudimentar (i.e., menos engenhosa, menos complexa e desprovida de causa na celebração dos atos e negócios jurídicos[47]), dotada de patente artificialidade, tal como ocorre com a interposição de um terceiro que age representando outro titular, na qualidade de agente, mandatário, fiduciário ou administrador. Por outro lado, o treaty abuse consistiria em situações em que, não obstante a verificação de um direito do contribuinte, a causa nos negócios jurídicos, a modernidade e complexidade dos instrumentos jurídicos envolvidos, ao serem contrapostas ao direito do Fisco, são considerada abusivas, por força de norma jurídica prévia[48].

Adotando a posição mais radical sobre a questão, GOUTHIÈRE[49] defende que o conceito de beneficiário efetivo não pode ser invocado para justificar a exigência tributária, por parte do Fisco de um país, com base em treaty shopping. Para ele, os países devem introduzir medidas antiabuso específicas e em separado em seus acordos tributários, tal como ocorre com a França, que possui desde 1966 uma medida antiabuso específica no acordo contra a bitributação celebrado com a Suíça[50], o que é perfeitamente legítimo.

Nesse sentido, o fato de que existem medidas antiabuso ad hoc específicas e em separado nos acordos contra a bitributação somente confirma que tais medidas antiabuso não podem ser consideradas implícitas em uma convenção somente por força da existência do termo beneficiário efetivo em seu texto[51]. Na opinião de GOUTHIÈRE[52], quando um acordo contra a bitributação não contém uma cláusula antiabuso fica a cargo da lei interna dos países decidir se haverá abuso de direito na situação enfrentada pelo contribuinte.

Para o autor, a possível solução para o problema da conceituação do “beneficiário efetivo” passaria por uma interpretação restrita e literal do termo, uma vez que os textos legais devem ser interpretados nos seus limites, e não além, bem como pelo fato de que essa abordagem seria a única forma de dar consistência na aplicação do termo a todos os contribuintes, sem desvios ou diferenças, de forma harmoniosa[53].

A expansão do termo como instrumento ao combate de situações de abuso de planejamento tributário internacional instaurou-se, sobretudo, após equivocadas menções veiculadas no relatório Double Taxation Conventions and the Use of Conduit Companies de 1987 – assim como o ocorrido para a instauração do critério econômico de interpretação do conceito de beneficiário efetivo –, posteriormente refletido de forma parcial nos Comentários da OCDE de 2003. Estes dois instrumentos foram, mais uma vez, os grandes responsáveis pela sobreposição de conceitos e princípios distintos (beneficiário efetivo, de um lado, e treaty shopping, de outro) e ajudaram, sobremaneira, a criar a errônea impressão de que beneficiário efetivo é um mecanismo de combate ao abuso de direito ou ao substance over form[54].

Refutando a possibilidade de o uso do termo beneficiário efetivo servir como mecanismo que permite aos Estados Contratantes recorrer a suas leis internas para aplicarem quaisquer medidas antiabuso (tais como prevalência da substância sobre a forma ou interpretação econômica do negócio jurídico) MOOIJI é categórico ao afirmar que:

“a exigência do beneficiário efetivo não visa ser um veículo para todos os tipos de medidas anti-abuso domésticas que não são baseadas na questão de quem efetivamente é o proprietário da renda” (tradução livre).

Portanto, inclusive para os que defendem que beneficiário efetivo permitiria aplicação de lei interna para sua aplicação, em situações abusivas, este conceito é considerado, ainda assim, uma medida restrita e específica no combate ao treaty shopping, especificamente para os casos envolvendo a definição do sujeito que é proprietário da renda. Rejeita-se, assim, qualquer característica geral e ampla, como carta branca para os Estados Contratantes aplicarem suas normas gerais anti-abuso (General Anti-Abuse Rules – GAAR).

Ademais, WIMAN[55] também compartilha da opinião de GOUTHIÈRE[56] de que deve haver pouquíssimo espaço – se algum – para se utilizar o conceito de beneficiário efetivo no combate ao abuso no planejamento tributário internacional fora do contexto restrito existente na CM. Para o primeiro, a situação do combate ao abuso dos acordos deve ser feita por meio de medida inserida especificamente no texto, devendo-se evitar, ao máximo, remissão a leis internas para os casos de abuso de acordos contra a bitributação[57].

Para tanto, WIMAN salienta a importância de não se expandir a interpretação literal (estrita) da CM-OCDE na interpretação do beneficiário efetivo. Na verdade, o autor vai mais além e defende que não se deve permitir legislação antielisiva[58] (tax-avoidance legislation) nesse contexto[59].

Em sintonia com essa interpretação, TAVOLARO se posiciona no sentido de que, a cláusula de beneficiário efetivo é um meio de eficácia limitada na prevenção da evasão e elisão fiscal internacional[60].

JÌMENEZ afirma que, sob esta análise, a interpretação de beneficiário efetivo como uma cláusula que permite medidas domésticas antiabuso (gerais ou específicas) serem incluídas no contexto dos acordos contra a bitributação não é justificável e pode até afetar negativamente não apenas a aplicação simétrica dos acordos, como também os direitos dos contribuintes segundo a lei interna[61].

A questão da interpretação estrita do conceito de beneficiário efetivo pode ser suportada por meio de cinco argumentos baseados em atos da própria OCDE. Em primeiro lugar, o relatório de 1987 que tratou das conduit companies excluiu não todas as conduit companies do treaty entitlement relacionado ao beneficiário efetivo, mas, tão somente, aquelas que agissem com poderes restritos que as caracterizasse como fiduciárias ou administradoras atuando em nome de terceiro[62]. Em segundo lugar, os Comentários da OCDE de 2003 aos Artigos 10 a 12 adotaram as conclusões do relatório de 1987 sobre conduit companies e, ao contrário desse relatório, não fez referência ao termo “economic reality” em seu texto[63].

Em terceiro lugar, o relatório sobre partnerships identificou o conceito de beneficiário efetivo como atribuição de renda[64]. Em quarto lugar, a posição historicamente adotada pela OCDE até o ano de 2003 de relutar em aceitar a aplicação de medida antiabuso no contexto dos acordos contra bitributação pode ser encarada como uma confirmação (ainda que tácita) de que beneficiário efetivo não era uma cláusula anti-abuso[65]. Por fim, se qualquer conduit company pudesse ser atacada por meio do conceito de beneficiário efetivo, o item 13 dos Comentários da OCDE ao Artigo 1º – que tratam das diferentes formas de combater o uso das conduits nos acordos – deixaria de fazer qualquer sentido, por haver sobreposição dos objetivos[66].

A decisão no caso canadense Prévost Car Inc. v. The Queen, analisada mais a frente, parece confirmar o entendimento de que o termo “beneficiário efetivo” funcionaria como uma espécie de regra de atribuição de renda, inclusive, ao basear sua decisão em fatos que ocorreram no Estado de Residência (Holanda) da companhia recebedora dos dividendos, salientando que, desde que a companhia holding holandesa fosse a proprietária, jurídica renda, com base na legislação comercial e tributária desse país, o conceito de beneficiário efetivo estava adimplido, não obstante a existência de um acordo de acionistas prevendo a posterior distribuição da renda recebida.

É exatamente nesse contexto que ganham importância as cláusulas de limitação de benefícios ou cláusulas LOB. As limitações aos benefícios dos acordos contra a bitributação, conhecida em inglês como limitações ao treaty entitlement não devem ser feitas por meio do conceito de beneficiário efetivo haja vista que essa prática deixaria uma “enorme frente aberta” para a aplicação de leis (normas) internas para esclarecimentos de termos utilizados nos acordos.

