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Possibilidade de creditamento das despesas com LGPD para fins de PIS/COFINS

Direto ao Ponto: A LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/18) estabelece regras para tratamento dos dados pessoais exigindo diversos cuidados, adequações e monitoramento por parte das empresas a tais informações. Para o fiel cumprimento das disposições legais as empresas incorreram e estão incorrendo em gastos com sua implementação e manutenção, o que faz com que se tornem insumos para a prestação de suas atividades empresariais. A partir de então, haveria o direito ao creditamento de tais insumos para fins de PIS/COFINS sob o regime não-cumulativo, uma vez que se cumprem com o teste de subtração trazido pelo STJ em relação à matéria. 

A LGPD, Lei Geral de Proteção de Dados – Lei 13.709/18 – estabelece regras para tratamento dos dados pessoais (coleta, produção, armazenamento, utilização, acesso, etc), garantindo mais direitos aos titulares dos dados, bem como limitações e penalidades às empresas que trabalham com essas informações. O objetivo da lei é dar mais transparência aos titulares dos dados e detalhar obrigações para as empresas que tratam desses dados. Para isso, a lei é baseada em dez princípios, entre eles transparência, segurança, finalidade, necessidade e adequação. Fato é que, o tratamento adequado de dados decorre, portanto, em razão de obrigação legal.

Para a devida adequação à tais novas exigências legais e sob pena de sofrerem com multas em caso de seu descumprimento, as empresas incorreram, incorrem e ainda vão incorrer em diversos gastos para a implementação das disposições veiculadas pela LGPD. 

Isso porque, de acordo com o art. 46 da LGPD, os agentes de tratamento devem adotar medidas de segurança, técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou qualquer forma de tratamento inadequado ou ilícito.

Dentre os principais gastos em comento, destacam-se, por exemplo, aqueles com consultorias e escritórios de advocacia, aquisição e desenvolvimento de sistemas, licenças servidores, desenvolvimento e manutenção de sistema de compliance, mapeamento e análise de riscos, treinamento de empregados, sistemas de controle e proteção tecnológicos, inventário do tratamento de dados, ferramentas de garantia de segurança, dentre outros.

A partir desse cenário, surge a dúvida: seriam os gastos com implementação e manutenção dos requisitos exigidos pela LGDP considerados como “insumo” para fins de creditamento do PIS/COFINS para pessoas jurídicas sujeitas ao regime não-cumulativo (i.e., aquelas optantes pelo regime de Lucro Real para fins do Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido)?

Para responder essa questão, devemos retomar os fundamentos trazidos no bojo do Recurso Especial n. 1.221.170 que culminaram no “Teste de Subtração” pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ): essencialidade e relevância. Nesse leading case, o STJ referiu-se a tudo aquilo que a pessoa jurídica não produz sem (essencial) ou ao que a leva a fazer bem menos (relevante), se diminuído do processo produtivo, para fins de definição do termo “insumo”.

Por sua vez, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, em Nota SEI nº 63/2018/CRJ/PGACET/PGFN-MF, atestou que o critério de relevância “é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja: a) “pelas singularidades de cada cadeia produtiva” b) seja “por imposição legal.”

Ora, o cumprimento das disposições da LGDP decorre exclusivamente de lei. Inclusive, no voto do Ministro Mauro Campbell, há passagem específica em que ele afirma ter se sensibilizado com a tese de que a essencialidade e a pertinência ao processo produtivo não abarcariam as situações em que há imposição legal para a aquisição dos insumos (v.g., aquisição de equipamentos de proteção individual – EPI).

Nesse sentido, considerou que deveria ser adicionado o critério da relevância para abarcar tais situações, isto porque se a empresa não adquirir determinados insumos, incidirá em infração à lei. Desse modo, incorporou às observações feitas no voto da Ministro Regina Helena especificamente esse ponto.

Vale lembrar também, que o Ministro Mauro Campbell destacou que o descumprimento de uma obrigação legal obsta a própria atividade da empresa como ela deveria ser regularmente exercida. Assim, imposição legal está em consonância com “teste de subtração” que é a própria objetivação segura da tese aplicável a revelar a imprescindibilidade e a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte, e nada é mais imprescindível e importante do que cumprir a lei. 

