Direto ao ponto: nos termos em que previsto no PLP 68/2024, os benefícios fiscais de ICMS extintos pela Reforma Tributária serão compensados com recursos do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais (FCBF). Como veremos a seguir, porém, o procedimento de compensação previsto no PLP, além de comprometer fluxo de caixa, traz insegurança e novas burocracias aos contribuintes.
Com o advento da Reforma Tributária e a substituição do ICMS pelo IBS, há previsão de extinção dos diversos benefícios fiscais de ICMS concedidos aos contribuintes. A fim de compensar, portanto, a perda sofrida por aqueles, foi criado o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais (FCBF).
Serão contempladas pela compensação, as pessoas físicas e jurídicas titulares de benefícios onerosos de ICMS: isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais, por prazo certo e determinado.
À primeira vista, a criação do FCBF parecia ser uma boa notícia, uma vez que garantiria a segurança jurídica das relações estabelecidas e já sacramentadas entre contribuintes e Estados. No entanto, a regulamentação do Fundo prevê que a concessão (ou não) dos créditos aos contribuintes dependerá de análise discricionária da Receita Federal do Brasil.
O FCBF nasce, então, como garantidor das relações jurídico-tributárias entre Fisco e contribuintes, passando a ser mais uma das tantas fontes de insegurança nas quais já estão mergulhadas essas relações.
De acordo com o PLP 68/2024, caberá à Receita Federal do Brasil o papel central na administração do FCBF, com competência para expedir normas complementares, estabelecer procedimentos de habilitação, analisar requerimentos, processar e revisar as apurações de crédito, denegando-os ou concedendo-os.
Para que estejam aptos ao pleito compensatório, os contribuintes terão de realizar o procedimento de habilitação, entre o início de 2026 e o final de 2028, além de cumprir uma série de requisitos, dentre eles:
- concessão do benefício até 31.05.2023, sem prejuízo de ulteriores prorrogações ou renovações, cujo prazo de fruição não ultrapasse a data de 31.12.2032, e que esteja vigorando entre os anos de 2029 e 2032;
- ser titular do benefício fiscal de ICMS, oneroso e concedido por prazo certo e determinado, cujas condições e contrapartidas a serem prestadas pelo contribuinte estejam expressamente previstas no ato concessório;
- comprovação do cumprimento daquelas condições e contrapartidas fixadas no ato concessório;
- manutenção de escrituração fiscal regular;
- comprovação de inexistência de impedimento legal à fruição de benefícios fiscais;
- manutenção de situação cadastral regular.
Deferida a habilitação junto ao Fundo, o contribuinte deverá informar mensalmente, em sua escrituração fiscal, os elementos necessários para a quantificação da repercussão econômica de cada benefício, conforme regulamentação a ser expedida pela RFB. A repercussão econômica do benefício fiscal e o nível de redução desse benefício são fatores que serão utilizados para o cálculo dos créditos aos quais farão jus os contribuintes afetados.
Transmitida a escrituração fiscal pelo contribuinte habilitado junto ao Fundo, é de 1 (um) ano o prazo para que ele requeira os créditos a que fizer jus, sob pena de prescrição do seu direito.
Como dito, caberá à RFB processar os requerimentos dos contribuintes, homologando ou não o cálculo dos créditos apresentados, dentro do prazo de 90 (noventa) dias, contados da transmissão da escrituração fiscal. Autorizado o crédito pela RFB, o seu pagamento ocorrerá em até 60 (sessenta) dias.
Já na hipótese de existir indícios de irregularidade na apuração de créditos pelo contribuinte, terá início processo de revisão pela Fazenda, cujo prazo de análise é de 360 (trezentos e sessenta) dias.
Os processos administrativos decorrentes de eventuais impugnações contra negativas de habilitação e/ou créditos serão regidos pela Lei nº 9.784/99 e julgados pela própria Receita Federal do Brasil.
Essa breve síntese do processo de habilitação e compensação dos contribuintes pelo Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais de ICMS, instituído pelo Projeto de Lei Complementar nº 68/2024, tem por objetivo demonstrar a burocracia e (in)segurança impostas pelo legislador, visto que:
- concede um perigoso poder centralizador à Receita Federal que deterá competência para regulamentar, analisar, negar ou conceder habilitação e créditos, bem como julgar eventuais recursos interpostos pelos contribuintes;
- o complexo procedimento compensatório certamente comprometerá o fluxo de caixa dos contribuintes, severamente afetados pelo fim dos benefícios fiscais de ICMS, pois a RFB terá o prazo de 90 (noventa) dias para análise dos pedidos de créditos, somados aos 60 (sessenta) dias para o seu pagamento, alcançando facilmente 5 (cinco) meses para o recebimento dos créditos;
- o prazo prescricional de 1 (um) ano para o contribuinte requerer seus créditos compensatórios junto à RFB reduz sobremaneira o prazo de prescrição de 5 (cinco) anos assegurado pelo Código Tributário Nacional.
De outro lado, vale ressaltar que benefícios fiscais concedidos sob condição onerosa e por prazo certo pautam-se, especialmente, na segurança jurídica e confiança mútua entre contribuinte e Fisco. Os Estados renunciam à receitas de ICMS, dada a garantia da realização de contrapartidas pelos contribuintes e os contribuintes fazem investimentos relevantes para atendimentos das contrapartidas que lhes foram impostas, dada a garantia de recuperação financeira através dos benefícios fiscais.
Uma vez que há, em função da Reforma Tributária, o rompimento dessa relação que fixava direitos e obrigações entre Fisco e contribuintes, os recursos do FCBF deveriam servir como espécie de indenização às empresas pelos investimentos de grande monta realizados, como implantação e ampliação de empreendimento econômico, geração de novos empregos e a limitação no preço de venda, reduzindo-se o grau de discricionariedade da Receita Federal do Brasil quanto ao seu deferimento (ou não).
Agora, mais do que nunca, o investimento em assessores externos é imprescindível para dimensionar corretamente o que fazer e quando fazer. Líderes preparados para tomar as decisões corretas e antecipar os futuros cenários de ação são essenciais diante dessa reforma tributária do consumo que deve ser aprovada ainda neste mês. Essas ações podem significar maximizar ganhos e minimizar perdas para qualquer negócio, o que será diferencial para manutenção da saúde financeira das empresas.