Se o Estado Contratante desejar restringir benefícios em seus acordos, deve assim fazê-lo não por meio da descaracterização, ampliação ou desvirtuando o conceito de beneficiário efetivo dos acordos contra a bitributação – que, para nós, é um term of art decorrente da linguagem fiscal internacional – mas sim, por meio de medidas específicas anti-abuso inseridas, de comum acordo, no texto do tratado. Assim, cabe ao Estado negociar com seu parceiro (o outro Estado Contratante) a inclusão de limitações explícitas condicionando o aproveitamento de tais benefícios.

Dentre as formas consagradas para cumprir tal objetivo encontra-se a cláusula de Limitação de Benefícios (LOB clause), que faz parte do Modelo EUA (U.S. Model Treaty), em seu Artigo 22 e mencionada nos Comentários da CM-OCDE ao Artigo 1º, por nós analisadas em trabalho específico[67].

VI. Ausência de beneficiário efetivo no acordo contra a bitributação e sua interpretação

Uma questão importante surge quando se analisa o tema da conceituação do beneficiário efetivo nos acordos contra a bitributação propriamente ditos, e não sob a ótica da Convenção Modelo da OCDE.

Sabe-se da importância da CM para fins da negociação e interpretação dos acordos contra a bitributação, sobretudo nos casos em que os acordos em si adotam a CM da OCDE. Todavia, quando se interpreta um acordo dessa natureza, se está diante de um instrumento específico, fruto de amplas negociações, comprometimentos e concessões mútuas de ambas as partes envolvidas. Esse texto específico do acordo contra a bitributação pode não conter o termo beneficiário efetivo previsto na CM-OCDE, se as partes assim acordarem.

Nessa hipótese, a questão que se levanta é se o conceito de beneficiário efetivo deve ser utilizado na interpretação dos rendimentos decorrentes de dividendos, juros e royalties, ainda que não expresso no texto do acordo contra a bitributação celebrado pelos Estados Contratantes.

Essa questão também possui uma aplicabilidade prática, uma vez que, antes de 1977 a CM-OCDE não continha o termo beneficiário efetivo em seu texto. Assim, diversos acordos bilaterais celebrados por Estados Contratantes que se basearam na versão pré-1977 de tal modelo não contém o referido termo. Nesse ponto, especificamente, vale fazer referência à discussão envolvendo interpretação dinâmica e estática da CM-OCDE e dos Comentários.

A partir do questionamento sobre interpretação dos acordos que não contém o termo beneficiário efetivo surge a pergunta: haveria um conceito implícito de beneficiário efetivo para os rendimentos dos Artigos 10, 11 e 12 da CM-OCDE, aplicável independentemente de sua menção expressa no texto do acordo a ser interpretado?

De acordo com WALSER[68], o precedente norte-americano Aiken Industries, que envolvia o acordo contra a bitributação celebrado entre EUA e Honduras e não continha o termo beneficiário efetivo, elucida sua opinião. Na decisão do caso, a corte tributária dos EUA não mencionou esse termo, mas, segundo o autor, o raciocínio utilizado para negar os benefícios do acordo era deveras semelhante ao aplicável na definição de beneficiário efetivo, posteriormente incluído na CM OCDE e explicado nos Comentários OCDE. A justificativa é de que a expressão “recebidos por” utilizada no acordo celebrado pelos EUA não se referia apenas à obtenção de posse física e em bases temporárias de valores representativos de juros pagos por um Estado Contratante, mas sim, contemplava o domínio e controle completos sobre tais valores (i.e., propriedade).

Ele expõe que, aparentemente, Alemanha, Holanda e França adotavam esse entendimento de que, ainda que o acordo contra a bitributação não contivesse o menção ao “beneficiário efetivo”, ele deveria ser aplicado. Todavia, curioso apontar para o fato de que, segundo WALSER, a aplicação implícita do conceito de beneficiário efetivo seria justificada pelo uso de medida anti-abuso doméstica existente nesses países, para produção do mesmo efeito que a aplicação do termo beneficiário efetivo em tais artigos causaria[69].

Também para VOGEL, a ausência da expressão beneficiário efetivo em determinado acordo contra a bitributação não conduziria a resultado distinto senão ao de sua aplicação ainda que não expresso, por força de princípios gerais visando coibir abuso nos tratados. Segundo o renomado autor:

“(…) não obstante o termo não ter sido incluído na Convenção Modelo da OCDE de 1963, os acordos contra a bitributação que seguiram aquele modelo não levarão, normalmente, a outro resultado diferente, em razão dos princípios gerais sobre o abuso de tratados” (tradução livre).

Em posição contrária, VAN WEEGHEL rejeita a teoria da existência de norma geral implícita nos acordos contra a bitributação, apesar de reconhecer que para a maior parte dos autores essa norma existiria[70].

Para TAVOLARO, a ausência de referência ao termo beneficiário efetivo nos acordos não resultaria em abuso, mas sim em planejamento tributário legítimo sendo seu texto, portanto, interpretado sem esse referido termo. A exceção, para o autor, seria nos casos de treaty shopping, que o próprio define como sendo um planejamento que infrinja os princípios da justiça, que ocorreriam quando a transação fosse feita ou a entidade fosse criada em um Estado Contratante com o único objetivo de gozar de benefício fiscal decorrente do tratado entre o este Estado e um terceiro país, que não fosse de outra maneira usufruível. São palavras do autor:

“A invocação do conceito de beneficiário efetivo, na aplicação dos TDT [tratados contra a dupla tributação] em que a ele referência não há, descabe inteiramente a nosso ver, colocando-nos na posição minoritária da doutrina, que não vê o conceito, per se, como bastante para se atingir a conclusão pela existência de abuso do uso do TDT”. [71]

A posição não é de todo minoritária, uma vez que CATÃO também assim entende, ao sustentar que, no caso de convenções sem a menção ao beneficiário efetivo, não se deve aplicar o seu conceito na interpretação das cláusulas do acordo contra a bitributação, uma vez que o autor entende não poder ser, esse termo, unicamente considerado como um princípio do direito tributário internacional capaz de assegurar sua incorporação implícita a todos os acordos celebrados por determinado país. Se assim fosse entendido, o autor entende que estar-se-ia diante de uma regra específica antielusiva que, no caso do Brasil, não teria suporte no ordenamento jurídico[72].

Pessoalmente, concordamos com os autores brasileiros no sentido de que, em razão da existência do termo beneficiário efetivo nos acordos contra a bitributação, sua interpretação não deve pressupor tal conceito, haja vista a sua  ausência. Ademais, não concordamos com um princípio implícito antiabuso nos acordos contra a bitributação, uma vez que, a existência de modelos de cláusulas de limitação de benefícios e o combate de eficácia limitada ao treaty shopping decorrente do uso de beneficiário servem, exatamente, para esse propósito.

A decisão dos Estados Contratantes em não adotá-los é, por assim dizer, um “silêncio eloquente”, uma vez que configura manifesta vontade e poder de escolha de não só um, mas dos dois Estados Contratantes na celebração do acordo internacional contra a bitributação. Há, destarte, uma manifesta negação das partes do acordo ao não incluir esse conceito em seu texto, o que não pode ser ignorado quando de sua interpretação e aplicação.

