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O retorno do voto de qualidade é mesmo ruim?

Direito ao ponto: são tantas as benesses trazidas pelo Projeto de Lei 2.384/2023 que perder um caso no CARF, pelo voto de qualidade, especialmente quando há dúvidas de seu destino no Judiciário, pode ser uma tremenda vantagem para o contribuinte.

No final do primeiro semestre desse ano, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2.384/2023 que deveria ter impacto apenas sobre o contencioso administrativo fiscal, em âmbito federal, no processo de fiscalização e arrecadação de tributos. Porém, foi anunciado como “de grande impacto na economia”.

Isso porque o projeto de lei não apenas dá ao representante da Fazenda Nacional o voto de desempate no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), como também incorpora parte do acordo celebrado entre a Fazenda Nacional e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre o tema, prevendo benesses aos contribuintes que saírem perdedores no CARF pelo voto de qualidade.

Certamente, se aprovado pelo Senado esse projeto de lei, tal qual aprovado pela Câmara, uma boa parcela dos contribuintes terá razões suficientes para encherem os cofres públicos com o pagamento de tributos, especialmente daqueles cujas chances de discussão no Judiciário não lhes sejam tão favoráveis ou incertas.

Dentre referidas benesses concedidas, destacamos:

  • A exclusão de multas (de mora e de ofício);
  • A exclusão de juros, caso a matéria não seja judicializada e paga dentro do prazo de 90 (noventa) dias a contar da decisão;
  • O parcelamento do valor remanescente (montante principal do crédito tributário) em 12 parcelas iguais e sucessivas, corrigidas pela SELIC;
  • O cancelamento da representação fiscal para fins penais;
  • A possibilidade de uso de créditos de prejuízo fiscal, de base de cálculo negativa da CSLL do sujeito passivo ou de controladora ou controlada, bem como de precatórios próprios ou de terceiros para quitação do montante principal do crédito tributário;
  • Possibilidade de o contribuinte apresentar sua proposta de transação tributária individual ao Fisco, a depender de sua capacidade econômico-financeira para pagamento.

Trata-se de regras tão vantajosas que chegam a ser quase um incentivo ao litígio administrativo e a outras práticas que estavam mais adormecidas como as incorporações para aproveitamento de prejuízo fiscal e a compra e venda de precatórios.

Veja que ao contribuinte que deixou de pagar um tributo, foi autuado, percorreu toda via administrativa e, ao final, saiu derrotado no CARF pelo voto de qualidade, será aberta oportunidade de pagamento apenas do valor principal desse tributo com o uso de eventual prejuízo fiscal, de base negativa de CSLL ou de precatório. Eventual remanescente poderá, ainda, ser parcelado em 60 (sessenta) parcelas.

Chegamos ao ponto de afirmar que podem ser mais vantajosas essas condições de pagamento do tributo pós-derrota no CARF do que no seu prazo de vencimento, sugerindo ao contribuinte o contencioso! Claro, estamos falando aqui das situações em que a derrota ocorre pelo voto de qualidade, mas que certamente vale o patrocínio da via administrativa de discussão.

Situação ainda mais “inusitada”, por assim dizer, é aquela relativa a processos que versam sobre matérias idênticas, como ágio interno, em que um é solucionado por maioria e outro pelo voto de qualidade. Teremos dois contribuintes em situação fiscal idêntica aos quais são ofertadas condições absolutamente desiguais para pagamento de débitos de mesma natureza.

Um contribuinte será obrigado a pagar o valor do principal, juros e multas, com uma possibilidade de parcelamento simples desses valores em até 60 (sessenta) vezes, enquanto outro, pagará somente o principal, podendo abatê-lo de prejuízo fiscal, base negativa de CSLL ou precatório, parcelando o restante em também 60 (sessenta) vezes.

Não há dúvidas de que a derrota de um contribuinte no CARF pelo voto de qualidade não é razão suficiente para ensejar que lhe seja ofertada tamanha vantagem, em completa inobservância do princípio da igualdade tributária.

Até mesmo um leigo é capaz de apontar o contribuinte beneficiado, bem como a tamanha injustiça que será praticada pelas autoridades fazendárias! E é por essa razão que o Judiciário será acionado por aquele contribuinte que, no nosso exemplo acima, saiu perdedor por maioria de votos de uma das Turmas do CARF. Esse contribuinte, perseguirá igual tratamento dado ao contribuinte cuja disputa foi solucionada pelo voto de qualidade.

Isso sem dizer dos planejamentos tributários mais arrojados, cujas chances de questionamento fiscal deverão também prever a possibilidade de a celeuma ser resolvida pelo voto de qualidade e, portanto, de o contribuinte poder gozar dos benefícios listados nesse artigo para quitação apenas do principal do tributo que a Receita Federal do Brasil entender devido. O risco começa a ser atrativo e a revisão de modelos operacionais mais ultrapassados merecerão revisão.Direto ao ponto: se aprovado o PL 2.384/2023 pelo Senado, nesse segundo semestre de 2023, os contribuintes deverão estar atentos às seguintes oportunidades: (i) mercado de precatórios; (ii) operações societárias, objetivando o uso de prejuízo fiscal; (iii) reavaliações do uso do contencioso administrativo, notadamente no caso de matérias controvertidas, com possibilidade de decisão pelo voto de qualidade; (iv) reavaliações de planejamentos tributários que envolvam questões de risco e/ou controvertidas que, em caso de autuação e contencioso administrativo, possam ser resolvidas pelo voto de qualidade e, assim, dar espaço ao pagamento do montante principal do tributo exigido com as benesses previstas em lei; (v) acionamento do Judiciário em caso de derrota no CARF por maioria, perseguindo iguais condições de pagamento do débito daquele contribuinte cuja derrota sobre mesmo tema se deu pelo voto de qualidade.