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MP 1152: aguardada atualização no “transfer pricing”

Direto ao ponto: assim como ocorre internacionalmente, o Brasil utiliza as chamadas regras de “preços de transferência” para evitar a transferência de lucros não tributados ao exterior. Para tanto, avalia-se se os preços praticados em transações envolvendo “partes relacionadas” (i.e., que possuem algum grau de proximidade passível de alterar as condições normais de negócio) seguiram o padrão negocial que seria desenvolvido se fossem realizadas por partes independentes. Acaso se verifiquem divergências com o que se esperaria (de acordo com tais regras) fosse um preço justo, livre, aplicam-se ajustes na transação (aumento do preço de exportações ou redução da dedutibilidade de importações), para que ocorra a devida correção da base de cálculo do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (“IRPJ”) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (“CSLL”) do contribuinte brasileiro. A recente Medida Provisória (“MP”) nº. 1.152/22 inovou profundamente no regramento de tais controles, aproximando o Brasil da prática internacional, até como forma de possibilitar a adesão do país à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (“OCDE”).

De fato a 1.152, que ainda depende de aprovação pelo Congresso brasileiro, é um passo adiante na aproximação das regras fiscais brasileiras ao padrão internacional, conforme orientação que vinha sendo dada pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (“RFB”) e pela OCDE. A despeito de serem possíveis alterações no processo legislativo, ou mesmo o abandono da medida, apresentamos brevemente o que por ora são as alterações trazidas:

  • expansão das transações sujeitas às regras de preço de transferência, compreendendo qualquer relação comercial e/ou financeira envolvendo partes relacionadas (e não mais apenas serviços, direitos e bens tangíveis);
  • adoção integral do princípio arm’s length que estabelece a utilização dos termos e condições negociais entre partes não relacionada como parâmetro de análise da transação envolvendo partes relacionadas;
  • ampliação da definição de parte relacionada com expressa previsão de outras hipóteses não elencadas;
  • implementação da análise de comparabilidade em que há critérios a serem considerados para avaliar a transação entre partes relacionadas;
  • inclusão de novos métodos de avaliação: Divisão do Lucro (“MDL”) e Margem Líquida da Transação (“MLT”);
  • previsão da possibilidade utilização de outro método, caso se mostrar mais adequado para transação;
  • processo de consulta sobre preços de transferência pela RFB para alinhamento quanto ao método mais adequado a ser adotado pelo contribuinte, o qual possuirá taxas específicas;
  • exclusão da limitação de 5% para dedução de royalties de marcas e patentes, as quais passam pelo controle de preço de transferência;
  • regras específicas para determinadas transações: intangíveis, serviço intragrupo, reestruturação de negócios intragrupo, gestão centralizada de caixa e contratos de seguro; e
  • previsão de regramento simplificado a ser regulamentado pela RFB.

A adequação da norma brasileira aos padrões internacionais poderá impulsionar os investimentos estrangeiros no país e aumentar a participação do Brasil no comércio exterior na medida em que o ambiente negocial se torna mais competitivo e as inseguranças jurídicas existem são suprimidas.

Caso a MP nº. 1.152/22 seja convertida em lei pelo Congresso Nacional, o novo regramento de preço de transferência passa a vigorar em 1º de janeiro de 2024, podendo opcionalmente o contribuinte adotá-lo já em 2023.

Existe ainda alguma incerteza sobre a definição que o novo Poder Executivo dará ao tema. Embora ele esteja sob crivo do Legislativo, houve rumores de que a adesão à OCDE deixaria de ser uma meta, ao menos inicialmente, do novo governo, o que poderia significar falta de incentivo a evolução do tema no congresso. De outro lado, a adesão aos padrões internacionais é uma demanda algo antiga e um compromisso internacional que, a despeito de poder ser revisto, traz consigo uma exposição do país que poucos ousam ignorar.

De imediato, as empresas afetadas devem apenas acompanhar o tramite do tema em Brasília, sendo esperado para este primeiro quadrimestre sua definição para, na hipótese mais arrojada, haver a aplicação opcional para este exercício de 2023. De qualquer forma, é um momento ímpar para o tema, que demanda investimentos pesados de compliance local e internacional, além de valiosas disputas no contencioso tributário, eis que o regime atual do Brasil vigora desde 1997, com diversos pontos tidos como algo incoerentes, especialmente perante a prática global.