Para os acordos que tomaram por base a versão de 1963 da CM-OCDE, em cujo o termo não existia, entendemos que não deve ser feita uma interpretação dinâmica da Convenção Modelo e tampouco dos Comentários. Isto porque, nesse caso a aplicação dos novos textos não serviria para esclarecer o significado de um termo dúbio, mas sim, estaria modificando o texto e instituindo uma nova norma a esses acordos anteriores ao modelo de 1977. Por essa razão, negamos a extensão do termo beneficiário efetivo a todo e qualquer acordo contra a bitributação que não contenha, expressamente, o mesmo, seja originalmente no texto do tratado seja por meio de alteração decorrente de protocolo ou instrumento bilateral equivalente.

Finalmente, vale mencionar que dois julgados, um no Brasil (caso Volvo) e outro na Índia (caso Azadi Bachao Andolan) envolvem essa questão. No caso brasileiro, não há o termo beneficiário efetivo no acordo celebrado entre Brasil e Japão, sobre o qual o caso versa. No caso indiano, a questão levantada é a intenção dos Estados Contratantes de, por meio da não inserção de cláusulas anti-abuso no acordo, estimular o treaty shopping, de forma legítima e consensual. Esses casos serão analisados mais a frente neste estudo.

VII. Extensão do termo beneficiário efetivo para outros artigos da Convenção Modelo OCDE

Outra questão interessante e com sérias implicações práticas decorre da eventual possibilidade de se estender o conceito de beneficiário efetivo para os demais artigos da CM-OCDE, não só utilizando seu conceito para as interpretação e aplicação do tratamento tributário dos dividendos, juros e royalties, mas também para os demais tipos de renda tratados na Convenção Modelo (e, consequentemente, nos acordos internacionais contra a bitributação).

Para MOOIJ, não faria sentido deixar aplicar o requisito do beneficiário efetivo para rendimentos além dos dividendos, juros e royalties, como cláusula geral anti-abuso. Isso porque, para ele, não há nenhum motivo para que os Estados Contratantes somente queiram coibir situações abusivas nos limites dos Artigos 10, 11 e 12, mas, em contrapartida, aceitem plenamente situações de abuso envolvendo os demais artigos do mesmo acordo contra a bitributação[73].

Destarte, o mencionado debatedor partilha da opinião de que existe um entendimento geral subjacente de que a substância prevalece sobre a forma em todos os artigos da CM-OCDE, mesmo nos casos em que o termo beneficiário efetivo não esteja explicitamente inserido ou mencionado. Essa interpretação é similar àquela defendida por VOGEL[74] e WARD[75]. analisada no item anterior, sobre a ausência do termo nos acordos, de que existiria um princípio geral antiabusivo aplicável aos acordos internacionais contra a bitributação que justificaria a extensão do conceito de beneficiário efetivo para todos os dispositivos do acordo.

Para WALSER, a menção do termo beneficiário efetivo nos Artigos 10, 11 e 12 não foi mera coincidência, uma vez que estes tipos de rendimentos são passivos e, portanto, mais fáceis de realocar e transferir para agentes e representantes ou procuradores do que as rendas ativas (i.e., decorrentes de atividades de indústria, comércio e serviços tais como a renda classificada como “Lucros das Empresas”, prevista no Artigo 7 da CM-OCDE). Assim, fora do rol de rendimentos passivos, a utilização do termo restaria de pouca aplicabilidade prática[76].

Contudo, pode-se apontar outros artigos da CM-OCDE que poderiam requerer a aplicação do conceito de beneficiário efetivo, hoje neles ausente, tais como o Artigo 13 (Ganho de Capital) e o Artigo 17 (Artistas e Desportistas), além do Artigo 21 (Outros Rendimentos). O primeiro sob o argumento de que, tal como os dividendos, juros e royalties, classifica-se como renda passiva; o segundo por força da estrutura intermediária por ele originada e reconhecida; e o terceiro por abranger hipóteses excepcionais de renda prevista no acordo.

Imperioso ressaltar que este assunto sobre a possibilidade de extensão da aplicação do conceito de beneficiário efetivo foi recentemente objeto de análise pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2008[77].

A conclusão por parte dos especialistas do Comitê da ONU foi a de que, talvez por força da ausência de consenso sobre o tema, deve-se refinar o conceito de beneficiário efetivo, mas nenhuma decisão final foi tomada.

BAKER adverte para os perigos da extensão do conceito de beneficiário efetivo para os outros artigos da Convenção Modelo da ONU. Para o professor, a ordem de preferência na conclusão desse tema seria, da mais para a menos recomendada: (i) não alterar nada; (ii) adicionar o termo beneficiário efetivo somente no Artigo 21; (iii) adicionar o termo beneficiário efetivo nos Arts. 13.6 e 22.4; (iv) adicionar o termo beneficiário efetivo ao Artigo 7(5); (v) adicionar uma limitação autônoma de beneficiário efetivo nos moldes de uma cláusula de limitação de benefícios no texto da Convenção Modelo; e (iv) adicionar uma adicionar uma limitação autônoma de beneficiário efetivo nos moldes de uma cláusula de limitação de benefícios nos Comentários[78].

Somos da opinião de que, em razão da especificidade, da bilateralidade, da interpretação do texto dos acordos contra a bitributação nos termos do Artigo 31(1) da CVDT, do princípio do pacta sunt servanda presente no Artigo 26 da CVDT, da interpretação por meio do critério legal do termo “beneficiário efetivo” e, de diversos outros motivos, que o conceito de beneficiário efetivo não deve ser estendido aos demais artigos quando não houver menção direta no texto do acordo.

VIII. Discussion Draft da OCDE de 29 abril de 2011 sobre beneficiário efetivo

Deve-se destacar que, no dia 29 de abril de 2011, a OCDE – na tentativa de buscar soluções para o problema da definição do significado de beneficiário efetivo nos acordos contra a bitributação – publicou uma Minuta de Discussão (Discussion Draft) contendo alterações aos Comentários aos Artigos 10, 11 e 12 da CM OCDE (versão de 2010) especificamente tratando do termo beneficiário efetivo[79].

Restou ratificada a intenção de não fazer referência à lei interna quando aduz que o termo “beneficiário efetivo” não é utilizado em um sentido técnico estrito, tal como o significado que ele possui nas leis de trust de países de common law. Ao mencionar que esse termo deve ser interpretado à luz dos objetivos e finalidades da CM (incluindo evitar a dupla tributação e prevenir a evasão e elisão fiscais) salienta que isso não significa que o conceito de beneficiário efetivo da lei interna é automaticamente irrelevante, podendo ser aplicável desde que seja consistente com as orientações gerais previstas nos Comentários.

A Minuta de Discussão propôs a criação dos parágrafos 12.4, 12.5 e 12.5 ao Artigo 10, além da alteração na redação do parágrafo 12.1 que, unidas, trazem importantes informações sobre o assunto.

O parágrafo 12.4 dizia que, nos vários exemplos de agente, mandatário, conduit company agindo como fiduciário ou administrador, o recebedor dos dividendos não é o beneficiário efetivo porque ele não possui o pleno direito de uso e gozo do dividendo recebido e esse dividendo não é seu (próprio). Os poderes desse recebedor sobre os essa renda é limitado uma vez que o recebedor é obrigado (por força de obrigação contratual, dever fiduciário ou de outra natureza) a repassá-la a outrem.

