por Matheus Bueno
Direto ao ponto: A reforma tributária em curso no Brasil vai impactar a rentabilidade de todos os negócios, ainda que sua transição seja longa. O momento de agir é agora, especialmente na redação de contratos comerciais. Ignorar a convivência entre os regimes atuais e os novos tributos até 2033 é deixar espaço para disputas futuras. Em síntese, é melhor antecipar e alinhar expectativas com cláusulas claras do que se ver envolvido em litígios onerosos e rupturas comerciais.
Impactos inevitáveis nos contratos de longo prazo
Apesar de contar com um cronograma de transição que se estende até 2033, a reforma tributária brasileira já impõe a necessidade de reavaliação nos modelos de precificação e estruturação contratual. Os negócios, em especial aqueles com contratos de longo prazo — como ocorre no setor do agronegócio, por exemplo, em que safras são frequentemente negociadas com anos de antecedência —, não estão imunes às mudanças. Pelo contrário, estão entre os mais expostos a riscos financeiros decorrentes da alteração no sistema tributário.
A coexistência dos tributos atuais (PIS, COFINS, ICMS, ISS, entre outros) com os novos (CBS e IBS) durante a fase de transição criará uma complexidade fiscal adicional. As alíquotas efetivas — ou seja, a carga real de tributos — passarão a flutuar à medida que os novos tributos substituem os antigos de forma escalonada. Essa dualidade trará repercussões relevantes na rentabilidade das operações e nos preços praticados. Logo, a precificação adotada nos contratos deve, desde já, considerar o impacto combinado dos dois regimes tributários.
Um cuidado básico, porém, essencial, é prever cláusulas contratuais que vinculem o preço negociado à carga tributária atualmente incidente nas receitas do vendedor (justamente a taxa que se levou em conta na precificação). Em outras palavras, deve-se registrar expressamente que o valor pactuado parte da premissa da carga tributária vigente. Caso esta seja majorada por conta da implementação dos novos tributos, o contrato deve prever a possibilidade automática de reajuste a favor do vendedor.
A redação dessa cláusula deve ser técnica e estratégica: sua função é proteger o vendedor em caso de aumento da carga sobre as saídas, sem abrir margem para reduções automáticas em benefício do comprador, caso ocorra o oposto. Ainda que essa condição esteja sujeita a negociação, a versão inicial da cláusula deve refletir o melhor interesse de quem a propõe.
Além disso, recomenda-se fortemente que a cláusula evite qualquer condicionamento à verificação de efeitos econômicos sobre o comprador. Primeiramente, porque as regras de creditamento dos novos tributos ainda não estão completamente definidas ou testadas. Em segundo lugar, porque submeter o reajuste a esse tipo de análise abriria espaço para renegociações complexas e litígios sobre o impacto real da tributação — exatamente o cenário que se pretende evitar.
De outro lado, as empresas devem avaliar seus contratos de compra atuais e futuros para realizar o pensamento do lado oposto, mas sob a mesma lógica, perguntando-se: há algo na redação que impacte o direito futuro de tomada de créditos e o custo da transação? Os defensores da reforma tributária são ligeiros em sugerir que a reforma traz apenas um positivo e supostamente onipresente creditamento amplo, que magicamente resolveria eventuais divergências entre compradores e vendedores, mas apenas quem gere um negócio e se preocupa para a prática além dos princípios teóricos sabe da distância de uma presunção dessa magnitude para a realidade competitiva do mercado.
Por fim, os contratos firmados sem essa devida cautela impõem às partes um risco futuro elevado. O desequilíbrio contratual gerado por mudanças tributárias poderá se tornar um campo fértil para disputas judiciais, com jurisprudência ainda incerta sobre o uso de alterações tributárias como fundamento para repactuação. Hoje, os precedentes existentes estão distantes da lógica e das especificidades da nova reforma do consumo.
Direto ao ponto: A reforma tributária afetará todos os negócios, inclusive os de longo prazo. A convivência de regimes e a oscilação de alíquotas exigem cláusulas contratuais inteligentes e protetivas. Antecipar-se com uma lógica contratual alinhada ao espírito da negociação é o melhor caminho para preservar a segurança jurídica, a margem do negócio e a relação entre parceiros comerciais. Esperar para reagir pode custar caro — e, em muitos casos, ser tarde demais.