Publicado originalmente em março/2018, por Matheus Bueno de Oliveira e Katherine Borges Sato
No dia 22 de fevereiro, o Superior Tribunal de Justiça finalizou o tão esperado julgamento do Recurso Especial nº 1.221.170, por meio do qual se discutia os tipos de insumos que poderiam dar ensejo à apuração de créditos de PIS e COFINS na sistemática não-cumulativa, estabelecida pelas Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003.
A discussão acima vem sendo travada desde a edição das Instruções Normativas SRF nº 247/2002 e 404/2004, nas quais a Receita Federal passou a restringir o conceito de insumo para fins de creditamento das respectivas contribuições sociais, equiparando-o a todo e qualquer bem ou serviço que estivesse direta/fisicamente vinculado ao produto final (mesmo conceito estabelecido pela legislação do IPI e do ICMS).
Os contribuintes discordavam dessa tese por entender que o conceito acima não se coadunava com a sistemática não-cumulativa do PIS e da COFINS. Mais do que direta ou fisicamente vinculados ao produto, defendeu-se, deveriam ser entendidos como os insumos todo bem ou serviço que se repute essencial e necessário para a produção dos bens ou serviços da empresa (interpretação intermediária), ou mesmo todos os custos e despesas incorridos para a realização de sua atividade-fim, nos moldes definidos pela legislação do IRPJ (interpretação mais “ampla” do conceito de insumo).
No caso julgado pelo STJ, discutia-se a possibilidade de uma empresa produtora de ração animal apurar créditos de PIS/COFINS sobre os gastos com água, luz, combustíveis, lubrificantes, exames de laboratório, materiais de limpeza e equipamentos de proteção.
Após intensos debates, as duas primeiras turmas do STJ acabaram adotando uma interpretação intermediária para a definição do conceito de insumo.
Por maioria de votos, os Ministros acordaram que seria imprescindível, para a definição do conceito de insumo, considerar a “essencialidade” e a “relevância” de determinado item, bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. Ou seja, adotou-se conceito muito mais amplo do que aquele considerado pelo Fisco Federal.
Como resultado, o STJ reconheceu a ilegalidade dos dispositivos das Instruções Normativas SRF nº 247/2002 e 404/2004 que restringiam o conceito de insumo, por entender que os mesmos comprometeriam a eficiência da sistemática não-cumulativa do PIS/COFINS, tal como definido nas Leis nº 10.637/02 e 10.833/03).
Cautelosamente, deve-se aguardar a formalização do acórdão para que se possa melhor compreender o alcance do julgado. Afinal, “essencial” e “relevante”, embora usados como sinônimos na sessão de julgamento, são adjetivos não necessariamente equivalentes. De qualquer forma, a decisão acima certamente representa uma importante vitória para os contribuintes, considerando a extrema limitação do que a Receita Federal vinha aceitando como creditável. Com base no entendimento firmado, os contribuintes poderão não apenas passar a apurar montantes maiores de créditos, como também reaver os valores das contribuições que foram indevidamente recolhidos no passado, o que poderia ser feito por meio do reconhecimento extemporâneo dos respectivos créditos (sem a sua atualização pela taxa SELIC), ou a retificação das declarações passadas para a apuração de créditos de pagamento indevido de PIS/COFINS (atualizados pela SELIC e compensáveis com outros tributos federais).
Considerando que a decisão foi proferida em sede de recurso repetitivo, deverá ser obrigatoriamente observada pelos demais Tribunais do país (mesmo que o respectivo acórdão ainda não tenha sido publicado).
Tal decisão, inclusive, já vem sendo mencionada em processos existentes perante o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), o qual no tema também tem consolidado entendimento menos restritivo que o da Receita Federal.
Vale destacar que a decisão do STJ não afasta a necessidade de verificação, em cada caso concreto, do efetivo enquadramento como insumo dos itens, bens ou serviços utilizados pelos contribuintes. Em outras palavras, deverá o contribuinte ainda se desincumbir da obrigação de demonstrar, por meio de documentos, quais gastos se mostram efetivamente essenciais e necessários para o desenvolvimento de sua atividade econômica.
Considerando o alegado alto impacto que da decisão do STJ sobre o orçamento da arrecadação federal (estimados em 50 milhões de reais[1]), juntamente com a decisão proferida ano passado pelo STF a respeito da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS, é de se esperar que o Governo Federal impulsione as negociações para a realização de reformas na legislação que regulamenta o cálculo e a cobrança das respectivas contribuições sociais (ex. alargamento das hipóteses que ensejam a apuração de créditos do tributo).
[1] https://www.conjur.com.br/dl/anexo-risco-fiscal-ldo-2017.pdf