Destarte, o recebedor dos dividendos será o beneficiário efetivo se possuir pleno direito de usar e gozar dos dividendos sem limitações por força de contrato ou obrigação legal de repassá-los a outra pessoa. A verificação da existência de obrigação legal ou contratual poderá ser feita tanto por análise documental como em função de fatos e circunstâncias, desde que demonstrado que, em substância, o recebedor claramente não tinha o pleno direito de usar e gozar dos dividendos. Por fim, aponta que o uso e gozo de um dividendo deve ser distinguido de seu título legal, bem como das ações em razão da qual é pago[80].

A Minuta de Discussão ora em referência apenas confirmou o entendimento que defendemos há tempos, com suporte em parte da doutrina, de que o beneficiário efetivo é uma regra de atribuição de renda e, portanto, seu uso é restrito ao combate ao treaty shopping e não do abuso dos acordos contra a bitributação que foge aos casos envolvendo intermediários agindo em nome de terceiros, especificamente relacionados a dividendos, juros e royalties. Ratificou, também, que o critério de interpretação do direito de propriedade da renda deve ser preponderantemente o jurídico, e que a inclusão desse termo na CM-OCDE não teve intenção de fazer referência à lei interna quando aduz que o termo beneficiário efetivo, rejeitando a aplicação do significado de direito interno decorrente dos países de common law.

IX. Proposta de Revisão à Minuta de Discussão sobre Beneficiário Efetivo da OCDE de Outubro de 2012

Após a publicação da Minuta de Discussão intitulada Clarification of the Meaning of Beneficial Owner de 29 de abril de 2011, supra examinada, a OCDE posteriormente disponibilizou as sugestões de alterações e comentários feitos por especialistas a tal documento em 19 de Outubro de 2012 – Revised Proposals on Public Discussion Draft (“Proposta de Revisão à Minuta de Discussão de Outubro 2012”). O Grupo de Trabalho 1 (Working Party 1), responsável por revisar as propostas e sugestões à Minuta de Discussão encerrou a versão final revisada na reunião da OCDE feita em fevereiro de 2013.

Uma afirmação importante restou consignada no mencionado documento sobre sociedades holding: “(…) meras sociedades holding podem ser consideradas beneficiário efetivo e isso não depende de substância física (ter um escritório e empregados)”. Em nossa visão, essa declaração é uma evidente ratificação do entendimento decorrente do caso Prévost (Canadá) – também aqui analisado – e que considerou que típicas sociedades holdings podem, de fato, ser beneficiário efetivo de rendimentos passivos (no precedente judicial específico, de dividendos). Para nós é claro que a ausência de “presença física” (empregados, etc.) na sociedade holding não é e nem pode ser requisito sine qua non para fins de sujeitação do beneficiário efetivo de acordos contra a bitributação aos benefícios de tal acordo, sobretudo considerando a ausência de cláusula LOB assim exigindo.

É importante mencionar que, dentre as diversas sugestões e alterações feitas, uma delas afirmou que o conceito de beneficiário efetivo não deveria ser reexaminado por outras normas antiabuso, caso fosse verificado o cumprimento do primeiro requisito (i.e., em caso de o conceito de beneficiário efetivo restar verificado na situação fática). O Grupo de Trabalho, todavia, discordou veementemente desse entendimento, argumentando que o beneficiário efetivo ainda deve obeceder demais requisitos antiabuso, para fazer jus aos benefícios dos acordos contra a bitributação.

Para nós, essa não é a interpretação correta. Isso porque, em acordos em que não haja a cláusula LOB, o beneficiário efetivo não deve ser rechecado por força de cláusulas antiabuso genéricas se previstas em lei interna (GAAR). Ora, o requisito do “beneficiário efetivo” é uma condição de “treaty entitlement” por si só, relativamente a dividendos, juros e royalties, funcionando como um mecanismo restrito e mais básico de controle de treaty shopping. Na ausência de cláusula LOB no acordo internacional e, sendo o conceito de beneficiário efetivo verificado, não se deve restringir a aplicação do tratado por outra regra antiabuso, ainda que por lei doméstica, especificamente para tal caso.

Se, por outro lado, existir cláusula LOB no acordo, o conceito de beneficiário efetivo continuará a ser interpretado autonomamente, mas pragmaticamente estará abarcado pela cláusula LOB, na maior parte das vezes. Assim, cumpridos os requisitos da cláusula LOB típica do Modelo Norte-Americano de Tratados, o contribuinte estará, ainda que indiretamente, cumprindo com o conceito de beneficiário efetivo na maior parte das ocasiões, exceto se houver menção expressa no texto do acordo sobre o reexame a ser feito por norma antiabuso interna (GAAR) o que, para nós, deve ser evitado.

Interessante notar que o Grupo de Trabalho afirmou que “seria muito difícil encontrar um significado único e universal para o termo ‘beneficiário efetivo’, independentemente do contexto no qual foi originalmente utilizado” o que, em nosso entendimento, contribui para a opinião de que esse termo vago, quando utilizado nos acordos contra a bitributação, deva ser restrito às regras em para as quais foi inserido, notadamente, alocação de renda para fins de aplicação dos acordos internacionais, e combate mínimo ao treaty shopping mais básico, porém nada mais do que isso.

X. Atualização da CM OCDE e dos Comentários de 2014 com relação ao Conceito de Beneficiário Efetivo

Em 16 de julho de 2014[81], a OCDE publicou o conteúdo das atualizações a serem inseridas na CM-OCDE e nos Comentários de 2014. Dentre os diversos tópicos atualizados encontra-se o conceito de “beneficiário efetivo”.

Dentre as mudanças incluídas na atualização de 2014 estão aquelas decorrentes da Minuta de Discussão de 29 de Abril de 2011 e da Proposta de Revisão à Minuta de Discussão de 19 de Outubro de 2012. De acordo com a OCDE, as alterações feitas à CM-OCDE relativamente ao termo “beneficiário efetivo” deixam claro que tal expressão não deve ter seu significado dado com base em lei doméstica dos países, mas sim, deve ser entendida no contexto dos acordos internacionais contra a bitributação.

Ademais, a versão atualizada faz distinção entre o proprietário legal do bem que dá origem à renda (i.e., ações, título de dívida ou direito) e o “beneficiário efetivo” de tal renda, que poderá ser diferente do primeiro em certos casos.

Por fim, a versão de 2014 deixa claro que o conceito de beneficiário efetivo não limita, por si só, a tributação sobre tais tipos de renda pois, apesar de abranger alguns casos de redução fiscal em razão de estruturação de negócios internacionais, tal conceito não abrange todos os casos de treaty shopping, que devem ser tratados por meio de medidas específicas tal como GAAR, substance over form e similares. Nesse ponto, a versão atualizada de 2014 finaliza por dizer que as mudanças no conceito de beneficiário efetivo contidas em tal documento não prejudicam em nada o resultado do trabalho na Ação 6 (Prevenção de Abuso de Tratados Internacionais) do projeto sobre BEPS[82], sendo ambos autônomos entre si.

XI. Histórico da Desvirtualização do Termo “Beneficiário Efetivo” nos Acordos Internacionais Contra a Bitributação

É interessante atentar para os relatos históricos envolvidos no uso de “beneficiário efetivo” nos acordos internacionais contra a bitributação. A partir dessa análise é possível verificar que a inclusão desse termo nada mais foi do que um grande equívoco, à época, sendo desnecessário para o propósito original ao qual se prestou. Todavia, a desvirtualização do objetivo e escopo iniciais desse conceito até os dias de hoje dificulta que seu significado retorne à sua origem, tornando complexa e mais ampla as discussões envolvendo tal expressão no contexto de aplicação e interpretação dos acordos internacionais contra a bitributação.