A Receita Federal do Brasil (RFB) tem, inclusive, diversas decisões no sentido de que os gastos com manutenção e operacionalização exigidos por lei permitem a apuração de créditos da não cumulatividade da Contribuição para o PIS/COFINS (vide, por ex., Solução de Consulta 107/19; 32/20; e 1/21). 

As decisões que tratam de equipamentos de proteção individual (EPI) fornecidos a trabalhadores alocados pela pessoa jurídica nas atividades de produção de bens ou de prestação de serviços, ressaltam expressamente que, quando eles integrarem o processo de produção de bens ou de execução do serviço por imposição legal, podem ser considerados insumos para fins de desconto de créditos da Contribuição para o PIS/COFINS.

Portanto, as empresas possuem fundamentação jurídica suficiente para ingressar em juízo visando garantir o direito ao crédito de todos os gastos incorridos direta ou indiretamente com o cumprimento da LGDP. Isso porque, embora a RFB já tenha se manifestado no sentido de garantir créditos de PIS/COFINS por imposição legal, também já adotou interpretação restritiva negando direito ao creditamento em virtude de imposição normativa (Solução de Consulta 9954/2017). 

Como o tema da LGDP é novo, ainda não foi especificamente analisado pela RFB, razão pela qual o contribuinte deve preventivamente garantir seu direito junto ao Poder Judiciário.

O impacto no fluxo de caixa em caso de decisão favorável se mostra extremamente relevante, notadamente: 

  1. 9,25% de créditos de PIS/COFINS sobre o valor dos custos incorridos na implementação das regras da LGPD; 
  2. Redução na saída de caixa para o pagamento das contribuições (via crédito ou compensação de tributos federais); e
  3. Dedutibilidade de despesas para fins de IR (artigo 311 do Decreto 9.580/18): despesa com LGPD é usual, normal, necessária, escriturada e comprovada e incorrida no período competente

Convém, ainda, destacar que já existem decisões emitidas pela Justiça Federal favoráveis ao contribuinte. Em uma delas, é consignado o entendimento de que:

“No caso dos autos, pretende a autora considerar como insumos os gastos necessários ao cumprimento das obrigações relacionadas com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD (Lei nº 13.909, de 14 de agosto de 2018). Tratando-se de investimentos obrigatórios, inclusive sob pena de aplicação de sanções ao infrator das normas da referida Lei 13.909/218, estimo que os custos correspondentes devem ser enquadrados como insumos, nos termos do procedente acima citado. Com efeito, o tratamento dos dados pessoais não fica a critério do comerciante, devendo então os custos respectivos serem reputados como necessários, imprescindíveis ao alcance dos objetivos comerciais”. 

Portanto, entendemos que os gastos diretos e indiretos incorridos com a implementação e manutenção da LGPD geram direito ao crédito para fins do PIS/COFINS para empresas sujeitas à sistemática não-cumulativa, em razão de (i) a implementação de estrutura se dar em decorrência de imposição legal; (ii) a inobservância à LGPD gerar sanções; (iii) a própria RFB já ter reconhecido o direito aos créditos de PIS/COFINS em face de custos incorridos em face de previsão legal (Soluções de Consulta 1/2021, 107/2019, 32/2020); e (iv) os gastos com LGPD estarem adequados ao teste de subtração do STJ por se amoldarem ao critério de essencialidade e/ou relevância.

Direto ao Ponto: Os gastos incorridos pelas empresas para implementação e manutenção das exigências veiculadas pela LGDP geram, a nosso ver, direito ao crédito para fins de PIS/COFINS uma vez que tais decorrem de imposição legal. Ademais, ao aplicar o teste de subtração consignado pelo STJ no leading case sobre o tema, tais gastos se adequam ao conceito de essencialidade ou de relevância. A RFB possui entendimentos favoráveis ao creditamento em casos similares, como os de EPI. Por fim, já existem decisões federais de primeira instância favoráveis aos contribuintes, razão pela qual entendemos que todas as empresas sujeitas ao regime não-cumulativo do PIS/COFINS que incorreram em gastos com LGDP devem buscar satisfazer seu direito perante o Poder Judiciário. 

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