De acordo com AVERY JONES[83], o Reino Unido foi o responsável por causar a atual incerteza sobre o significado de “beneficiário efetivo” ao sugerir sua inclusão pela OCDE em 1967. À época, a sugestão foi a de incluir uma cláusula de “subject to tax” ou, alternativamente, o requisito do beneficiário efetivo, caso o primeiro mecanismo (“subject to tax”) não fosse aprovado[84]. E isso é explicado em razão da peculiaridade da lei interna do Reino Unido vigente à época.

Com efeito, na CM-OCDE de 1977 o termo “beneficiário efetivo” acabou por ser originalmente utilizado pela referida organização internacional, mas, segundo o referido autor, naquele momento já não era mais necessário, para o Reino Unido, a inclusão do mencionado termo, em razão da alteração feita pela OCDE no que se refere à segunda frase[85] do Artigo 4(1) (Residentes) da CM (que foi incluída para tratar da questão dos diplomatas que, sem essa frase, poderiam deixar de ser tributados nos Estados ao qual estavam originalmente vinculados e, ao mesmo tempo, tributados de forma limitada no Estado onde estavam alocados, em razão da imunidade internacional que lhes é concedida).

Essa confusão pode ser atribuída à combinação de dois dispositivos da lei interna do Reino Unido, à época. O primeiro dispositivo legal dispunha que uma pessoa será tributada com relação à renda recebida ainda que não faça jus a tal renda (i.e., mesmo que tal renda pertença, juridicamente, a outra pessoa que não ela). Como exemplos sujeitos a tal norma têm-se os procuradores, agentes ou trustees. Portanto, um agente/procurador residente no Reino Unido estaria sujeito ao imposto de renda com base na lei interna em razão de sua residência fiscal e, assim, seria tributado sobre renda de fonte do Reino Unido (“domestic income”) recebida, ainda que não tivesse direito a essa renda (por pertencer a um terceiro a quem o agente/procurador estava representando).

Não importava, para esse fim, que a renda não pertencesse juridicamente ao agente/procurador residente no Reino Unido (mas sim ao outorgante não residente no Reino Unido), pois o agente/procurador era tributado pelo imposto de renda sobre a renda recebida (e não por ele pessoalmente auferida). Como bem observa AVERY JONES[86], esse dispositivo legal é extremamente não usual, senão único, sendo ausente nos demais sistemas tributários de outros países.

O segundo dizia o seguinte: um agente/procurador residente no Reino Unido, que estivesse representando um não residente, não estava sujeito a tributação se recebesse renda proveniente de fonte do exterior (“foreign income”). Todavia, sua redação era extremamente confusa.

O importante, em suma, é o efeito da interpretação de ambos os dispositivos da lei interna do Reino Unido vigentes em tal época, que pode ser assim sintetizado: um agente/procurador residente no Reino Unido estava sujeito ao imposto de renda porque ele seria tributado se ele recebesse renda proveniente de fonte inglesa (i.e., do Reino Unido), mas não estava sujeito à tributação com relação a renda proveniente de fonte do exterior[87].

Na ausência do que veio a ser, posteriormente, a segunda frase do Artigo 4(1) da CM-OCDE, se um acordo internacional contra a bitributação celebrado tivesse seguido a minuta de 1963, o residente de um terceiro Estado poderia, ao interpor um agente/procurador residente no Reino Unido, fazer uso dos benefícios dos acordos celebrados pelo Reino Unido para reduzir a tributação no Estado da Fonte (com o qual o Reino Unido celebrou o acordo), sem ter que pagar imposto de renda no Reino Unido. Vale ressaltar, ademais, que o mesmo entendimento mencionado para os agentes/procuradores em relação ao outorgante se aplicava para os trustees[88] em relação aos beneficiários do trust.

Na realidade, todos os acordos celebrados pelo Reino Unido, sem exceção, incluíam a cláusula de “subject to tax” para dividendos, juros e royalties (e, posteriormente, de beneficiário efetivo), o que leva a crer que isso não era um problema, mas o Reino Unido supostamente desejava essa menção no CM-OCDE para ter melhores argumentos de persuasão quando da negociação de acordos com outros países[89].

Quando a segunda frase do Artigo 4(1) da CM OCDE foi introduzida em 1977, redigida de forma voltada para “pessoa” e não “indivíduo” (que, originalmente, foi seu foco por tratar de diplomatas), o problema apontado pelo Reino Unido – decorrente de sua lei interna – desapareceu: o agente/procurador (ou trustee) residente no Reino Unido que estivesse recebendo rendimentos provenientes de fonte situada no exterior (foreign income) em nome de um outorgante (ou beneficiário) não residente, que somente era sujeito ao imposto de renda nos casos de rendimentos provenientes de fonte situada no Reino Unido (UK-source income), não era mais considerado como “residente” para fins dos acordos internacionais e, portanto, nenhum abuso das vantagens de tais acordos seria possível.

Essa foi a mesma época em que a expressão “beneficiário efetivo” foi introduzida na CM-OCDE. Todavia, para fins dos interesses do Reino Unido, o uso dessa expressão (beneficiário efetivo) no texto da CM-OCDE jamais fora necessário[90], já que quando nasceu já nasceu morto, em razão de ter sido absorvido pela inclusão da segunda frase do Artigo 4(1) no mesmo momento.

Confirmando esse entendimento, VANN[91] ressalta de forma clara que o termo “beneficiário efetivo” emergido no contexto dos acordos contra a bitributação, durante os anos 1960, tinha como propósito eliminar o auferimento de vantagens fiscais por parte de agentes e procuradores que recebiam rendimentos em nome de terceiros e, precisamente por tal motivo, existem boas razões para que ele se mantenha atrelado exclusivamente ao seu propósito original, notadamente excluir os custodiantes e pessoas em situações semelhantes da proteção dos tratados internacionais em nome próprio de tais pessoas. Sobretudo após o reconhecimento por parte da OCDE de que existem outras medidas mais específicas para lidar com as outras formas de treaty shopping e treaty abuse, deve-se evitar a confusão e os conflitos decorrentes da aplicação do significado não original da mencionada expressão.

Com base no referido estudo de AVERY JONES e de VANN, portanto, resta claro que a criação e utilização do termo “beneficiário efetivo” foi um equívoco histórico, pois jamais fora necessário para os objetivos originais ao qual se prestava para o Reino Unido. Essa desnecessidade culminou, paulatinamente com o passar dos anos e em função da vagueza e ausência de definição da referida expressão no texto da CM OCDE e de seus Comentários, em uma desvirtualização de seu propósito e significado, quando de sua criação. Isso fez com que o referido termo fosse sendo utilizado pelas Autoridades Fiscais e Tribunais de diversos países não apenas como uma medida de combate ao treaty shopping básico, mas também como uma “carta branca” – em alguns países – ao combate ao abuso de tratados em geral, o que certamente não foi seu intuito primordial, como aqui relatado.

É de se concluir que a grande confusão e discussão por trás do real significado de “beneficiário efetivo” nos acordos internacionais contra a bitributação poderiam ter sido evitadas. Contudo, uma vez lançada tal expressão na CM-OCDE e nos Comentários, ela – num efeito “bola de neve” – culminou por ganhar importância desproporcional e ter sua finalidade desviada por inúmeros precedentes no Direito Comparado, como em alguns aqui analisados, sendo tal conceito ainda substancialmente debatido – sem consenso – quase meio século após sua aparição inaugural no âmbito da OCDE, por iniciativa do Reino Unido. Hoje fica extremamente difícil para as Autoridades Fiscais apenas ignorá-lo, após tantos anos, por representar mais uma munição na suposta guerra contra o planejamento tributário abusivo, mesmo se a OCDE vier a excluir tal expressão futuramente da CM OCDE (uma vez que a maioria dos acordos internacionais individualmente celebrados pelos Estados contém e ainda conterá menção a tal termo).

Pessoalmente, entendemos que já está mais do que na hora de “limpar a bagunça” semântica e arrumar a confusão terminológica, mas o Fisco, os contribuintes, o Judiciário e a doutrina não parecem chegar a um consenso quanto ao significado que deve ser dado ao “beneficiário efetivo” dos acordos contra a bitributação, sendo que, uma transigência quanto ao seu significado poderá, ainda assim, representar um desvio do verdadeiro e original conceito, no contexto dos referidos acordos internacionais.

XII. Conclusões

O termo “beneficiário efetivo” incluído nos Artigos 10 (Dividendos), 11 (Juros) e 12 (Royalties) de um acordo internacional contra a bitributação é uma das condições necessárias para que as pessoas possam se beneficiar, isto é, fazer jus ao direito de usufruir alguns dos benefícios veiculados pelo acordo, especificamente para estes tipos de rendimentos. Caso o beneficiário efetivo não seja considerado um residente no outro Estado Contratante, o Estado da Fonte poderá tributar esses rendimentos de acordo com a sua lei interna, sem as limitações previstas no acordo contra a bitributação. Assim, o tema apresenta grande importância no cenário jurídico-econômico mundial, ao abranger matérias como a interpretação, aplicação e utilização indevida dos acordos contra a bitributação, i.e., “treaty shopping”.

Deve-se ressaltar que o tema também é extremamente relevante para o Brasil, visto que o termo beneficiário efetivo atualmente está presente em 24 dos 32 acordos internacionais contra a bitributação celebrados pelo Brasil atualmente vigentes, tendo sido primeiramente inserido no acordo com a Itália, em 1979[92]. O termo só não existe nos acordos celebrados com Argentina[93], Áustria[94], Dinamarca[95], Espanha[96], França[97], Japão[98], Luxemburgo[99] e Suécia[100].

Segundo a maior parte da doutrina especializada o termo “beneficiário efetivo” deve ter um significado adstrito aos acordos contra a bitributação, i.e., deve ser um treaty concept e não um conceito definido por leis internas, não se admitindo a remissão ao direito interno prevista no Artigo 3(2) da CM-OCDE, posição esta com a qual concordamos, em razão do “international fiscal meaning” inerente a tal expressão, historicamente comprovado.

Os Comentários aos Artigos 10, 11 e 12 da CM-OCDE, deixam claro que agentes, mandatários e conduit companies agindo como fiduciárias ou administradores não são considerados como o beneficiário efetivo de dividendos, juros e royalties, haja vista que possuem apenas poderes restritos sobre a propriedade, agindo em nome de outrem (um terceiro) e não em nome próprio.

Em nossa opinião, o termo beneficiário efetivo faz parte da linguagem fiscal internacional, refutando qualquer remissão ao direito interno por meio do Artigo 3(2) da CM-OCDE para sua definição. É, pois, um conceito internacionalizado derivado do seu próprio contexto. Para nós, o beneficiário efetivo é a pessoa que detém a parte substancial dos atributos dos direitos de propriedade, quando comparada à outra pessoa que também possua algum desses atributos, a ponto de ser a titular jurídica da renda auferida em virtude de a renda ter sido agregada ao seu patrimônio próprio, conferindo autonomia para essa pessoa decidir o que fazer com a renda percebida. Rejeitamos, assim, o critério econômico na interpretação do termo.

Entendemos, portanto, que o beneficiário efetivo dos acordos, em nossas palavras, é: um conceito jurídico (e não econômico) de atribuição de renda (e não de abuso de acordos contra a bitributação), definido por linguagem fiscal internacional (e não por remissão à lei interna dos Estados Contratantes), cuja aplicabilidade é restrita ao combate do treaty shopping específico (e não geral) envolvendo exclusivamente rendimentos decorrentes de dividendos, juros e royalties (e não todos os tipos de renda), podendo ser utilizado apenas em casos de referência expressa no texto do acordo (e não implicitamente por força de princípio geral internacional).

Assim, partilhamos da opinião de que o conceito de “beneficiário efetivo” é um meio de eficácia limitada na prevenção da evasão fiscal internacional; estender tal conceito a qualquer estrutura internacional envolvendo os acordos internacionais de forma irrestrita como uma medida genérica anti-abuso – como alguns Estados vêm fazendo – é inaceitável, consistindo em patente desvio de conduta das administrações tributárias. Nesse contexto é que as cláusulas de limitação de benefícios ou cláusulas LOB ganham importância, notadamente nos moldes do Artigo 22 do Modelo EUA, também mencionadas nos Comentários da CM-OCDE ao Artigo 1º. Este dispositivo teve por objetivo incluir, nos acordos internacionais contra a bitributação, condições mínimas para que apenas as pessoas que tivessem um propósito negocial real pudessem fazer jus aos benefícios de um acordo. Essas condições são exigidas e verificadas por de testes objetivos, reduzindo o subjetivismo na apreciação de eventual existência de abuso dos acordos, o que é louvável para fins de segurança jurídica na aplicação destes instrumentos internacionais.

Em conclusão, o conceito de beneficiário efetivo dos acordos contra a bitributação é, certamente, um dos temas mais importantes no atual momento do planejamento tributário internacional, por mesclar o requisito de substância das entidades intermediárias, sociedades holding e pessoas envolvidas na estruturação de negócios envolvendo duas ou mais jurisdições, com os limites e alcance da legitimidade da economia lícita de tributos sem que os Estados Soberanos envolvidos possam arguir abuso dos contribuintes em tal comportamento. Portanto, o significado do termo “beneficiário efetivo” nos acordos internacionais contra a bitributação está intrinsecamente ligado com o treaty shopping, não podendo ser estendido para o treaty abuse, e sua compreensão, no cenário mundial pós-BEPS, é mandatória para a organização e implementação de praticamente todo e qualquer planejamento tributário internacional na atualidade.

Publicação original: Direito Tributário Internacional: Homenagem ao Prof. Alberto Xavier. 1 ed.São Paulo: Quartier Latin, 2016, v.1, p. 365-398.


[1] Para um detido e completo estudo sobre o tema, vide nosso livro: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. Planejamento Tributário Internacional: Conceito de Beneficiário Efetivo nos Acordos Contra a Bitributação. São Paulo: Quartier Latin, 2015.

[2]JONES, John F. Avery et al. The origins of concepts and expressions Used in the OECD Model and their Adoption by States. Bulletin – Tax Treaty Monitor, Amsterdam, p. 249, June 2006.

[3]RUSSO, Raffaele. Fundamentals of international tax planning. Amsterdam: IBFD, 2007. p. 229.

[4]Cf. VOGEL, Klaus. Klaus Vogel on double taxation conventions: a commentary to the OECD, UN and US model conventions for the avoidance of double taxation of income and capital with particular reference to German treaty practice, 3rd ed. Boston: Kluwer Law International, 1997, p. 561; TOIT, Charl P. du. Beneficial ownership of royalties in bilateral tax treaties. Amsterdam: IBFD, 1999, p. 146.

[5]Comentários da OCDE ao Artigo 10(2), item 12; Artigo 11(2), item 9; Artigo 12(1), item 4 (Cf. RAAD, Kees van. Materials on international & EC tax law: 2009-2010, cit., p. 215; 244; 257).

[6]RUSSO, Raffaele. op. cit., p. 229.

[7]UK-US treaty on estates of deceased persons (1945).

[8]OLIVER, J. David B.; LIBIN, Jerome B.; WEEGHEL, Stef van; TOIT, Charl P. du. Beneficial ownership. Bulletin – International Bureau of Fiscal Documentation, Amsterdam, n. 7, p. 311, July 2000.

[9]VOGEL, Klaus (Chair). The OECD Model Convention – 1998 and Beyond; The Concept of Beneficial Ownership in Tax Treaties – Proceedings of a Seminar held in London, in 1998 during the 52nd Congress of the International Fiscal Association. The Hague: Kluwer Law International, 2000. v. 23a, p. 21.

[10]VOGEL, Klaus. Klaus Vogel on double taxation conventions. cit., p. 561-562.

[11]RUSSO, Raffaele. op. cit., p. 229.

[12]IBFD. International Tax Glossary. Ed. Susan M. Lyons, 2 ed. Amsterdam, 1992, p. 260.

[13]Comentários da OCDE ao parágrafo 2 do Artigo 10, item 12, à Convenção Modelo OCDE de 1977.

[14]Cf. OECD, Double Taxation Conventions and the use of conduit companies. International Tax Avoidance and Evasion: four related studies. Paris: OECD, 1987.

[15] Cf. RAAD, Kees van. Materials on international & EC tax law: 2009-2010, cit., p. 216.

[16] Id.

[17]OECD Double Tax Conventions and the Use of Conduit Companies, paragraph 14(b), Paris, 1986.

[18]LUKOFF, Frederick L. dividend, interest, royalties: the ‘beneficial ownership’ change in the 1974 amendments to the OECD Draft Convention. Taxes – The Tax Magazine, n. 8, p. 566, 1977.

[19] Sobre a natureza jurídica dos Comentários à CM OCDE vide nosso estudo específico em: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. Importância dos Comentários à Convenção Modelo da OCDE na Interpretação dos Acordos Internacionais contra a Bitributação Celebrados pelo Brasil In: AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do. Tratados Internacionais na Ordem Jurídica Brasileira. 2 ed. São Paulo: LEX, 2014, pp. 277-292.

[20]Comentários da OCDE ao parágrafo 2 do Artigo 10, item 12 (Cf. RAAD, Kees van. Materials on international & EC tax law: 2009-2010, cit., p. 215).

[21]Comentários da OCDE ao parágrafo 2 do Artigo 11, item 9 (Cf. Id. Ibid., p. 244).

[22]Comentários da OCDE ao parágrafo 1 do Artigo 12, item 4 (Cf. Id. Ibid., p. 257).

[23]OCDE: Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património. Versão condensada. Comité dos Assuntos fiscais da OCDE. Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Coimbra,n. 197, 2005, p. 230.

[24]OCDE: Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património. Versão condensada, cit., p. 230.

[25]No mesmo sentido os Comentários da OCDE ao parágrafo 2 do Artigo 11, item 8 e ao parágrafo 1 do Artigo 12, item 4 (Id. Ibid., p. 265 e 282).

[26]Id. Ibid., p. 230.

[27]Comentários da OCDE ao parágrafo 2 do Artigo 10, item 12.1 (OCDE: Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património. Versão condensada, cit., p. 230).

[28]Comentários da OCDE ao parágrafo 2 do Artigo 10, item 12.2 (Id. Ibid., p. 231).

[29]TOIT, Charl P. du. op. cit., p. 146-147.

[30]Cf. WALSER, J. In: VOGEL, Klaus (Chair). The OECD Model Convention – 1998 and Beyond; The Concept of Beneficial Ownership in Tax Treaties – Proceedings of a Seminar held in London, in 1998 during the 52nd Congress of the International Fiscal Association. The Hague: Kluwer Law International, 2000. v. 23a, p. 16.

[31]Cf. WALSER, J. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 16-17.

[32]Wiman. In: VOGEL, Klaus (Chair). cit. v. 23a, p. 18.

[33]Gouthière. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 18.

[34]Id. Ibid., p. 18.

[35]Id. Ibid., p. 19.

[36]Id. Ibid., p. 19.

[37]Sobre o tema treaty override vide a obra em português de ROCHA, Sérgio André. Treaty override no ordenamento jurídico brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2007.

[38]Lüthi. In: VOGEL, Klaus (Chair). The OECD Model Convention – 1998 and Beyond; The Concept of Beneficial Ownership in Tax Treaties – Proceedings of a Seminar held in London, in 1998 during the 52nd Congress of the International Fiscal Association. The Hague: Kluwer Law International, 2000. v. 23a. p. 20.

[39]Gouthière. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 20.

[40]Mooij. In: VOGEL, Klaus (Chair). The OECD Model Convention – 1998 and Beyond; The Concept of Beneficial Ownership in Tax Treaties – Proceedings of a Seminar held in London, in 1998 during the 52nd Congress of the International Fiscal Association. The Hague: Kluwer Law International, 2000. v. 23a. p. 20.

[41]WALSER, J. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 26.

[42]Por exemplo, o caso francês Royal Bank of Scotland, 283314 Conseil d’Etat, Section du contentieux, 3 e 8 sous-sections réunies, 29.12.2006.

[43]Posição adotada pela Coroa canadense no caso Prévost Car Inc. v. Her Majesty the Queen, 2008 T.C.C. 231, 22 de abril de 2008. Para um exame mais detalhado da decisão vide nosso estudo em: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. Caso Prevost: Planejamento Tributário Internacional e o Conceito de Beneficiário Efetivo dos Dividendos pagos a Holding Holandesa, nos termos do Tratado Canada-Holanda In: CASTRO, Leonardo Freitasa de Moraes e (org.). Tributação Internacional: Análise de Casos. vol. 1. Sao Paulo: MP Editora, 2010, p. 221-246.

[44]Para diferentes posições sobre o conceito de treaty shopping e treaty abuse vide: BAMMENS, Niels; DE BROE, Luc. Treaty shopping and avoidance of abuse. In: LANG, Michael et al. (Ed.). Tax treaties: building bridges between law and economics. Amsterdam: IBFD, 2010, p. 69 e ss; DE BROE, Luc. International tax planning and prevention of abuse. Amsterdam: IBFD, 2008. p. 667-695. (Doctoral Series, 14); WEEGHEL, Stef van. The improper use of tax treaties: with particular reference to the Netherlands and the United States. London: Kluwer Law International, 1998. (Series of International Taxation n. 19), p. 258 e ss.

[45]Cf. Gouthière. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 26.

[46]Sobre o tema vide: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. “Análise da aplicação da teoria do substance over form aos planejamentos tributários no Brasil”. Revista de Direito Tributário da APET, vol. 22, 2009, pp.35-56.

[47]TÔRRES, Heleno Taveira. Direito tributário e direito privado: autonomia privada, simulação e elusão tributária, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2003, p. 253.

[48]GRECO, Marco Aurélio. Planejamento fiscal e interpretação da lei tributária. São Paulo: Dialética, 1998. p. 136 e ss.

[49]VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 26.

[50]Essa medida anti-abuso presente no acordo França-Suíça visa, expressamente, prevenir que uma sociedade seja interposta entre a Suíça e a fonte francesa dos rendimentos. Essa sociedade interposta não tem direito aos benefícios do acordo França-Suíça. Medida semelhante existe no acordo França-EUA (VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 26).

[51]Cf. Gouthière. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 26.

[52]Id. Ibid., p. 26.

[53]Cf. Id. Ibid., p. 26.

[54]ZORNOZA, Juan José; BÁEZ, Andrés. The 2003 revisions to the commentary to the OECD on tax treaties and GAARs: a mistaken starting point. In: LANG, Michael et al. (Ed.). Tax treaties: building bridges between law and economics. Amsterdam, IBFD, 2010, p. 132-135.

[55]Id. Ibid., p. 30.

[56]Id. Ibid., p. 26.

[57]VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 29-30.

[58] Vide CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. “Inadimplemento da obrigação tributária na composição do preço predatório e sua relação com a livre concorrência”. Direito Tributário Atual, n. 22, p. 235-256, 2008.

[59]VOGEL, Klaus (Chair). p. cit., p. 29-30.

[60]TAVOLARO, Agostinho Toffoli. Beneficiário efetivo. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, n. 52, 2003, p. 21.

[61] JIMÉNEZ, Adolfo Martín. Beneficial ownership: current trends. World Tax Journal, Amsterdam, n. 2. 2010, p. 35-36.

[62]BAKER, Philip. Double tax conventions, London: Sweet & Maxwell, 2002, 10B-10.4.

[63]Comentários da OCDE ao Artigo 10, parágrafo 2, item 12.1,

[64]OECD Report. The Application of the OECD MC to Partnerships. Paris: OECD, 1999. Parag. 54.

[65]MARTÍN JIMÉNEZ, Adolfo. Domestic anti-abuse rules and double taxation treaties (Part I). Bulletin of International Fiscal Documentation, v. 56, n.11, p. 542-553, 2002; e também: Domestic anti-abuse rules and double taxation treaties (Part II). Bulletin of International Fiscal Documentation, v. 56, n. 12, p. 620-627, 2002.

[66]BAKER, Philip. Report Possible Extension of Beneficial Ownership Concept. Fourth Session of the UN Economic and Social Council, Committee of Experts on International Cooperation in Tax Matters, Geneva, 20-24 October 2008, p. 482.

[67] CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. “Cláusulas de Limitações de Benefícios (LOB Clauses) – Exame Comparativo entre Modelo Norte-Americano de Tratados, Convenção Modelo OCDE e Acordos Internacionais Contra a Bitributação Celebrados pelo Brasil”. Revista Fórum de Direito Tributário, vol. 61, 2013, pp.125–155.

[68]WALSER, J. In: VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 30-31.

[69]VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 31.

[70]Id. Ibid., p. 313.

[71]TAVOLARO, Agostinho Toffoli. Beneficiário efetivo, cit., p. 17.

[72]CATÃO, Marcos André Vinhas. A “cláusula de beneficiário efetivo”: limite de sua aplicação. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito internacional tributário aplicado. São Paulo, Quartier Latin, 2004. v. 2, p. 430.

[73]VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 32.

[74]Cf. VOGEL, Klaus. Klaus Vogel on double taxation conventions, cit., p. 313.

[75]Cf. WEEGHEL, Stef van. op. cit., p. 313.

[76]VOGEL, Klaus (Chair). op. cit., p. 31

[77]Cf. Note by the Coordinator of the Subcommittee on Improper Use of treaties: proposed amendments, Committee of Experts on International Tax Matters, Fourth Session, Geneva, 20-24 October 2008, E/C. 18/2008/CRP 2/Add.1.

[78]BAKER, Philip. Report Possible Extension of Beneficial Ownership Concept, cit., p. 9 e ss.

[79]OECD, Clarification of the Meaning of “Beneficial Owner” in the OECD Model Tax Convention Discussion Draft (OECD 2011). International Organizations’ Documentation IBFD, at Para. 12.1, p. 3. Disponível em: <www.oecd.org/dataoecd/49/35/47643872.pdf>. Acesso em: 17 nov. 2011.

[80]OECD, Clarification of the Meaning of “Beneficial Owner” in the OECD Model Tax Convention Discussion Draft (OECD 2011), cit., p. 4.

[81] Disponível em: http://www.oecd.org/ctp/treaties/2014-update-model-tax-convention.htm.

[82] OECD: Public Discussion Draft on BEPS Action 6: Preventing The Granting Of Treaty Benefits In Inappropriate Circumstances, 14 March 2014 – 9 April 2014.

Disponível em: http://www.oecd.org/ctp/treaties/treaty-abuse-discussion-draft-march-2014.pdf.

[83] AVERY JONES, John F. “The Beneficial Ownership Concept was Never Necessary in the Model”. In In: LANG, Michael; PISTONE, Pasquale; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus; STORCK, Alfred. Beneficial Onwerhisp: Recent Trends. Amsterdam: IBFD, 2013, p. 333.

[84] Importante observar que o pensamento inicial do Reino Unido foi o de utilizar o termo “beneficiário efetivo” para alcançar o objetivo semelhante ao uso da cláusula de “subject to tax”. Nesse ponto, o memorando enviado pelo Reino Unido para os EUA durante as negociações do acordo contra a bitributação entre tais países em 1945 mencionava que “atenção deve ser dada, evidentemente, para o caso do beneficiário efetivo das ações etc. quando o acionista nominal etc. não é o beneficiário efetivo” (UK National Archives IR63/167, p. 510 apud AVERY JONES, John F. “The Beneficial Ownership Concept was Never Necessary in the Model”, cit., p. 334). Contudo, o referido acordo internacional já possuía a cláusula de “subject to tax”. A partir de então, o Reino Unido passou a utilizar a cláusula “subject to tax” até 1966 em seus acordos, trocando para o uso do termo “beneficiário efetivo” daquele ano em diante. O primeiro exemplo foi justamente o Protocolo ao acordo internacional contra a bitributação entre Reino Unido e EUA celebrado em 1966.

[85]Artigo 4 – Residente

1. (…). Todavia, esta expressão não inclui qualquer pessoa que está sujeita a imposto nesse Estado apenas relativamente ao rendimento de fontes localizadas nesse Estado ou a patrimônio aí situado”. (Tradução livre).

[86] Idem, cit., p. 336.

[87] AVERY JONES, John F. “The Beneficial Ownership Concept was Never Necessary in the Model”, cit., p. 338.

[88] Isto é, o trustee residente no Reino Unido estava sujeito ao imposto de renda sobre os rendimentos recebidos de fonte situada no Reino Unido, mas não de fonte situada no exterior.

[89] AVERY JONES, John F. “The Beneficial Ownership Concept was Never Necessary in the Model”, cit., p. 338.

[90] Idem, p. 339.

[91] VANN, Richard. Beneficial Ownership: “What Does History (and Maybe Policy) Tell Us”. In: LANG, Michael; PISTONE, Pasquale; SCHUCH, Josef; STARINGER, Claus; STORCK, Alfred. Beneficial Onwerhisp: Recent Trends. Amsterdam: IBFD, 2013, p. 306.

[92] Decreto nº 85.985, de 6 de maio de 1981.

[93] Decreto nº 87.976, de 22 de Dezembro de 1982.

[94] Decreto nº 78.107, de 22 de julho de 1976.

[95] Decreto nº 75.106, de 20 de dezembro de 1974.

[96] Decreto nº 76.975, de 2 de Janeiro de 1976.

[97] Decreto nº 70.506, de 12 de maio de 1972.

[98] Decreto nº 61.899, de 14 de dezembro de 1967.

[99] Decreto  nº 85.051, de 18 de Agosto de 1980.

[100] Decreto nº 77.053, de 19 de Janeiro de 1976.

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